Olho no Olho

 
18.05.2004  
   

UFRJ discute sistema de cotas étnicas

A reserva de vagas para negros e índios nas universidades públicas divide opiniões no meio acadêmico. A UFRJ não é favorável a que se faça distinção étnica, mas sócio-econômica. Atualmente, alunos das escolas públicas e privadas competem por vagas nas instituições de ensino superior sob os mesmos critérios. Este ano, as regras para o vestibular devem mudar. O presidente Lula enviou ao Congresso Nacional projeto de lei que determina a reserva de vagas para alunos que tenham cursado todo o ensino médio na rede pública.
O professor do Instituto de Química e coordenador do Jovens Talentos 2, programa de inclusão social do governo estadual, Cláudio Lopes, elogiou o reitor Aloísio Teixeira, que propôs ao CEG a reserva de 20% das vagas da UFRJ para estudantes de escolas públicas, e o presidente Lula pelo projeto de lei que deverá ser analisado no Senado, ainda este ano. Contudo, diz que as medidas precisam ser mais discutidas. Já o professor Luis Antônio Cunha, da Faculdade de Educação da UFRJ, diz que a reserva de vagas para negros e índios é um equívoco, por considerá-la um artifício racista para combater o racismo. O Olhar Virtual da UFRJ revela a opinião de ambos:

   
       
 

Luiz Antônio Cunha
Professor da Faculdade de Educação

“A adoção de cotas raciais é mais um ca-pítulo do pro-cesso de americanização do Brasil. Essa proposta tem na so-ciedade brasi-leira uma repercussão populista, sendo considerada uma proposta democrática e, portanto, acrítica. A UFRJ deve discutir essa questão – e eu sei que vai. Quero estar presente, assistindo e participando de uma maneira ativa. O ingresso de alunos pelo sistema de cotas levanta duas questões: como são valorizados os negros/pardos? A princípio, por seu “desvalor”. Há uma inferiorização do indivíduo definida pela cor da pele. Além disso, conclui-se que o ensino público está definitivamente irrecuperável. E, por isso, esse mecanismo compen-satório se faz necessário, porque seria a única forma de garantir a igualdade de oportunidade. São duas observações que merecem uma reflexão mais ampla e séria. Os EUA adotaram há alguns anos a reserva de vagas nas universidades para negros. Mas é preciso entender que preconceito no Brasil é dife-rente do praticado pelos norte-americanos. A primeira diferença é que aqui, os negros são discri-minados por sua aparência. Nos EUA, o preconceito é contra a ascensão social. Outra é que o preconceito é condenado por nossas leis. Diz-se que as cotas étnicas – não vou nem falar da confusão negros/pardos – são para negros, pardos, ou para quem se acha negro, mas essas, na realidade, procuram utilizar um instrumento racista contra o racismo. Nesse momento, esse mecanismo é utilizado para dar chance de ingresso à universidade brasileira pública. E o que defendo é que as universidades públicas devem ter alunos de todos as origens sociais, étnicas, políticas, ideológicas e culturais, sem discriminação.”

 
 

Cláudio Lopes
Coord. do programa da inclusão social Jovens Talentos e professor do Departamento de Química da UFRJ

“Um dos maiores exemplos da desi-gualdade social no Brasil é o exame de vesti-bular. Uma pes-soa que vem da rede pública, sem base não pode competir com quem estudou em escola particular, com todo apoio possível. Essa questão é complicada, pois as pessoas já estão acostumadas e já traçaram atribuições de mérito. Dizem: “tem que melhorar o ensino médio como um todo”. Todo mundo sabe disso. Mas, para que isso aconteça, é preciso esperar uns 38 anos. O negro brasileiro veio para o Brasil, construiu o país, permanece fora e ainda querem que eles esperem mais 38 anos?! Outros prevêem; “o nível da universidade cairá”. No programa Jovens Talentos 2, que coordeno, o nível não caiu e nem subiu. O fato é que se essas pessoas entram na universidade, aumenta a base de sustentação econômica, desenvolve a economia. Por exemplo, hoje, exporta-se minério de ferro no estado bruto. Com mão-de-obra qualificada disponível, é possível agregar valor nesses produtos. Vender café em grão, mas também cafeína elaborada, como componente de estimulantes, por exemplo. Na UFRJ, querem reservar vagas para estudantes de escolas públicas. Acredito que é preciso considerar, prioritariamente, a condição sócio-econômica. Defendo cotas para negros, índios, deficientes físicos e alunos da rede pública, sendo considerado como fator principal o corte econômico. Quando inserem alunos dos CAPs, Pedro II, ou da Federal de Química, não alcançam as classes D e E, apenas a classe média. No Jovens Talentos 2, o aluno precisa comprovar que tem renda per capita de 300 reais. Mas é preciso criar uma política séria para manutenção desses alunos (criação de restaurantes populares, ou bandejões, bolsas, disciplinas instrumentais, etc). O Brasil precisa mudar, e a universidade é o lugar propício para o início desse avanço.”

 
 
 

 

 

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