Resenha

Os cronistas de Momo: imprensa e carnaval na Primeira República

 

Por Francisco Conte

capa do livro

Ao longo da Primeira República o Estado reprimiu as manifestações festivas de origem popular e negra e tentou impor padrões civilizatórios europeus. Apesar disso, aos poucos, elas acabaram incorporadas à cultura nacional. O livro de Eduardo Granja Coutinho, professor da Escola de Comunicação da UFRJ, onde leciona e desenvolve pesquisas nas áreas da Cultura Brasileira e da Teoria da Comunicação, discute um dos atores desse jogo complexo entre a cultura burguesa e a popular, os “cronistas de Momo”, que desenvolveram um gênero jornalístico, a crônica carnavalesca, que teve enorme impacto, não apenas sobre a festa, mas também sobre a imprensa brasileira. Coutinho foge aos simplismos presentes em outros trabalhos sobre o assunto.

Os cronistas não assumem em sua a obra, nem o papel de promotores engajados do Carnaval da plebe, o que seria despropositado, nem, ao contrário, o de instrumentos de domesticação e de “embranquecimento” das práticas festivas “selvagens” das massas populares, o que os poriam em consonância com os projetos ideológicos das elites nacionais, essas sim interessadas em silenciar as vozes que vinham da rua. Ainda que controlada por grupos dominantes e, não raro, organizadora e promotora de bailes, concursos e outras atividades carnavalescas, a imprensa surge na obra como aparelho privado da hegemonia e os cronistas como mediadores, no sentido gramsciano do termo, entre culturas.

Articuladores de um consenso, eles acabaram contribuindo para, até certo ponto, permitir aquilo que as elites da República Velha pretenderam negar aos proletários, ou seja, a possibilidade de deixar marcas na nacionalidade brasileira em vias de definição. De tabela, acabaram construindo um dos mais instigantes e divertidos capítulos do Carnaval carioca. Ainda que, na origem, preferissem o Carnaval ordeiro europeu, aos moldes dos de Veneza e Nice, acabaram, ao longo do tempo, incorporando elementos inspirados pelo povo. Ambíguos, oscilando entre a plebe e as elites, entre os bairros do povo e os das camadas abastadas, esses cronistas e foliões se assemelham aos arlequins da commedia del’art, servidores de dois senhores. O livro tem orelha de Joel Rufino dos Santos, historiador e escritor, e prefácio de Orlando de Barros, professor da UERJ.