De Olho na Mídia

 
23.12.2003  
   

Rastros de Sangue
Genérico de produto americano, o luminol brasileiro ajuda a elucidar crimes no Rio

Um dos vários mistérios do assassinato dos americanos Zera Todd, presidente da Shell no Brasil, e sua mulher, Michelle Staheli, ocorrido duas semanas atrás no Rio de Janeiro, foi resolvido com um produto digno de série de ficção científica na TV. Um reagente químico comprovou que o machado de decoração da família não foi usado no crime. Mesmo se o assassino tivesse lavado a arma, não haveria como esconder o vestígio de sangue. A certeza dos peritos criminais se deve ao luminol, um líquido desenvolvido no Instituto de Química da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) a partir do original americano, criado nos anos 60. O genérico brasileiro custa R$300 o litro, contra R$3 mil do importado.
O luminol já havia sido decisivo na elucidação do assassinato do comerciante chinês Chan Kim Chang, espancado até a morte no presídio Ary Franco, em agosto. Até ser realizado o teste com o luminol, acreditava-se na versão dos carcereiros - de que o comerciante não havia sido levado sangrando para a cela. O produto é um líquido feito a partir de cinco componentes que reagem ao ferro presente na hemoglobina do sangue. Borrifado na cena do crime, produz uma luz fluorescente, que só pode ser notada na escuridão, quando em contato com vestígios de sangue. O brilho da luz lembra o dos bastões fluorescentes usados pela polícia ou encontrados em festas de música eletrônica. "Menos de 1 grama de um dos reagentes, o neóbio, pode iluminar o mundo, e ele é facilmente encontrável por aqui", diz o químico Claudio Lopes, coordenador da equipe da UFRJ que fabrica o luminol brasileiro.
Além do preço, a grande diferença entre a substância original e o genérico nacional é que o produto brasileiro é visível a olho nu, desde que o local borrifado seja escuro e as janelas tenham sido vedadas. Já o importado precisa de potentes aparelhos eletrônicos para aumentar o poder de fluorescência. "No Brasil isso não dá certo porque muitos crimes acontecem em favelas, onde a iluminação é precária", explica Lopes.
O genérico começou a ser usado em 2001 e já ajudou a solucionar cerca de 50 casos, todos no Rio. Atualmente, o laboratório da UFRJ produz 30 litros por mês para a polícia carioca. Brevemente, o luminol brasileiro será fabricado em larga escala para outros Estados. Empresas de países do Mercosul e dos Estados Unidos também demonstraram interesse na importação. "Uma das inúmeras vantagens do luminol é que a reação do produto não altera o DNA, que pode ser analisado posteriormente", aponta a química Letícia Gomes Ferreira, da equipe de Lopes.

Daniela Barbi
Revista Época - Pg. 113
Publicado em 14 de dezembro, domingo

 

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