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ANCINAV (Agência Nacional de Cinema e do Audiovisual) é um
projeto do Governo Federal que visa organizar a regulamentação
e a fiscalização das atividades cinematográficas
e audiovisuais. O Ministério da Cultura alega que o projeto foi
criado para democratizar e fomentar a produção e o acesso
às obras. Profissionais do ramo divergem sobre o assunto, e alguns
acreditam que a Agência traz riscos de dirigismo ideológico
e censura.
Para opinar sobre o tema, o Olhar Virtual conversou com
os professores de linguagem audiovisual Fernando Fragozo e Ivana Bentes,
da Escola de Comunicação da UFRJ. Confira abaixo as opiniões.
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Fernando
Fragozo
Professor da Escola de Comunicação
O mercado
de produtos audiovisuais é hoje marcado, em escala planetária,
por uma crescente concentração da produção,
distribuição e exibição de seus produtos.
Falar em "mercado" nesta área, hoje, parece piada.
O que vemos é a constituição de monopólios,
oligopólios e cartéis em todos os níveis,
agravados pela enorme verticalização do setor. O
caso do Brasil é exemplar. A concentração
e a verticalização estão presentes tanto
no setor televisual como no cinematográfico de modo assustador.
E este processo foi sistematicamente apoiado (ou, no mínimo,
negligenciado) por diversos governos anteriores.
O resultado é que hoje, apesar de uma enorme explosão
de possibilidades narrativas, técnicas, estéticas
e poéticas, não há grandes possibilidades
de escolha por parte do espectador. Entre os mais que batidos
programas de TV e os não menos batidos filmes norte-americanos,
o que resta (para os quais há um "resto" possível
– o que não é o caso da maioria dos brasileiros
que tem de se contentar com a TV aberta) é muito, muito
pouco. O pássaro engaiolado não sabe que fora da
gaiola há todo um universo, por mais que a gaiola tenha
o tamanho de um quarteirão.
Abrir novas possibilidades de exibição (salas, videotecas,
Internet, canais, outros modos de transmissão, etc) e incentivar
novas possibilidades de produção (principalmente
a produção regional, a de novos talentos, temáticas,
durações, linguagens) é o que se espera de
um governo minimamente comprometido com a democracia e a pluralidade
de expressões e vivências, com a pluralidade cultural.
Para isso, é preciso tentar mudar o atual estado de coisas.
E há quem não goste disso, porque o calo pisado
dói. Principalmente quando está por demais inchado.
Ampliar as possibilidades de acesso e de produção
é o que se vê essencialmente no projeto da ANCINAV.
Não há cerceamento nenhum à produção
e difusão de obras, pelo contrário. O que há
é a tentativa de minimizar o cerceamento que, hoje sim,
impera devido à enorme concentração econômica
do setor.
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Ivana
Bentes
Professora da Escola de Comunicação
Com uma legislação para as Comunicações
obsoleta diante das transformações tecnológicas
e novas mídias, o Projeto de constituição
de uma Agência Nacional de Cinema e Audiovisual, que possa
regular não só o cinema mais a produção
audiovisual, televisão e Internet, tornou-se um projeto
estratégico para o Ministério da Cultura e levou
a uma ampla discussão sobre os meios de comunicação
no Brasil e a dificuldade do Estado de intervir num mercado monopolista
e firmemente arraigado na defesa dos seus interesses imediatos.
A idéia de que os canais de televisões são
concessões do Estado e que devem ter uma função
não só comercial como também social , com
diversidade de conteúdos , regionalização,
participação de produtores independentes e veiculação
de programas e filmes brasileiros criou por partes do setor ligado
às televisões uma reação imediata
e uma tentativa de abortar o projeto de entrada do Estado nesse
campo. Os vários níveis de interesses e disputas
no campo do audiovisual, interesses comerciais, de produção
de bens simbólicos, de monopólio sobre o mercado
e imaginário cultural, ficaram claros no debate público
em torno da criação da Agência, revelando
o horror que os setores empresariais têm diante de qualquer
possibilidade de controle da sociedade. As propostas da ANCINAV,
se aprovadas no Congresso Nacional, são uma real transformação
nessa mentalidade monopolista que enxerga o público apenas
como consumidor, audiência, e não como cidadão,
que podem ter nos meios de comunicação e no acesso
livre e gratuito às tecnologias da informação
um instrumental de transformação social e de criação
de uma real democracia participativa.
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