Olho no Olho

 
01.06.2004  
   

A relação entre estagiários e empresas

Não há dúvidas de que o estágio é complementar ao ensino e fundamental para o estudante desenvolver suas aptidões no contato com a parte prática de sua área de estudo. Por outro lado, muitas empresas servem-se do trabalho do estagiário de forma inadequada, exigindo mais do que devem e assim, prejudicam sua vida acadêmica, pois o tratam como funcionário comum, porém menos oneroso.
A Lei Federal não disciplina carga horária máxima para o estágio, mas explicita, entre outras coisas, que ele não pode prejudicar o desempenho acadêmico. Fica a cargo da Instituição de Ensino a responsabilidade de estabelecer a carga horária, no caso da UFRJ, 4h diárias.
Dois professores de cursos que dependem muito da parte prática para o aprendizado foram convidados para opinar sobre o assunto; o Coordenador de Estágio e do Escritório Modelo da Faculdade de Direito, Prof Roberto Monteiro Litrento e a Coordenadora da Central de Estágio e Orientação Profissional da FACC (Faculdade de Administração e Ciências Contábeis), Profª Mª Tereza Coelho Coutinho.

   
       
 

Prof Roberto Monteiro Litrento
§ Coordenador de estágio e do Escritório Modelo da Faculdade de Direito


O Escritório de Prática Forense, ou Escritório Modelo, tanto da UFRJ quanto de outras universidades, tem como objetivo orientar estudantes em suas atividades do dia-a-dia, fazendo com que lidem com casos concretos, casos reais. É uma possibilidade de sair da dimensão da sala de aula e pôr em prática os conhecimentos adquiridos com o ensino teórico. Prof Roberto destaca que também há o objetivo de fazer com que o aluno, ao desenvolver um contato direto com o trabalho, possa avaliar se possui realmente aptidão para advocacia e, além disso, escolher melhor uma área de especialização profissional.
Quando o aluno procura essa experiência prática fora da universidade, deve procurar estágios sérios. “No caso do Direito, os escritórios podem ser conveniados à Ordem dos Advogados ou mesmo à própria Universidade. Esses escritórios também têm a atividade de aferir se o estágio está sendo aproveitado. Existem muitas empresas sérias, conveniadas, que geralmente respeitam a carga horária de quatro horas diárias do estagiário, sem prejudicar seus estudos”, explica Prof Roberto. Por outro lado, ele também acrescenta que existem empresas que agem de modo antiético, explorando a mão-de-obra do estagiário. “Essa exploração é perniciosa e deveria ser combatida. Muitos estagiários estão trabalhando sem o amparo que a CLT garante ao trabalhador, servindo como mão de obra barata. Entretanto, muitas vezes o estudante sujeita-se a buscar as formas irregulares de estágio pela remuneração oferecida, pois tem necessidade de um dinheiro a mais para custear seus gastos e ajudar a família”.
Todo estudante precisa ter, obrigatoriamente, uma carga horária mínima de experiência prática em sua área, para se graduar. No caso da Faculdade de Direito, o estudante deve cumprir um plantão semanal de no mínimo duas horas durante quatro períodos, tanto no próprio Escritório Modelo quanto em uma empresa conveniada.
“Entre estagiário e empresa deve haver uma relação de troca, para que ambos saiam ganhando. As empresas ganham, principalmente, ao receber estudantes interessados, empenhados em se aprimorar e até, quem sabe, vestir a camisa da própria empresa. O aluno, com certeza, adquire muita experiência como estagiário, principalmente se o profissional ao qual ele estiver subordinado atua como orientador de suas atividades. Muitas vezes o estagiário é aproveitado para os quadros da própria empresa, sendo efetivado como um profissional que foi orientado, desde o início, dentro daqueles padrões”.
Prof Roberto lamenta que haja empresas somente interessadas no estagiário como mão-de-obra barata, mas não como um investimento. Nesse caso, quem ganha mais é a empresa, pois deixa de pagar o que deveria, segundo a CLT, a um empregado. São os direitos que um trabalhador com carteira assinada tem, e o estagiário não.
Na opinião do professor, “o estagiário está buscando aprendizado, mas também auxilia as empresas no dia-a-dia. Eles não servem apenas para ´empurrar papel´, como se costuma dizer”. Ele acha lamentável quando, sob uma aparência de um contrato de estágio se esconde, na verdade, uma prestação contínua de trabalho. Ao não assinar carteira, a empresa dribla o ônus que se tem com um funcionário regular.

 

 
 
 

Profª Mª Tereza Coelho Coutinho
Coordenadora da Central de Estágio e Orientação Profissional da FACC


A Central de Estágio e Orien-tação Profissional da FACC (Facul-dade de Adminis-tração e Ciências Contábeis) funcio-na de segunda à sexta, de 12h às 18h, divulgando ofertas de estágio relativos à Administração e Ciências Contábeis e, eventualmente, à Econo-mia e Psicologia. A Central está em contato direto com diversas empresas e orienta alunos quanto ao mercado de trabalho e à elaboração de currículos, entre outras atividades.
A Coordenadora e Professora Mª Tereza Coelho Coutinho vê vários problemas na relação estagiá-rio/empresa atualmente. “Infelizmente, nos últimos tempos, várias empresas têm nos aborrecido”.
Ela enxerga um lado perverso no fato de empresas contratarem os estagiá-rios com o claro objetivo de aproveita-los como funcionários, tirando bene-fícios econômicos disso, pois não precisam, por exemplo, pagar o décimo terceiro salário e as férias. “As empresas buscam bons alunos, mas não para atuarem como estagiários, e sim como funcionários, trabalhando mais do que a carga horária mínima recomendada de quatro horas diárias. Muitos chegam a trabalhar por período integral de oito horas e até 10h ou 12h diárias. Conseqüentemente, o Coefi-ciente de Rendimento (CR) dos alunos acaba diminuindo e eles são preju-dicados em sua formação acadêmi-ca”. Porém, de acordo com a professora, um dos fatores que mais pesa no fato do estudante buscar esse tipo de trabalho é a remuneração oferecida, que, no caso da Admi-nistração e Ciências Contábeis é alta.
Um aspecto negativo destacado pela Profª Tereza é o baixo índice de alunos que se formam e são efetivados. “Quando esperam ter sua situação regulamentada como funcionários, eles são dispensados para dar lugar à contratação de novos estagiários”.
O convênio estabelecido entre empresas e Universidades tem um valor jurídico e disciplina a carga horária mínima de 4h diárias, o que não é respeitado na maioria dos contratos. “Entre meus alunos, eu sinto que alguns estão tomando consciência de que não é interessante trabalhar oito, dez horas diárias, porém, infelizmente, não temos como fiscalizar isso”.
Profª Tereza ainda destaca que “a demanda para nossos alunos é grande e bastante variada, dentro dela há oportunidades muito boas de estágios interessantes e desafiadores e de empresas que investem bem nos alunos”. Ela conclui que “o estágio é muito importante, principalmente se o aluno tem boas possibilidades de crescimento a partir dele. Minha única crítica é em relação às empresas que vêem os alunos como funcionários e não como estagiários, enquanto que, sendo pagos como estagiários, quem ganha mais é a empresa”.

 
 
 

 

 

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