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Denise
Lobato Gentil
Professora do Instituto de Economia
"A opinião pública tem sido influenciada
por uma noção negativa de previdência pública,
que não corresponde à realidade. Desmistificar esse
panorama sombrio que se construiu em torno da Previdência
Social não é uma tarefa fácil. Para começar,
os números utilizados para avaliar a situação
financeira da Previdência são enganosos e alarmistas.
Divulga-se que o déficit previdenciário, em 2004,
é de R$ 32 bilhões. Entretanto, esse cálculo
não leva em consideração todas as receitas
destinadas à Previdência, deixando de computar os
recursos provenientes da COFINS, do CPMF, da Contribuição
Social sobre o Lucro Líquido e outras receitas. É
considerada fonte de receita apenas a obtida com a folha de pagamento,
o que é, no mínimo, curioso.
O resultado é um déficit maior que o real. Se for
computada a totalidade das fontes de recursos da Previdência,
o déficit apurado cairá para R$ 17 bilhões
ou 1% do PIB. O governo gastou no mesmo ano de 2004, com o pagamento
de juros da dívida, o montante de R$ 128 bilhões
ou 7,3% do PIB. Se tivesse reduzido milimetricamente a taxa de
juros, teria economizado o suficiente para cobrir o 1% de déficit
gerado pela Previdência. Entretanto, o governo prefere cortar
gastos com a Previdência a ter que limitar as despesas com
juros.
É preciso também advertir o leitor de que é
incorreto avaliar a Previdência isolando os números
do Regime Geral da Previdência Social dos dados do orçamento
da Seguridade Social. Embora muito popular, esta é uma
forma limitada de analisar o problema. A Previdência é
parte integrante do Sistema de Seguridade Social. Poucos sabem,
entretanto, que esse sistema tem uma situação superavitária
desde 1999 até 2004, e que recursos são desviados
da Previdência para financiar o orçamento fiscal
do governo.
Além disso, os grandes programas sociais não devem
ser vistos como negócios de uma empresa privada, que têm
que dar lucro. É incabível julgar o desempenho desses
programas por critérios meramente financeiros, de déficit
nulo. O direito aos benefícios é um direito a cidadania.
Assim, se a responsabilidade do governo é dar proteção
social à população e, no entanto, propõe
zerar o déficit, é porque optou por desistir da
tarefa que lhe cabe de lutar contra a pobreza, com o objetivo
de “acalmar as incertezas do mercado”.
Finalmente, é preciso ressaltar que o déficit previdenciário
tem sido fortemente induzido pela performance da economia. Num
cenário de crescimento econômico muito baixo, a receita
da previdência, que depende do nível de emprego,
do patamar dos salários e do nível dos lucros, tende
a ser menor, enquanto os gastos do governo se elevam, devido ao
agrave no empobrecimento da população. Portanto,
a solução para a “crise” da Previdência
está associada a uma mudança na política
econômica que promova o crescimento econômico. ”
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Maria
Lúcia Werneck
Professora do Instituto de Economia
"São bem-vindas, sem dúvida, medidas destinadas
a combater fraudes e controlar a concessão de benefícios
da Previdência Social. Ajudam a manter a saúde financeira
e, sobretudo, a credibilidade de uma das mais importantes instituições
do país. Não deveriam ser anunciadas, porém,
sob um falso argumento: o de que a previdência, porque deficitária,
precisa de restrições.
A Previdência
Social brasileira é ainda, apesar das tentativas feitas
em 1998 e em 2004 para alterar a sua natureza, parte integrante
de um sistema de Seguridade Social instituído pela Constituição
de 1988. As receitas para o financiamento desse sistema, também
estabelecidas constitucionalmente, são suficientes para
cobrir não só os gastos previdenciários com
os segurados do INSS, como as despesas com saúde e assistência
social, as duas outras partes da Seguridade. Vários estudos
têm mostrado que o volume arrecadado ano a ano com as contribuições
de empregados e empregadores, com a contribuição
sobre o lucro líquido das empresas, com a COFINS (contribuição
sobre o faturamento das empresas), e outras contribuições
(inclusive a CPMF, criada em 1996), ultrapassa em muito o total
dos gastos relativos à seguridade.
Dois fatores
inscritos na legislação infraconstitucional, porém,
promovem a evasão dos recursos da seguridade. O primeiro,
vigente desde 1991, é que o órgão arrecadador
de várias receitas de seguridade é a Secretaria
de Receita, o que equivale a dizer que os recursos arrecadados
vão para o Tesouro, que deles faz o que quer. O segundo
consiste na atual DRU (Desvinculação das Receitas
da União), que já foi Fundo Social de Emergência
e Fundo de Estabilização Fiscal, que permite que
20% das contribuições arrecadadas possam ser usadas
pelo governo para os mais diversos fins.
Mais uma vez,
portanto, a Previdência aparece sob um ângulo distorcido.
Ao invés de ser apresentada como instituição
a ser fortalecida e ampliada para atender a milhões de
brasileiros que ainda estão excluídos de seus benefícios,
é apresentada como instituição cujo único
problema é um déficit irreal, fruto de manipulação
do próprio governo."
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