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Edição 153      04 de abril de 2007


Olho no Olho

A validade do modelo do Ciclo Básico na universidade

Priscilla Bastos

imagem olho no olho

Em certos cursos da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) existem os chamados Ciclos Básicos, que são períodos comuns para todos os alunos antes da escolha final da profissão. É o caso da Engenharia Química e da Comunicação Social, por exemplo, em que os estudantes saem com formações diferentes e variadas.

Essa estrutura dos ciclos comuns gera polêmica e discussão na universidade, principalmente quanto à qualidade e o resultado do modelo. Muitos afirmam que a idéia geral é boa, mas não tem o mesmo resultado tão satisfeito quando se mede no campo prático. O projeto Universidade Nova trabalha com essa questão, através dos Bacharelados Interdisciplinares (BI), que assim como os ciclos básicos, retardariam a escolha profissional dos estudantes.

Para compreender a discussão em torno do Ciclo Básico, o Olhar Virtual conversou com o professor da Escola Politécnica, José Miguel Bendrão Saldanha, e com o professor e vice-diretor da Escola de Comunicação, Fernando Fragozo.

 

José Miguel Bendrão Saldanha
professor da Escola Politécnica

"Gostaria, antes de tudo, de destacar que não é a existência em si do "ciclo básico" que está em questão. Concentrar a formação básica no início do curso e a formação profissional no final é uma forma racional de estruturar currículos, contra a qual não me oponho, em princípio. O compartilhamento de matérias básicas por cursos distintos (Matemática para engenheiros e físicos, por exemplo) ou a existência de institutos especializados responsáveis por essas matérias também não é problema. Ao contrário, julgo que são formas adequadas de prover alguma interdisciplinaridade. As dificuldades relativas à orientação acadêmica — evasão, obsolescência de conteúdos etc. — existem, mas não se devem à estrutura dos cursos e sim a outras causas.

Vejo, no entanto, problemas sérios quando a universidade fornece diploma de "nível superior" pela conclusão do Bacharelado Interdisciplinar (versão "Universidade Nova" do ciclo básico, de três anos de duração) e/ou por falta de vagas, a continuação dos estudos não está garantida para todos os alunos que concluem o ciclo básico.

A concessão de diplomas de "curso superior", com base em três anos de estudos gerais (projeto "Universidade Nova", ainda não implantado, ou projeto pedagógico da Universidade Federal do ABC, já em funcionamento), falseará a "produtividade" das universidades, servindo para apregoar falsas vitórias na expansão do ensino superior público, ao mesmo tempo em que frustrará as expectativas dos jovens "formados", que não encontrarão no mercado de trabalho demanda correspondente à formação que ofertarão.

Teoricamente, estes jovens poderiam prosseguir os seus estudos e ampliar a sua formação, se assim o "desejassem". O problema é que, neste caso, instala-se um novo processo de seleção para as vagas do ciclo profissional (ou dos cursos profissionais, licenciaturas e mestrados, no caso da Universidade Nova), insuficientes para todos os que querem cursá-las, às quais os alunos concorrem com base no seu "desempenho" (CRA) no ciclo básico (ou BI). A escassez de vagas, problema coletivo cuja solução caberia ao Estado encaminhar, assume, assim, para cada aluno-candidato, a forma de "CRA baixo". A responsabilidade do Estado fragmenta-se numa miríade de responsabilidades individuais, tal como ocorre no vestibular, nas disputas por vagas em disciplinas, por bolsas de todos os tipos etc.

Neste assunto, a questão fundamental é, portanto, ter claro o que entendemos por direito de todos à educação superior pública. Modificar os mecanismos de seleção (por que é disso que tratam, enfim, as "novas" propostas) não serve para nada se não forem ampliados os recursos cotidianos das universidades públicas, principalmente os humanos, para que se possa aumentar a quantidade de vagas em todos os cursos, em direção à universalização. "

Fernando Fragozo
professor e vice-diretor da ECO

“Hoje, a questão do Ciclo Básico está muito vinculada à idéia dos Bacharelados reduzidos em três anos, com as formações mais gerais, o que eu diria que, de certo modo, é uma outra discussão. Na questão do ciclo básico com o Bacharelado tradicional, sou extremamente favorável, porque o aluno de 16 a 19 anos, idade em que se chega geralmente ao ensino superior — quando se chega — vai descobrindo, na própria universidade, o caminho que pretende seguir profissionalmente. O ciclo básico é um modo de aumentar as informações disponíveis e o contato que o recém-chegado tem com a faculdade, com os professores e até de certo modo com pessoas que já lidam com o que ele quer trabalhar, o que direciona melhor seus interesses.

Na questão da Universidade Nova, acontece a ampliação da discussão do ciclo básico em grandes setores, como humanidades, tecnológicos, não sendo apenas nos cursos, mas nos Centros. Essa discussão hoje ficou atrelada à questão dos cursos mais reduzidos de três anos. Em princípio, eu também sou favorável ao ciclo básico mais geral, acho bastante interessante essa discussão em grandes setores.

Acredito que, na ECO, o modelo de ciclo básico funcione muito bem. Antes, o que se tinha era a entrada por habilitação, e, hoje, a gente vê, por exemplo, alunos que entraram aqui para fazer Publicidade ou Jornalismo e foram parar em Rádio e TV ou Produção Editorial ou vice-versa. Há a descoberta de um universo novo para esses estudantes. O ciclo básico deve oferecer uma discussão geral, de apresentação de formulações teóricas e práticas — as duas têm que andar juntas —, mas também tem que haver, por parte da escola, uma orientação e um permanente cuidado em mostrar que há caminhos diferentes para o aluno seguir, orientando-o sobre o que vai aprender ou trabalhar em cada habilitação.

Antigamente, quando não havia o ciclo básico, existia o problema de o aluno chegar ao quarto período de jornalismo, por exemplo, e perceber que não era bem aquilo que queria. Então, ele descobria que entrou para um curso e que, para mudar, teria que abandoná-lo ou concluí-lo, para depois ingressar em outro. Com o modelo atual, o aluno tem três períodos para entrar em contato e se acostumar com um universo que ele não conhece, além de não estar “obrigado” a ficar em uma certa habilitação, havendo a possibilidade de troca.

Na medida do possível, a Eco tem feito atividades para clarear a escolha do aluno pela habilitação. O Ecomeço, a semana de abertura das aulas da escola, tem essa idéia de acolher e informar os calouros a respeito das quatro habilitações. Tem-se a idéia de, ao longo dos primeiros períodos, chamar os coordenadores dos cursos para darem palestras explicando um pouco de cada habilitação. Isso já foi proposto pela coordenadora do Ciclo Básico, professora Fátima Fernandes, e acho q deve ser incentivado. "

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