Ponto de Vista | ||||||||
09.08.2005 | ||||||||
Discurso acadêmico | ||||||||
Luciana Campos | ||||||||
“Tecnicamente, do ponto de vista da lingüística, todos os falantes nativos de países que tenham o português como língua materna dominam completamente o idioma falado e de modo geral, a variante coloquial. A chamada variante formal, do ponto de vista acadêmico, quando se diz “ele não sabe português”, se refere a um outro domínio, diferente do adquirido pelo falante em tenra idade, até 2 anos. Uma criança que não tem nem a maturidade para outros aprendizados consegue dominar a língua em sua variante coloquial. Então, para essa outra concepção, tecnicamente, o que se pensa e se espera de um aluno, de um profissional, de um professor, de um pós-graduando, técnicos-administrativos, é que dominem por escrito, numa variante de estilo muito formal, de preferência, um gênero discursivo extremamente específico. Esse é um ponto importante que marca as diferenças entre os padrões lingüísticos. Dentro da lingüística, na teoria textual, se estuda este tipo de discurso específico, existindo muitos trabalhos sobre o assunto. Mas, o que vem a ser um texto acadêmico ou um discurso acadêmico? É um discurso no qual o português terá que ser usado com um grau máximo de informatividade e um grau mínimo de subjetividade. O texto acadêmico é o que seria, se a gente imaginasse uma escala de grau mínimo de informalidade para grau máximo de formalidade, de um lado a variante coloquial, no grau mínimo de informalidade, e no outro, o grau máximo, o texto acadêmico. O texto acadêmico tem características de formatação e estratégias específicas. Eu não estou me referindo, apenas, a textos no sentido escrito, somente. Estou falando do discurso acadêmico que pode ser aquele proferido oralmente em uma conferência sem estar baseado em um texto escrito. Este é considerado, também, um texto acadêmico. Há que se fazer muitas distinções para se compreender toda uma gama de conceitos, que para o leigo fica simploriamente reduzida à idéia de que “sei ou não português”. Esse conceito, simplista, provavelmente tem uma origem numa tradição filológica de cunho gramatical, normativista e, basicamente, de um ensino de gramática como fim e não como meio. Provavelmente, ela também provém de uma tradição beletrista, em que se imagina um sujeito erudito que domine todos os conhecimentos e os idiomas de uma forma escorreita. Quando se diz que os alunos não sabem português ou, o aluno de doutorado não sabe redigir a sua tese, está se referindo ao fato dele não ter uma monitoração estilística suficiente para construir o texto acadêmico tal como deve ser construído. Nós temos que pensar que a escola, no ensino fundamental e médio, é que deve ter o papel de permitir aos falantes terem a possibilidade de se apropriarem dos diversos tipos de gêneros e estilos textuais. Porém, a realidade não é essa. A escola não cumpre esse papel. Os estudantes, ao ingressarem nas universidades brasileiras, não possuem um domínio adequado do idioma. Em países como França, Inglaterra e Estados Unidos à realidade não é muito diferente da existente no Brasil. Os franceses também se queixam do francês dos estudantes dentro das instituições de ensino. Os ingleses também. O texto acadêmico, o gênero acadêmico, é, como eu já disse, do grau máximo de formalidade discursiva. E ele é engessado na sua formatação. Este tipo de texto impõe estratégias, marcadores textuais que são próprios a sua configuração e isso terá que se aprendido em algum momento. E esse momento, eu entendo, que não devesse ser realizado no nível superior. O aluno que ingressa na universidade já deveria dominar, ou quase dominar, esse gênero acadêmico”. Foto por: Marco Fernandes |
||||||||
Notícias
anteriores: |
||||||||