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Micael
Herschmann
Professor Adjunto da Escola
de Comunicação da UFRJ, onde também
coordena o NEPCON
Talvez
mais do que uma “civili-zação da imagem”,
a expressão que melhor define o mundo em que esta-mos
vivendo hoje é uma “era da visibi-lidade”,
ou melhor, de uma “alta visibilidade”. Ver e
exibir se constituem, atualmente, aspectos vitais do ambiente
cultural em que estamos profundamente imersos. Esse processo
de produção de uma visibilização
intensa e constante na mídia parece nos fascinar
irresis-tivelmente e tem como uma das suas contrapartidas
o crescimento dos núme-ros de escândalos com
os quais toma-mos contato. É conseqüência
óbvia de vidas e intimidades cada vez mais visí-veis
e consumidas de forma ávida pelo público.
Aliás, a propósito, sobre a platéia
anô-nima, isto é, sobre todos os que estão
do “outro lado do vidro”, pode-se observar um
processo curioso. Com a ascensão e hegemonia do culto
às celebridades, cada vez mais, não obter
algum tipo de visibilidade temporária ganha uma enorme
dramaticidade. Já se desen-volveram inúmeras
“receitas” para se tornar uma celebridade. Todos
os candidatos à celebridade vêm adotando a
estratégia estética do maior, mais barulhento
e mais rápido. Isso vem provocando um processo em
cadeia que forçou os pretendentes ao lugar de celebridade
a se tornarem mais escandalosos (e até violentos)
para serem notados em meio à balbúrdia e ouvidos
em meio à gritaria.
O antropólogo Roberto da Matta nos recorda que, o
sujeito famoso se constitui, no Brasil, numa espécie
de “superpessoa”, uma espécie de super
cidadão. Assim, especialmente em países como
o nosso marcados pela desigualdade e pela exclusão
social, em que essas oportunidades de visibilidade e ascensão
social são menores, o anonimato é interpretado
pelas camadas menos privilegiadas da população
como um ato de violência, mais uma comprovação
de sua falta de cidadania. Sua participação,
portanto, em programas de auditório, realityshows
e similares, quase sempre desempenhando, aos olhos das camadas
médias, papéis constrangedores e escandalosos,
deve ser vista também dentro dessa perspectiva, isto
é, como uma forma de compensação, uma
chance, ainda que limitada, de serem protagonistas temporários.
Poder-se-ia afirmar que a estratégia “falem
mal, mas falem de mim” nunca esteve tão em
voga.
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Marcos
Jardim
Professor de Psicologia Social
do Instituto de Psicologia da UFRJ
A
palavra escândalo, de acordo com o Dicionário
Etimológico de Antonio Geraldo da Cunha (Nova Fronteira,
2ª. Edição, 1986), significa “aquilo
que é causa de erro ou de pecado”. Se se admite
essa concepção, deve ser indagado qual é
o certo ou o que é o esperado. A mídia, se referenciada
como termômetro, dá o status do “erro ou
pecado” segundo o espaço concedido à matéria,
a freqüência do tema e seus desdobramentos. Porém
a mídia em si não é isenta: representa
diversos interesses em jogo e, conseqüentemente, a correlação
de forças entre os diversos grupos organizados segundo
interesses do momento. O tratamento dado na divulgação,
ou mesmo na supressão da matéria, gera amplo
espectro de possibilidades, desde a aceitação
sem críticas até a especulação
de que o verdadeiro objetivo é o contrário do
que está sendo divulgado, o que permite vários
graus intermediários de interpretação.
Assim, surge o vasto material para a elaboração
de “teorias conspiratórias”, boatos, “ler
nas entrelinhas”. Apesar de negado com freqüência,
a comunicação é, na maioria absoluta
de seu uso, um processo de manipulação que visa
influenciar comportamentos. Como exemplo podem ser apontados
os inúmeros estudos sobre a influência da televisão,
do cinema, do jornal, entre outros meios, na mudança
de hábitos e comportamentos. Porém, como a mídia
não pode ser “descolada” da realidade e
o ser humano está sempre procurando “novidade”,
sair da “mesmice”, tem-se os ingredientes do escândalo:
ou o erro ou o pecado. Como o erro pode ser ou não
intencional, exemplos recentes de escândalos podem estar
baseados em incompetência e/ou má fé.
Assim, quando recentemente uma plataforma de uma empresa de
petróleo submergiu e o gerente afirmou que esta era
apenas uma das plataformas, omitiu que era a mais cara, a
mais complexa e de tecnologia mais avançada. Mas qual
é o escândalo maior: persistir na forma equivocada
de gestão ou não punir, punir levemente ou apenas
parcialmente alguns dos envolvidos? E a busca de índice
de audiência do Gugu? E a busca de invasão de
privacidade para denunciar desvios de conduta? E quando a
cumplicidade da audiência é parte da trama? E
quando um programa infantil exibe a dança da garrafa
em um ambiente de pedofilia? Qual o escândalo maior:
o apresentado ou a passividade da sociedade? Murdoch, dono
de império da comunicação, afirma que
escândalo e baixaria é o que vende, é
o que o público quer, e sua fortuna e sucesso em diferentes
países parece ser o testemunho de sua afirmação.
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