Olho no Olho

 
16.09.2003  
   

Discriminalização das drogas

Mesmo partindo de uma realidade bastante desconhecida, distante e muito peculiar encontrada na Holanda, a questão sobre a discriminalização das drogas obriga-nos a repensar algumas posturas individuais e coletivas aqui no Brasil, no sentido das contrapartidas ao optarmos por qualquer política, seja focada no consumo ou no combate às drogas. Apresentamos a seguir os pontos de vista de dois professores da UFRJ sobre a realidade atual por aqui.

 
             
 

Gilberto Velho
Professor titular de Antropologia Social do Departamento de Antropologia do Museu Nacional da UFRJ


As medidas de descriminalização e legalização par-cial do uso de certas drogas na Holanda expres-sam uma visão menos repressora e policialesca desse complexo problema que afeta, hoje, todo o mundo. As proibições têm ali-mentado a atuação das redes criminosas que se espalham pelo mundo, associadas ao tráfico de armas, envolvendo os mais diferentes setores sociais, incluindo, o de governo e da segurança pública.
O caso brasileiro, infelizmente, é uma demonstração da falência dessas políticas meramente repressivas que contribuem para o desenvolvimento da própria criminalidade e para a corrupção generalizada. A violência no Brasil, é causada pela desigualdade social com todos os seus desdo-bramentos e conseqüências. A descriminalização e a legalização parcial, poderia se constituir em um instrumento funda
mental para o desmonte do tráfico e do enfraque--cimento do mundo do crime e da violência.
Certamente, essas mudanças impli-cam políticas internacionais, locais e nacionais, devido à globalização do tráfico, do crime em geral e dos mecanismos de lavagem de dinheiro. É fundamental, também, que ao lado dessas mudanças na legislação e no controle das drogas, desenvolvam-se políticas sociais abrangentes e con-tínuas voltadas para o atendimento das necessidades e aspirações da população dos diferentes países vítimas do terrível quadro descrito.

 

Arthur Arruda
Professor Adjunto de Historia da Psicologia Instituto de Psicologia

Um ponto chave a ser pensado sobre a questão das drogas é o cálculo dos riscos. Não há solução utópica sem novos perigos! Isso não implica que devemos sempre apostar nos mesmos riscos, especialmente quando estes tomam as proporções em que os levantes do início do ano puderam dar a medida. Este é o nosso risco real: o poder que não está apenas no potencial bélico dos traficantes (que torna a classe média tão refém em nossa cidade quanto às comunidades carentes), mas principal-mente na flexibilidade econômica, dada a alta liquidez do capital circulante. Tal poderio econômico não apenas permite fazer frente à força do Estado, mas princi-palmente cooptá-lo de múltiplas formas e através de todos poderes constituídos (legislativo, judiciário e executivo; micro e macropolítico).
Quanto à liberação, quais seriam os seus riscos? A medida pode ser inferida pelos efeitos do álcool, a maior droga propor-cionadora de danos coletivos. Como seria o mundo com outras drogas ofertadas no coquetel de consumo? Como dar conta da dependência e seus riscos coletivos? Não podemos mais crer que a promulgação de uma lei resolva todos os nossos problemas, além de possibilitar a rea-locação de novas formas de contravenção fartamente empregada nas hostes do tráfico (como no seqüestro e roubo).
Enfim, é necessário ponderar sobre qual risco optaremos: a proibição de várias drogas com o incremento da máfia no combate & conluio com o nosso frágil Estado? Ou a liberação com os ônus individuais e coletivos em nosso sistema de saúde? Nossa resposta deve ser ponderada com uma série de peculiaridades que nos dizem respeito, como a alta corruptibilidade do Estado brasileiro (fato cotidiano), a farta dispo-nibilidade de mão-de-obra para o mercado da contravenção, e a nossa posição no tráfico internacional, enquanto grande centro distribuidor.

   
       

[ Veja as entrevistas na íntegra no PAINEL DE ARGUMENTOS ]

 

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