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Horta no telhado

Aline Durães


Na última sexta, dia 21, cerca de 20 crianças se aglomeravam no pequeno quintal da casa de Luana da Silva, na comunidade de Rolla II, em Santa Cruz, Zona Oeste do Rio de Janeiro,. Apesar da chuva fina e insistente, meninas e meninos, estudantes do ensino fundamental do CIEP Ismael Nery, portando enxadas, pás e colheres de pedreiro, preparavam a terra que receberia a primeira horta de telhado da região.

O projeto Horta de Telhado: uma tecnologia social foi concebido por Maria Aparecida Moraes, pesquisadora do Instituto de Geociências (Igeo) da UFRJ e professora de Geografia do CIEP. A ideia é implantar hortas suspensas em comunidades de baixa inclusão social para intervir, de forma ambientalmente sustentável, na cultura alimentar local. Por ter o menor índice de desenvolvimento humano (IDH) da cidade do Rio, Santa Cruz foi o bairro escolhido para abrigar o início do projeto.

A horta plantada no telhado oferece a vantagem do baixo custo: para ser efetivada, são necessários apenas sementes, esterco bovino, barro vermelho e terra adubada. “O nosso objetivo é promover uma economia doméstica para as famílias dos alunos do CIEP Ismael Nery. No telhado, podemos plantar ervas medicinais, hortaliças e temperos. Pelos meus cálculos, cada família vai economizar cerca de R$ 5 por semana em compras de sacolão, supermercado e em farmácia. Pretendemos atender cerca de duas mil casas, o que, no fim das contas, promoverá uma boa economia”, sublinha Maria Aparecida.

Diferentemente do telhado verde, técnica de cultivo em lajes, a horta de telhado beneficia comunidades de baixa renda, já que pode ser desenvolvida em telhas de amianto e não necessita de impermeabilização. “Com o mínimo de recursos, a família consegue plantar”, elucida a geógrafa.

As etapas

Depois de realizar o diagnóstico socioambiental do bairro de Santa Cruz, que carece, dentre outras coisas, de saneamento básico, rede de esgoto, arruamento e água tratada, Maria Aparecida percebeu que chegara a hora de a UFRJ retornar os recursos investidos pela sociedade em suas pesquisas e de intervir na realidade de pobreza da Zona Oeste. Foi assim que o projeto deslanchou.

A primeira etapa da horta de telhado se constituiu na criação de uma sementeira nas dependências do CIEP Ismael Nery. “Pegamos dois espaços ociosos da escola, onde os alunos costumavam despejar lixo, e construímos a sementeira. Os estudantes plantaram, fizeram o traçado da sementeira, colocaram as sementes e, quando voltaram de férias, as mudas já haviam brotado”, conta Cláudia Medina, diretora da escola e uma das maiores entusiastas do projeto.

Depois de brotarem, mudas de diversos tipos de plantas — entre elas, coentro, mostarda e saião — estão sendo, gradativamente, transportadas para o telhado das residências dos alunos. A casa de Luana foi só a primeira a receber a horta. “Esse projeto é patrocinado pelo Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) do MEC. Como as verbas ainda não chegaram, tivemos que lançá-lo a partir de doações dos alunos e dos professores: cada um tirou dinheiro do próprio bolso para comprar o material e muitos trouxeram utensílios de casa para viabilizar o lançamento do projeto”, ressalta Maria Aparecida.

A participação dos alunos

Para os alunos da 6º à 9º séries do CIEP Ismael Nery, o projeto Horta de Telhado será uma das cinco avaliações aplicadas pela professora Maria Aparecida Moraes. Para a escola, no entanto, essa foi a forma encontrada de elevar o seu índice de desenvolvimento da educação básica (Ideb), indicador que mede o rendimento escolar das turmas do ensino fundamental.

Cláudia Medina explica que, por conta da evasão, o Ideb do colégio estava abaixo do esperado. “Na comunidade, não há lugares de lazer e diversão. O espaço social dessas crianças é a escola. Muitas vezes, eles não estão nas salas, mas estão na quadra ou no pátio conversando. Os alunos se mostraram ansiosos para ver a horta acontecer. Por isso, acreditamos e apoiamos a iniciativa”, diz.

E os alunos, de fato, compraram a ideia. Além de trabalharem na sementeira, os estudantes ficam responsáveis por plantarem e cuidarem das mudas em seus telhados. Para Luciana Ferreira da Silva, mãe de Luana e dona da primeira horta de telhado de Rolla II, o ponto alto do projeto foi ver o interesse da filha na iniciativa. “Eu acho que, com a horta, ela pode desenvolver a responsabilidade de cuidar, de molhar. Sem contar que as pessoas aqui da minha comunidade podem precisar das ervas e eu vou poder ajudar”, afirma.

Próxima fase

Apoiado pela prefeitura da UFRJ e pelo Grupo de  Estudos Sociosambientais da UFRJ, o projeto tem como intenção futura atuar na comunidade do Aço, através do Colégio Estadual João Vitta. A proposta é levar para a localidade cerca de 50 hortas de telhado e 3 mil hortas em garrafas pet, além de promover campanhas de cloração da água e a distribuição de torneiras com filtro. “No Aço, a renda familiar é inferior a um salário mínimo. Lá, não se trata a água, e a maioria vive da Bolsa Família. Pretendemos atender mais de 3 mil famílias, o que já é um grande universo. Queremos agora o apoio da PR-5 (Pró-reitoria de Extensão da UFRJ), para que ela possa colocar a Zona Oeste no rol da extensão universitária”, finaliza Maria Aparecida.