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Licenciatura: um ramo promissor

Kadu Cayres e Nathália Perdomo

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Não é difícil perceber a escassez de professores no ensino médio, principalmente nas áreas de Matemática, Física, Química e Biologia. A licenciatura tem se tornado um caminho cada vez mais distante dos planos dos recém-formados. Muitas pessoas optam pelo bacharelado, já que nesse caso, a formação proporcionada ao aluno é mais voltada para o mercado de trabalho, o que o torna apto a desenvolver atividades em determinada área de atuação, não restrita ao ambiente da sala de aula. Um entrave, segundo alguns alunos, é o distanciamento entre os cursos da área de exatas e o que se aprende nas aulas de licenciatura, que requerem disciplinas pedagógicas e 300 horas de prática de ensino.

De acordo com Cláudia Bokel, professora e responsável pela Central de Estágios da Faculdade de Educação (FE) da universidade, essa lacuna entre bacharelado e licenciatura não existe. “Tentamos sempre aproximar a teoria da prática, estabelecer diálogo entre o que o bacharel aprendeu na sua instituição de origem, com o que será ensinado por nós. Não podemos o distanciar demais de sua realidade acadêmica, senão, ele não saberá como agir em sala de aula, não terá um discurso apropriado” — esclarece a professora, ressaltando que a baixa demanda pela licenciatura pode vir, simplesmente, da não aptidão para o magistério. “Temos que verificar o perfil de cada aluno. Alguns não desejam lecionar. Em contrapartida, muitos visualizam, na licenciatura, um caminho além do que a carreira oferece”.

Cláudia ainda afirma que a informação de que há carência de alunos oriundos desses cursos, na licenciatura, não procede. Segundo o levantamento realizado por ela, pode-se concluir que nessas quatro cadeiras, há quase 200 alunos inscritos em estágio supervisionado (44 em Física; 33 em Matemática; 73 em Biologia e 43 em Química). “Essa média de 200 inscritos é normal, pois são 1200 alunos divididos por 13 segmentos. Se comparado a tempos anteriores, podemos considerar que houve um aumento na procura desses cursos pela licenciatura” — conclui.

A UFRJ forma, em média, 30 licenciados e 15 bacharéis em matemática por ano e a procura pelo curso no vestibular é de seis candidatos para uma vaga na licenciatura e quatro para uma no bacharelado. Ângela Rocha, professora e decana do Centro de Ciências Matemáticas e da Natureza (CCMN), explica que isto ocorre devido a maior oferta no mercado de trabalho para licenciados nessa área. “Esses profissionais podem trabalhar na educação básica, nos ensinos fundamental, médio e superior, enquanto os bacharéis têm menos espaço, podendo atuar apenas no ensino superior e em empresas privadas. No entanto, no Brasil, esta última opção praticamente não existe, tendo em vista que as pesquisas são desenvolvidas quase que integralmente nas universidades”.

Ângela levantou também a existência de um grande número de professores que não tem qualificação pedagógica, os chamados professores leigos. “É preciso criar oportunidades para que eles completem a sua formação, essencial para a melhoria da qualidade da educação básica no nosso país. Para estes profissionais, a formação à distância é ideal, pois permite maior flexibilidade de horários, de acordo com o ritmo próprio de cada um”.

Baixos salários e falta de perspectiva na carreira podem ser fortes contribuintes

A remuneração de um professor de ensino médio, na rede pública do Rio de Janeiro, é cerca de seiscentos reais — o piso nacional proposto no Fundeb é oitocentos reais até 2012. “Nas áreas de Matemática, Física, Química e Biologia, principalmente, a situação é pior, porque nelas se atingiu um nível muito alto de sofisticação, o que exige de seus profissionais, além de elevado grau de raciocínio abstrato, níveis muito altos de dedicação e um esforço para sucesso durante a formação e depois no ramo escolhido. Qualquer incentivo governamental para reverter esta situação é bem-vindo” — comenta a decana.

Espera-se que medidas sejam tomadas para estimular os profissionais do magistério. O aumento de 5% para 7% do PIB destinado à educação e a criação do Fundo de Desenvolvimento do Ensino Básico (Fundeb) são algumas propostas do governo Lula. Outro incentivo vem do Ministério da Educação (MEC), que pretende oferecer bolsas de iniciação, que podem variar de 300 a 350 reais, para os estudantes de universidades federais que optarem pela licenciatura. Essa idéia de criação de uma nova modalidade de bolsa, voltada para a educação básica, surgiu das sugestões e críticas feitas pela população ao Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE).

Segundo Daniel Machado, ex-aluno do Instituto de Matemática e atual auditor de Sistemas e Negócios da Companhia Vale do Rio Doce, esses fatores contribuem na escolha de uma especialidade por parte dos estudantes, mas não são os principais. Ele acredita que além das questões levantadas, os estudantes temem a sala de aula pela má impressão e pelo histórico que possuem em suas formações básicas. “Em geral, os profissionais que formam a base do conhecimento dos alunos no ensino fundamental e médio, infelizmente, não são capacitados para tal. Imagino que a maioria dos responsáveis pelo primeiro contato dos alunos com a Matemática e a Ciência, não aborda tais tópicos de forma a criar um elo amigável dos alunos com essas matérias. Com isso, acabam criando barreiras que implicam até mesmo na escolha de uma carreira profissional”.