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Lúcia
Barbosa de Oliveira
Economista, Pós-Graduada em
Marketing e Mestre em Administração
“O
consumis-mo exacerbado é um fenômeno muito
mais amplo e a ‘comerciali-zação’
do Natal é apenas um reflexo dele. Hoje em dia, as
pessoas são mais valorizadas por aquilo que têm,
e não mais por aquilo que são ou fazem.
O individualismo tem falado cada vez mais alto, em detrimento
de valores tradicionais tais como a solidariedade e o com-panheirismo.
As empresas procuram, naturamente, obter vantagens desta
situação. Mas não acredito que se possa
culpar os profissionais de marketing. Aqui é importante
refletirmos se a comunicação de marketing
é capaz de mudar os valores de uma sociedade, ou
se ela é apenas um reflexo desta transformação.
Qual seriam as intenções por trás da
utilização pelas lojas de campanhas que dão
vantagens na compra de um produto para quem leva uma doação?
Acredito que alguns empresários fazem isso com o
objetivo sincero de ajudar os menos favorecidos, mas certamente
há aqueles que utilizam a solidariedade apenas como
apelo publicitário, tocando na ‘culpa’
das pessoas para vender mais.
O Natal é uma data religiosa e seu significado parece
cada vez mais esquecido. No entanto, ele representa para
muitos uma oportunidade de confraternização
com familiares e amigos, e isto é bom. Nos dias de
hoje, o tempo é um ‘bem’ escasso (e não
pode ser comprado), que acaba por provocar o isolamento
e o afastamento das pessoas de seu convívio social.
Neste sentido, podemos encarar o Natal como um acontecimento
positivo.
O que precisamos, na realidade, é refletir sobre
nossas escolhas em todos os dias do ano. A solidariedade
e a preocupação com o outro deveria fazer
parte de nossas ações e atitudes em todos
os dias do ano, e não apenas no Natal.”
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Ilana
Strozenberg
Socióloga, Mestre em Antropologia
e Doutora em Comunicação
A
visão de consumo, como si-nônimo de ostentação
e de tudo que se apresenta como oposto de uma atitude huma-nista
e solidária, vem sendo questionada por uma série
de autores como uma interpre-tação simplista
e maniqueísta, que reduz o comportamento humano,
qualquer que seja ele, à dimensão do econômico.
Esses autores, que fundamentam uma nova vertente dos estudos
antropológicos a que se denominou "Antropologia
do consumo", argumentam, por um lado, que todo comportamento
humano possui múltiplas dimensões e, por outro,
que seu significado só pode ser compreendido no contexto
sócio-cultural em que se insere.
Veja o caso do Natal. Não há dúvida
de que constitui uma grande oportunidade para o aquecimento
do mercado, que certamente atende a interesses de lucro
econômico. Mas será que isso retira da compra
e do ato de presentear o seu caráter simbólico,
ritual, de reafirmação dos valores de solidariedade
como fundamento da vida social, dos quais a família
representaria idealmente o espaço de realização
mais pleno - modelo de amor e harmonia para as demais relações?
Acredito que não. Só que, na sociedade de
consumo, as relações entre os homens, sejam
elas políticas, estéticas, ou afetivas e morais,
passam, em grande parte, pela instância do mercado.
Assim como os partidos – sejam quais forem - precisam
de verbas para fazerem suas campanhas e os artistas têm
que se inserir no mercado de arte para sobreviver de seu
ofício. Se quisermos expressar nosso afeto e solidariedade
e reafirmar nossos laços de família e amizade
no Natal (bem como nos aniversários, na Páscoa,
ou outras ocasiões rituais) teremos que ir às
com-pras. É evidente: não há como negar
o fato econômico. Mas, certamente, do ponto de vista
dos processos e dinâmicas sócio-culturais,
é muito diferente quando o comércio e a propaganda
agregam valores como amor, solidariedade e amizade a produtos
que compramos para presentear de quando, ao contrário,
nos vendem carros, roupas, ou, para ser ainda mais radical,
aparelhos de escuta, alarmes ou armas, com o argumento de
que garantirão nosso sucesso e poder de competição
e defesa pessoal num universo de competidores hostis.
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