Olho no Olho

 
04.11.2003  
   

Política Antitabagista

O Ministério da Saúde tomou uma atitude considerada radical por fumantes e não fumantes ao inserir fotos de doentes e vítimas do tabaco em maços de cigarro. A política antitabagista brasileira faz parte de um Programa Nacional de Combate ao fumo, que agora tem espaço para discussão em nosso Olhar, através das opiniões do Diretor do Núcleo de Estudos da Saúde Coletiva (NESC), Roberto Medronho e do médico Alberto José de Araújo que é diretor do Núcleo de Estudo e Tratamento do Tabagismo, NETT da UFRJ.

 

Roberto Medronho

“O Programa antitabagista do Ministério da Saúde é uma medida que procura orientar os usuários sobre os malefícios que o uso do tabaco causa na saúde humana. O ta-baco é um dos principais agentes cance-rígenos do mundo. O número de mortes atribuídas pelo tabaco é assustador. As inserções de fotos de doentes nos maços de cigarro e as propagandas são atitudes de impacto que têm como objetivo uma mu-dança no comportamento dos seus usuá-rios. Quanto à eficácia, é muito controversa porque nós não temos uma forma de avaliação dos programas no sentido de medir quantos fumavam e quantos deixaram de fumar após a veiculação da campanha. Não é uma coisa fácil de ser feita. Nós temos tecnologia, temos procedimentos estatísticos e qualitativos para buscar saber se a campanha educativa foi suficiente para mudar o hábito do usuário, mas ela não é feita na prática. É uma lástima, porque se gasta muito dinheiro em publicidade e ela é pouco eficaz. O hábito de parar de fumar envolve uma série de questões e não apenas o conhecimento de que fumar causa câncer, de que fumar faz mal à saúde. E não se trata apenas de uma questão individual, mas política. Os grandes centros, onde estão as indústrias do tabaco, têm diversas leis restritivas ao fumo, o que não impede de lançarem sua produção em países periféricos como o Brasil, que representam um mercado livre e sem fiscalização. Algumas leis nós já conseguimos aprovar como é o caso da proibição do fumo em vôos domésticos, em restaurantes, dentro de hospitais, mas infelizmente nós temos uma cultura meio subversiva. Nós subvertemos frequentemente as leis, mesmo as leis boas.
O governo também não tem tanto interesse em adotar leis restritivas porque um dos maiores pagadores de impostos do Brasil é a indústria do fumo. O que não garante lucro ao governo, pois a renda conseguida através dos impostos não paga a assistência dada aos pacientes com os problemas derivados do tabaco. Criar leis restritivas ao tabaco é um grande negócio, pois teremos famílias, sadias mais produtivas e gastos reduzidos com a saúde decorrente de doenças que tem como substrato o fumo.”

Alberto José de Araújo

“A poderosa indústria do tabaco decerto tem um círculo de influência na mídia e recursos incalculáveis para financiar qualquer campanha, artigo ou peça que iniba o grande cerco pelo qual passa esta indústria da doença e da morte. Curioso, é que em nenhum momento o missivista aponta para os custos sociais decorrentes do consumo do tabaco e tampouco aponta a questão da dependência e, que 80% dos fumantes tentam uma, duas, três vezes parar de fumar por receio dos riscos que o hábito lhes impõe e que apenas uma minoria dos fumantes jamais pensou em deixar de fumar. Entretanto, à parte do poder das campanhas, o governo conseguiu algumas vitórias: a legislação restritiva da propaganda e do consumo em recintos coletivos, a proibição da venda para menores de 18 anos, bem como as reparações pelos danos à saúde cobrados das companhias de cigarro a várias vítimas do tabaco, bem como o cerco à propaganda enganosa que induz os jovens a se tornarem novos alvos da dependência à nicotina. Nos últimos anos foi intensificada a luta contra o tabaco, culminando com a obrigatoriedade das inserções nos maços de cigarro de imagens de vítimas de doenças relacionadas ao tabaco. Vários foram os artifícios da indústria do tabaco para encobrir as imagens que, de modo decisivo, passaram a gerar um impacto não somente nos consumidores habituais do cigarro, como também nos potenciais consumidores. O direito de apresentar opiniões sobre temas polêmicos como o tabagismo, não se contrapõe ao dever do Estado de utilizar todos os meios para preservar a saúde de seus cidadãos. Para se ter uma idéia do impacto que as imagens de pessoas sofrendo com os males das doenças relacionadas ao tabaco produzem na população, recente reportagem feita no Hospital Universitário Clementino Fraga Filho da UFRJ, levou a um expressivo número de pessoas do Rio de Janeiro e de outros estados a buscarem algum tipo de tratamento para pararem de fumar.”

 
 

 

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