Olho no Olho

 
30.09.2003  
   

Impacto social da MP

A medida provisória que permite o plantio de soja transgênica assinada pelo então Presidente em exercício, José Alencar, gerou polêmica entre diversos grupos sociais, que ficou marcada pela oposição entre ambientalistas e agricultores. A MP passou pelos argumentos de inconstitucionalidade e por manifestações de grupos ecológicos com o respaldo da CNTBio, Comissão Técnica Nacional de Biossegurança, que não prevê danos ambientais para o plantio do transgênico. O relatório do CNTBio de 80 páginas, apesar do grande estudo de impacto, desconsidera o âmbito político da questão. Para dar continuidade à reflexão os pesquisadores Rogério Margis do Laboratório de Genética Molecular Vegetal do Instituto de Biologia da UFRJ e Cecília Cipriano, coordenadora de Curso do NIEAD (Núcleo Interdisciplinar de Estudos Ambientais), também da UFRJ, opinam sobre os trangênicos.

 
           

Rogério Margis

“O que aconteceu é que todo o processo tinha um órgão responsável pelo parecer sobre o impacto do plantio da soja transgênica no Rio Grande do Sul. A CTNBio (Comissão Técnica Nacional de Biossegurança) não é somente um órgão composto por cientistas e pesquisadores. Há uma comissão mista, formada por civis que tenham interesses na questão dos transgênicos. A soja transgênica, em termos de produtividade, é mais eficiente e o que comprova seu bom resultado é a vontade dos agricultores em cultiva-la. O argumento de que os herbicidas utilizados nas lavouras de transgênicos são prejudiciais não é correto. Sabemos que tanto na soja orgânica, quanto na transgênica os pesticidas empregados são os mesmos, sendo que no caso da soja modificada sua dose é muito menor. Sobre o impacto ambiental, não há perigo de cruzamento entre a soja transgênica e outra espécie de vegetal. Comparati-vamente é como se um homem fecun-dasse um primata fêmea. Não existe essa possibilidade. O laudo da CTNBio tem 80 páginas de estudos sobre a viabilidade da soja modificada e não constou nenhum problema, não vejo o que há de errado nisso. Algumas pessoas sempre querem 100% de segurança e nem sempre isso é possível. Essa soja é idêntica à orgânica, não há nenhuma proteína inserida no transgênico que não esteja presente na soja natural. Não é, por exemplo, igual ao milho BT que tem uma substância nova que ainda precisa de mais estudos. A soja transgênica não oferece nenhum dano nem ao solo nem ao clima. São fatores que não interferem na produção e que também não são influenciados”.

Cecília Cipriano

“O caso dos transgênicos é uma questão difícil de ser analisada porque há falta de dados científicos sobre o comportamento dessas sementes. Não há um estudo de observação, como se realiza com outras substâncias. No caso dos fármacos, por exemplo, estudamos como se dá o comportamento de uma molécula por observação, isso não aconteceu com a soja transgênica aqui no Brasil. Não há um estudo de observação que é estritamente importante e que prevê essas propriedades dessa nova molécula. Nos transgênicos, ainda não tivemos a oportunidade, o que representa um risco. A questão de colocar o Brasil como mais um produtor de soja, enquanto poderíamos ter uma agricultura mais qualificada, para assegurar um mercado incerto, como é o dos transgênicos, fere aos interesses da soberania nacional. A quem interessa então? Sabemos que o governo vem sofrendo grandes pressões, principalmente na economia, de em-presas internacionais. Até que ponto esse fator é limitante para nossa agricultura? Com medidas como essa ficamos ainda mais dependentes, perdemos nosso dife-rencial dentro de uma economia mundial que se torna, a cada dia, mais díspare entre países produtores e consu-midores. Dizer que o transgênico não causa danos ambientais e que sua produtividade é maior, não justifica a implantação de um sistema agrário excludente. Somos cientistas, mas te-mos que prestar atenção nas causas e não nos efeitos. Há algo maior nessa medida provisória que não se trata de questão ambiental ou biológica e temos que estar atentos a isso.”

 
   

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