Entrelinhas

Um estado, vários olhares

Lorena Ferraz

capa do livro

No dia 13 de novembro, aconteceu o lançamento do livro História e geografia fluminense. A vice-presidente do Instituto Histórico e Geográfico do Rio de Janeiro (IHGRJ), Neusa Fernandes, e Olínio Coelho, professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da UFRJ, organizaram o volume, composto pelas palestras apresentadas no III Congresso Fluminense de Geografia e História, realizado de 9 a 11 de novembro de 2007.

Para Neusa Fernandes, “a diversidade dos temas do livro – em que são apontados muitos aspectos da Geografia e vários momentos da História fluminense – apresenta um panorama histórico vivo do Rio de Janeiro. E sinaliza importantes caminhos de pesquisa”.

O livro foi dividido em três grandes blocos. O primeiro trata das conferências do professor Arno Wehling e de Beatriz Kushnir. O segundo é formado por sete capítulos de temáticas diversas. No sétimo capítulo, por exemplo, Luiz Benyosef, doutor em Física e chefe da área de Geomagnetismo do Observatório Nacional do Ministério da Ciência e Tecnologia, fala sobre “O Memorial Judaico de Vassouras”. No memorial, estão enterrados os corpos de dois judeus que, em meados do século XIX, não puderam ser sepultados no único cemitério da cidade porque o local era cristão. O terceiro e último bloco presta homenagem ao historiador Nelson Werneck Sodré, em comemoração aos dez anos de seu ingresso no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.

O Olhar Virtual conversou com os organizadores do livro. Confira a entrevista na íntegra e conheça melhor a obra.

Olhar Virtual: O livro é composto de diversas palestras. Entre essas apresentações, existe alguma que o senhor considere mais relevante?

Olínio Coelho: Todas as palestras têm o mesmo grau de importância. O professor Arno Wehling, presidente do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB), abriu o referido congresso falando sobre “O Instituto Histórico e Geográfico do Rio de Janeiro e a construção da identidade regional”. Arno discorreu sobre a criação de novos pólos de pesquisa nos municípios, isto é, de institutos locais fundamentais para a formação de uma rede que viabilize a troca de influências. Os municípios de Macaé, Paraty, Duque de Caxias, São Gonçalo, Vassouras, Niterói e Petrópolis têm Institutos Históricos e Geográficos específicos.

Beatriz Kushnir também participou da abertura do referido congresso, com a apresentação intitulada “Antes do Paraíso o expurgo: a Hospedaria Central da Ilha das Flores um registro da presença judaica na cidade do Rio de Janeiro”. Em seu estudo, Beatriz fala sobre o comportamento dos imigrantes que ficavam em quarentena na Ilha das Flores.

Olhar Virtual: Um dos artigos que compõe o livro trata da imprensa carioca. Quais aspectos foram abordados sobre esse tema?

Olínio Coelho: Os trabalhos sobre a imprensa fundamentam-se nos estudos sobre “O Jornal do Comércio, O Correio da Manhã, Correio do Povo e O Mensageiro da Paz”. Vale destacar a grande contribuição da imprensa para a formação do povo brasileiro e sua relação com o governo e o poder.

Olhar Virtual: O livro fala sobre o patrimônio cultural fluminense. Em uma entrevista concedida ao Olhar Virtual, no ano de 2004, o senhor falou que a Prefeitura não controlava a expansão urbana de forma a proteger o patrimônio. Atualmente como está sendo tratada a questão do patrimônio cultural na cidade do Rio de Janeiro?

Olínio Coelho: A situação continua a mesma. Percebi que os candidatos às prefeituras dos municípios do Rio não falaram da questão do patrimônio cultural em seus discursos. Recentemente, Jandira Feghali, nomeada secretária da Cultura, expôs sua intenção de rever as APACS – Áreas de Proteção Cultural – e destombar edifícios protegidos pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). Essas declarações são perigosas, pois ameaçam o Patrimônio Cultural da cidade.

Na palestra que ministrei durante o congresso, procurei alertar as pessoas sobre a falta de políticas públicas para a proteção patrimônio histórico.

Olhar Virtual: “Os cristãos-novos nos engenhos cariocas” e “A Geração ISEB-Instituto Superior de Estudos Brasileiros” foram palestras ministradas pela senhora durante o referido congresso fluminense. Quais assuntos são tratados nessas apresentações e qual a importância de Nelson Werneck Sodré como professor do ISEB?

Neusa Fernandes: Na primeira palestra, falo da presença dos cristãos-novos, que eram perseguidos pela inquisição portuguesa em uma fazenda na zona conhecida com Colubandê. A casa teve vários ocupantes, desde que foi construída pelos jesuítas. Já foi sede do clube e do quartel da polícia rodoviária. No entanto, seus primeiros proprietários foram os cristãos-novos da Família Valle. A fazenda ostentava uma riquíssima produção de açúcar sob a direção dos Valle. Isso, porém, não impediu que a Inquisição perseguisse e prendesse seus proprietários. Atualmente, o engenho localiza-se em São Gonçalo e, junto à Capela de Santana, constitui um conjunto arquitetônico do século XVIII tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.

No segundo momento, discorro sobre o ISEB. O instituto foi pensado no governo Café Filho, mas sua criação só aconteceu anos depois durante o mandato de Juscelino Kubitschek. Ele reunia uma elite intelectual e foi dirigido pelo filósofo Roland Corbicier. Pensar o projeto de desenvolvimento do Brasil e diagnosticar os problemas brasileiros eram seus objetivos. Em uma primeira fase, os alunos foram indicados pelo governo, depois eles passaram a ser selecionados em parceria com a União Nacional dos Estudantes (UNE). Durante seus anos de funcionamento, foi responsável pela produção de inúmeros cadernos e peças teatrais onde atuaram artistas renomados, como Fernanda Montenegro e Carlos Lira. O ISEB foi extinto pela Ditadura Militar, instaurada em 1964.

Werneck Sodré foi professor da cadeira de História Colonial Brasileira no ISEB. No entanto, o legado deixado por ele está para além de sua participação nesse instituto. Sodré foi um historiador muito famoso e teve diversos livros publicados. Por ser intelectual e idealista, foi perseguido durante a o governo militar. Talvez ele tenha sido o único historiador brasileiro plenamente marxista.

Olhar Virtual: Como a senhora definiria a importância do livro História e geografia fluminense para a sociedade?

Neusa Fernandes: A diversidade dos temas do livro – em que são apontados muitos aspectos da geografia e vários momentos da história fluminense – apresenta um panorama histórico vivo do Rio de Janeiro. E sinaliza importantes caminhos de pesquisa.