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Nos
próximos dias a Comissão de Constituição
e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados vota o projeto
do governo que permite a quebra das patentes dos medicamentos de
laboratórios estrangeiros que fazem parte do Coquetel de
tratamento da AIDS. Para o Ministério da Saúde, essa
medida é fundamental na sustentação e autonomia
do programa brasileiro de combate à doença. Com isso,
os laboratórios brasileiros passariam a produzir o efivarenz,
o nelfinavir, o litonavir-lopinavir e o tenofavir, consumindo 70%
do orçamento governamental de R$950 milhões para gastos
com medicamentos anti-AIDS.
Sobre essa questão, o Boletim Olhar Virtual
foi ouvir o professor da Escola de Comunicação da
UFRJ, Joaquim Welley, que também é advogado. Foram
procurados especialistas da área médica, para fazer
o habitual contraponto do “Olho no Olho” porém,
uns não quiseram se pronunciar sobre o assunto e outros estavam
impossibilitados de fazê-lo até o momento do fechamento
dessa edição. |
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Joaquim
Welley Martins
Jornalista e professor da Escola de Comunicação
da UFRJ.
"Foi uma novidade perfeitamente anunciada e previsível,
essa dada agora pelo governo Lula, de quebrar patentes de remédios
destinados ao tratamento da Aids, enquanto parte de toda uma política
de saúde pública nacional e internacional, que já
estava demorando a ser implementada.
No Brasil, como no resto do mundo civilizado e democrático
- não necessariamente globalizado da forma politicamente
correta - a patente é um mecanismo legal de proteção
à propriedade intelectual - que pode ser considerado como
uma especialização do estabelecido de forma ampla
pelo Direito Autoral. Ela visa garantir ao pesquisador/criador/inventor
de um processo/produto/procedimento os direitos de reprodução
e comercialização da sua descoberta, tendo como
parâmetro uma lógica econômica explícita,
que é inerente às sociedades capitalistas, ou seja,
a proteção aos lucros proporcionados pela licença
de produção de um produto patenteado, os quais garantem
ao detentor da patente um possível reinvestimento e aprimoramento
de sua pesquisa e desenvolvimento de novo processo/produto/procedimento.
No caso específico do Brasil e de outros países
em desenvolvimento ou abaixo disso, os fatores sociais podem,
eventualmente, prevalecer sobre aqueles aspectos legal e econômico,
colocando como ponto nevrálgico da discussão a possibilidade
de quebra de patente, no sentido de beneficiar-se a coletividade
como um todo.
Para que ocorra o contexto acima, um dos fatores é, indiscutivelmente,
a grande defasagem tecnológica dos países periféricos
em relação aos países desenvolvidos, e o
seu baixo poder de compra para adquirir os produtos de última
geração fabricados pelos grandes centros econômicos,
impondo para uma grande parte da sociedade uma sentença
prévia de morte, devido aos altos custos dos remédios
mais potentes e atuais para tratamento de
diversas doenças, tais como a AIDS.
No caso particular das patentes de medicamentos para o tratamento
da AIDS, o aspecto social de maior impacto é a dizimação
de um povo que não tem recurso financeiro para arcar com
os custos da medicação, sendo que, segundo dados
estatísticos divulgados, o vírus HIV contaminou
cerca de cinco milhões de pessoas em 2000.
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Segundo a
Organização Mundial de Saúde (OMS), já
são mais de 35 milhões de infectados pelo HIV no
mundo, sendo que no Brasil houve uma sensível queda nos
índices de contaminação.
O programa brasileiro de combate à AIDS, que foi regulamentado
pelo governo federal em 1996, garante aos doentes infectados com
o vírus HIV – que apresentem ou não os sintomas
de ativação do vírus - acesso gratuito à
medicação necessária para o seu tratamento,
sendo que o coquetel de medicamentos anti-retrovirais usado no
tratamento da doença é comprado pelo Ministério
da Saúde e distribuído para a rede pública
de saúde do país.
No rastro da permanente discussão internacional sobre a
quebra de patentes, o Brasil defendeu teses de eliminação
completa de todas as formas de subsídio à exportação
nos países ricos e a autorização de quebra
de patente de medicamentos estrangeiros pelos países que
têm problemas de saúde pública, tendo obtido
sucesso nesse intento, pois conquistou um acordo histórico,
ao obter apoio de inúmeras nações para forçar
novas rodadas de negociação sobre os subsídios
agrícolas e sobre o direito de quebra de patentes, no caso
específico de medicamentos.
No contexto atual, além dos benefícios sociais de
garantia do acesso aos medicamentos para os pacientes com AIDS
- que já é considerado e reconhecido, mundialmente,
como um direito humano fundamental, visto que indissociavelmente
ligado ao direito à vida -, se tornam evidentes os benefícios
econômicos da quebra de patentes para países como
o Brasil, especialmente aqueles tidos como periféricos,
visto que, por não terem condição de pagar
o preço de sua defasagem tecnológica, somente com
a quebra das patentes poderiam dar um vestígio de chance
de sobrevivência aos seus cidadãos.
A legalidade pura e simples, bem como a politicagem oculta ou
explícita sobre a quebra de patentes dos medicamentos para
tratamento da AIDS, são fatores que devem ser muito bem
considerados, sendo que, no meu ponto de vista, a prática
atual do Brasil é das mais corretas, não podendo
ser generalizada indiscriminadamente para outras áreas,
por conta de lesar direitos de propriedade, gerando posturas refratárias
e retaliatórias."
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