Ponto de Vista
17.05.2005
Estudo sobre a África
Luciana Campos

A Lei de Nº 10.639, de 9 de janeiro de 2003, tornou obrigatório o ensino de História e Cultura afro-brasileira na grade curricular dos níveis fundamental e médio de instituições públicas e particulares. O texto da Lei inclui ainda o estudo da história da África e dos africanos, a luta dos negros no Brasil, a cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional.
Para Mônica Lima, professora de História do Colégio de Aplicação da UFRJ, esta medida é importante para que os estudantes possam entender melhor o processo histórico do Brasil que, segundo ela, está bastante ligado ao da África.
— É claro que é preciso entender a História da América Latina e da Europa para entender a do Brasil. Mas, a da África, em especial, esteve muito ligada à do Brasil. Há períodos no nosso país em que certas cidades brasileiras tinham uma relação comercial, de troca, bastante constante com alguns portos africanos — afirma.
As escolas não puderam colocar em prática o que está descrito na Lei, há dois anos em vigor, em função da falta de quadros profissionais qualificados para lecionar a disciplina. Porém, estão sendo ministrados cursos sobre História da África para professores do ensino fundamental e médio, capacitando-os para dar aulas.

África, um continente desconhecido

Segundo a professora Mônica, a África tem que ser vista no plural, e não no singular. São muitas “Áfricas” na África. Parece uma redundância, mas para muita gente essa confusão existe. A África é um continente muito grande e muito diverso, olhando as dimensões do próprio mapa. É diverso em seu meio ambiente, nas populações e na sua História”, afirma.


A escravidão

Era comum no continente africano as relações de trabalho escravo, que muitas vezes assumia um caráter mercantil. Porém, com a chegada dos europeus pelo litoral atlântico, a demanda por escravos aumentou significativamente, transformando as relações escravistas dentro da própria África, acentuando assim a escravidão comercial, conta Mônica.
A professora atribui à introdução das armas, feita por traficantes de escravos, que as trocavam por trabalhadores também escravos, ao fortalecimento dos conflitos que colocaram fim aos grandes reinos existentes na África. “Vai se fazendo a guerra, e chega um momento em que as populações submetidas, as populações escravizadas e seus aliados vão reagir a isso, o que acaba causando a produção de mais escravos por um lado e, por outro, a destruição desses mesmos Estados, desses mesmos reinos”, diz.
O Brasil foi à colônia que mais recebeu escravos no mundo, foram mais de quatro milhões de negros africanos, e o último a abolir a escravidão. O fim do trabalho escravo no Brasil não significou uma adoção do trabalho assalariado.
— A transição do trabalho escravo para o assalariado no Brasil foi muito lenta, sobretudo no campo. O que acontece é que há uma passagem do trabalho escravo para um trabalho não escravo, que a gente pode classificar como um trabalho livre, mas que implica em uma série de formas, na criação de uma série de maneiras de se prender o trabalhador ao trabalho e de não remunerá-lo. Muitos escravos, após a escravidão, permaneceram trabalhando nas terras do seu senhor em troca do direito de estarem ali ou pelo direito da comida que eles próprios produziam, diz a professora.
O fim do sistema escravocrata no Brasil, portanto, não implicou em uma mudança efetiva nas relações de trabalho, que continuou tratando o trabalhador como uma propriedade.


Branqueamento

A época em que o Brasil aboliu a escravidão havia um desejo latente da elite brasileira em promover um branqueamento da sociedade. A vinda dos imigrantes para o país não foi apenas uma solução econômica, mas também, uma solução político-ideológica, afirma Mônica.
— Isso ficava claro nos discursos dos parlamentares da época, em que era ressaltada a importância de se clarear a sociedade brasileira, conta.
Mônica diz que essa situação perdura até os dias de hoje. O negro, ao ascender socialmente, passa por um certo tipo de clareamento aos olhos dos outros, sendo visto mais como um branco. Mas, ao mesmo tempo, a qualquer momento pode ser lembrado a ele, da forma mais sutil ou grosseira possível, de que ele não é branco, afirma.
“O modelo do brasileiro desejado é o modelo branco. Falta aos afros-descendentes no Brasil modelos de negros considerados belos, bem sucedidos”.

Ações afirmativas

A professora Mônica considera as ações afirmativas medidas de urgência. Segundo ela, a melhoria da educação pública deve ser feita a médio e a longo prazo. De imediato é preciso tratar desiguais como desiguais,pois dessa forma, a meta da igualdade poderá ser atingida.

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