Olho no Olho

Déficit Educacional

Camilla Muniz

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Na última semana, o Brasil tomou conhecimento de seu desempenho, em 2006, no Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa), aplicado a cada três anos pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), entidade internacional e intergovernamental que defende a democracia e a economia de mercado. No Pisa, jovens dos países participantes do programa são avaliados através de provas que testam as habilidades dos estudantes em leitura, matemática e ciências.

Os resultados brasileiros no Pisa refletem a baixa qualidade do ensino no país. De acordo com o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), esta foi a terceira participação nacional no Pisa, na qual foram avaliados 9.295 estudantes de todo o Brasil. As provas são aplicadas a alunos de aproximadamente 15 anos, idade que, normalmente, marca a transição entre o Ensino Fundamental e o Ensino Médio.

No ranking de leitura, o Brasil alcançou 393 pontos, registrando uma queda de dez pontos em relação ao ano de 2003. Já em matemática, o país conseguiu 370 pontos que, apesar de serem poucos, representam um aumento de quatorze pontos, quando comparados com os resultados da avaliação anterior. Em ciências, os 390 pontos obtidos em 2003 se mantiveram como os do ano passado. Dessa forma, o Brasil amarga péssimas colocações entre os 57 países avaliados, sendo o 8º pior em leitura e o 4º pior em matemática.

Para entender as causas dos resultados brasileiros — que se encontram detalhados no endereço www.inep.gov.br — o Olhar Virtual conversou com Felipe Acker, professor do Instituto de Matemática e coordenador do curso de graduação em Matemática Aplicada, e com Sílvia Rodrigues Vieira, professora e pesquisadora da Faculdade de Letras.

Felipe Acker

Professor do Instituto de Matemática


Os baixos índices que o Brasil vem conquistando em avaliações internacionais não são de exclusividade da Matemática, mas o resultado de um problema básico que afeta todo o ensino fundamental. O país não melhorou a qualidade da educação básica, não investiu na formação de professores e não se preocupou em aumentar os salários dos profissionais qualificados. A causa dessa situação está na forma como o país é governado. Os primeiros sinais de investimentos em educação levam cerca de 20 anos para aparecerem e como os governos duram, no máximo, oito anos, muitas vezes os interesses políticos acabam prejudicando esses investimentos. No Brasil, é mínimo o incentivo dado aos jovens para que eles se tornem professores qualificados.
De fato, a Matemática é uma disciplina que oferece maior grau de dificuldade ao estudante devido a certos aspectos técnicos. Desde 2001, participo da banca que corrige as provas de Matemática aplicadas no vestibular. A cada ano de concurso, me deparo com resultados cada vez piores. Costumo dizer que, para ingressar na UFRJ, ter um bom ensino fundamental já é suficiente. Mas se manter na universidade não é uma tarefa fácil e requer um bom ensino médio também. Entretanto, ainda no vestibular, poucos alunos demonstram que receberam educação fundamental de qualidade. Assim, os estudos na universidade sofrem grandes prejuízos. Uma grande prova disso é o alto índice de reprovação na disciplina Cálculo.
Essa conjuntura acarreta certa queda do nível dos cursos oferecidos pela universidade. Contudo, não quero ser pessimista. Certamente, os cem melhores alunos de engenharia hoje estão no mesmo nível dos cem melhores há dez anos. Mas a situação atual é que a quantidade de alunos no meio acadêmico aumentou e a qualidade, infelizmente, não acompanhou esse crescimento quantitativo.

Silvia Rodrigues Vieira

Professora da Faculdade de Letras


Os índices alcançados pelo Brasil no Pisa devem ser atribuídos a mais de um fator. O primeiro deles está relacionado à história do ensino de Língua Portuguesa no país, que vem passando por reformulações — já aceitas pelos parâmetros curriculares nacionais — para recuperar o déficit de informação dos estudantes. O objetivo dessa revisão do ensino é ampliar a competência leitora dos alunos, no que diz respeito ao letramento e à interpretação de textos dirigidos a diferentes públicos, bem como sanar as dificuldades apresentadas na produção textual. A prioridade do ensino de Língua Portuguesa deve estar orientada para a compreensão da lingüística do texto. Por isso, as reformulações buscam centrar a metodologia nos gêneros textuais e na análise de elementos lingüísticos formais construtores de sentido no texto. Hoje, os profissionais de educação já desenvolvem trabalhos para que os alunos não só interpretem frases, o que é importante, mas também analisem o texto como um conjunto formador de sentido.

Entretanto, essa adaptação teórico-metodológica demora a repercutir em resultados, principalmente em pesquisas internacionais. Mas os profissionais que estão envolvidos com o ensino de Língua Portuguesa no Brasil já sentem uma evolução significativa dos alunos na produção textual e na leitura. Ainda assim, o grande problema é a compreensão das entrelinhas do texto, embora o entendimento dos elementos explícitos já seja bem desenvolvido pelos alunos.

Outro fator que pode explicar a colocação brasileira nos estudos da OCDE é a existência de enormes dificuldades na formação de professores, que não é a ideal devido a questões de ordem econômica e financeira, além do problema do isolamento da informação. Muitas instituições não oferecem aos graduandos as informações mais recentes da ciência da linguagem, o que representa um empecilho para a formação de profissionais atualizados. Creio que investir na extensão universitária é uma excelente solução para esse problema.

Dessa forma, as dificuldades dos alunos no aprendizado e de formação dos professores, somadas à demora que os reflexos das adaptações metodológicas levam para serem percebidos, são as principais causas dos baixos índices do país em leitura. No entanto, vale ressaltar que, embora os resultados ainda não apareçam, a reformulação do ensino de Língua Portuguesa no Brasil já se encontra em estágio avançado, produzindo efeitos bastante significativos.