Olho no Olho

Estamos sós no universo?

Priscila Sequeira

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A existência de vida extraterrestre sempre despertou a curiosidade pública e levanta discussões, embasadas por argumentos de cunho científico, filosófico e religioso, entre aqueles que acreditam e aqueles que não. 

São inúmeros os casos de supostas aparições de discos voadores e de pessoas que alegam terem sido vítimas de abduções alienígenas. Uma série de histórias povoa o imaginário popular, como, por exemplo, a do E.T. de Varginha, episódio no qual uma criatura extraterrestre teria sido avistada por três mulheres na cidade de Varginha, Minas Gerais, em 1996.

A fim de buscar respostas, a Astrobiologia realiza pesquisas científicas, explorações espaciais e observações astronômicas. Trata-se de uma ciência que estuda a vida no universo a partir da compreensão da vida no próprio planeta Terra. No entanto, até mesmo os cientistas divergem entre si acerca de tal questão e dividem-se em duas correntes: a pessimista, que despreza a possibilidade de haver vida fora dos limites terrestres, e a otimista, vertente que crê nessa hipótese.

Para comentar essa questão, o Olhar Virtual entrevistou Hélio Pinto, professor e coordenador acadêmico de Pós-Graduação, e Gustavo Mello, professor associado, ambos do Observatório do Valongo (OV-UFRJ).

Hélio Pinto
Professor e coordenador acadêmico de Pós-Graduação (OV-UFRJ)

As correntes de pensamento dos cientistas em relação à existência de vida extraterrestre são muito diferentes. A corrente pessimista parte do princípio de que as condições favoráveis para existência da vida na Terra são tão bem ajustadas que elas são difíceis de serem reproduzidas em outros planetas. O pensamento é de que a Terra é tão específica, tão especial, que a vida inteligente só surgiria em outro lugar que seja exatamente como o nosso planeta. Já a corrente otimista acha que a vida aparece sempre que há as condições mínimas necessárias - energia, alimento, água com uma grande quantidade de compostos orgânicos de carbono e uma variação adequada de temperatura para que as reações químicas típicas da vida possam ocorrer. De acordo com essa corrente, forma-se a vida, sempre que há fatores favoráveis. A maior parte dos organismos vivos, de acordo com a corrente otimista, seria unicelular, seriam seres mais fáceis de serem formados.

 Parte do que os cientistas usam para argumentar se há ou não vida fora do planeta, mesmo que eles não admitam, está relacionada às suas crenças pessoais. Muitos cientistas guardam suas crenças em Deus e acham que isso implica que Deus escolheu a Terra para colocar os seus filhos queridos. O pensamento é muito forte nos Estados Unidos, mais até do que no Brasil. Alguns deles acabam seguindo a linha pessimista, porque, para as suas crenças pessoais, não é interessante que haja outros mundos habitados, já que isso diminuiria a revelação divina. Outros até crêem em Deus, mas, pelo contrário, acham que, se Deus existe e cria coisas, por que Ele não criaria vida em todos os mundos? E há, claro, aqueles otimistas que não vêem a necessidade de acreditarem em Deus, propriamente, e acham que a vida tem a mesma probabilidade de aparecer em qualquer local. Na minha opinião, o importante para que haja vida extraterrestre é a vida parecer adaptar-se ao seu ambiente e ser persistente. Há traços de vida no passado bem remoto da Terra, mesmo quando a Terra não tinha um ambiente tão hospitaleiro. Então, eu creio, a vida vai aparecer sempre que houver condições necessárias. Eu não vejo a vida como um fenômeno especial nem divino, ela é um passo da organização da matéria.

A vida em formas primitivas, como a microscópica, deve ser o que mais acontece no universo. Eu acredito em forma de vida extraterrestre, tanto unicelular quanto pluricelular, inclusive metazoária, que seria semelhante aos grandes animais da Terra. Creio nisso porque a quantidade de estrelas que existem no universo é muito grande.

No entanto,  parece-me improvável que seres extraterrestres venham até aqui. Nunca foi provado nada, nenhum objeto foi capturado, nenhum ser foi dissecado. As dificuldades de transporte são tão grandes que não há como conceber essas visitações tão freqüentemente relatadas como reais. Além disso, a distância entre as estrelas é muito grande. Mesmo viajando à velocidade da luz, demoraria muito tempo. Porém, isso é impossível porque, de acordo com toda a Física que conhecemos, a velocidade da luz é inatingível e intransponível. Não há a possibilidade de você pegar um objeto material e acelerá-lo à velocidade da luz sem transformá-lo em luz. O objeto se transformaria em radiação ao longo do caminho. Essas supostas visões de UFOs e OVINIs acabam, quase sempre, aproximadas a explicações mais simples, causadas por outros fenômenos, como, por exemplo, fenômenos atmosféricos, sondas e balões.

Gustavo Mello
Professor associado (OV-UFRJ)

A principal diferença entre as correntes pessimista e otimista diz respeito às condições consideradas necessárias para a evolução de organismos complexos, multicelulares, como os seres humanos. Ambas concordam que as condições necessárias à vida, ou seja, a química complexa do carbono, oxigênio, nitrogênio e hidrogênio, mais a água líquida e a energia, sejam abundantes no universo. O desacordo surge quando a corrente otimista acha que essas condições levam natural e facilmente ao surgimento de vida complexa. Nisso as duas escolas discordam. O pessimismo sustenta que os organismos unicelulares, muito mais simples e imensamente mais resistentes às condições adversas, poderiam ser muito comuns no universo. A vida microbiana não exige condições especialmente benignas ou estáveis e tem muito mais chance de existir em abundância. No entanto, a vida metazoária e, particularmente, a vida inteligente e consciente, poderia ser bastante rara. Para essa visão da Astrobiologia, várias particularidades da evolução do planeta Terra e do Sol parecem não ser exatamente típicas, o que poderia sugerir que, no plano mais astronômico, as condições no planeta Terra poderiam ser especiais e raras, pelo menos em alguns aspectos.

Há questões que expandem consideravelmente as bases de discussão desse assunto. As evidências de fósseis de bactérias em um meteorito marciano, por exemplo, apesar de não serem conclusivas, permanecem como uma fascinante possibilidade de existência de vida extraterrestre, assim como a água líquida supostamente encontrada na lua Europa de Júpiter, que, apesar de ainda não ter sido confirmada, é uma forte possibilidade, de acordo com dados recentes da sonda Galileu.

No entanto, alegações como a de que estamos sendo visitados por civilizações inteligentes em naves avançadas é espetacular e, para ser creditada, exige evidência espetacular. Não há qualquer fiapo de prova de que estejamos efetivamente sendo visitados por civilizações extraterrestres. A ufologia nunca foi capaz de produzir evidência convincente para as espetaculares alegações que faz. Onde está a evidência? Essa evidência simplesmente não existe. O assunto todo pertence muito mais ao domínio da psicologia, no que diz respeito a fenômenos culturais de massa da modernidade, por mais irônico que isso possa parecer. Até o psicanalista Carl Jung interessou-se pelo assunto entre os anos 1950 e 1960, quando o fenômeno tomou um vulto global, curiosamente, exatamente quando começou a era espacial do pós-guerra, durante a guerra fria.

Ocorre que todas as questões científicas que tocam em temas de origem despertam um interesse que se pode quase chamar de filosófico. Como a cosmologia, por exemplo, o estudo da origem do universo. A pesquisa sobre a origem e a evolução da vida toca em saber quem somos, para onde vamos e outros temas afins. Essas questões sempre permanecerão no centro das preocupações humanas.