De Olho na Mídia

Sai o homem, entra o mito

 

Júlia de Marins

 

A morte do ex-presidente Itamar Franco (1930-2011), no dia 2 de julho, causou repercussão na imprensa. O político, que chegou à presidência em 1992 para substituir o então dirigente do Brasil, Fernando Collor de Mello - afastado em processo de impeachment - e permaneceu até 1994, quando Fernando Henrique Cardoso ganhou as eleições, foi lembrado por grandes veículos da mídia como o personagem que intercalou períodos de governo conturbados, mas que deu algumas contribuições para o país.

Em crítica às abordagens feitas pelos jornais sobre o ocorrido, o site Observatório da Imprensa, uma iniciativa do Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo e projeto original do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), publicou a matéria “O lado menor de Itamar”, no dia 5 de julho. Em sua reportagem, o jornalista Mauro Malin aponta a imprensa como incoerente em sua rememoração sobre o governo do ex-presidente. Segundo Malin, os mesmos jornais e revistas – especialmente a Folha de S. Paulo e a revista Veja – que criticaram Itamar enquanto presidente, o representaram de maneira contrária à anterior, parecendo ignorar tudo o que já havia sido exposto antes.

Para Isabel de Assis Ribeiro de Oliveira, especialista em Teoria Política e Análise de Políticas Públicas e professora titular aposentada do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (IFCS/UFRJ), “a maneira como a mídia tem tratado a morte de Itamar Franco é um tipo de ponto de vista, que, particularmente, não compartilho”. Segundo ela, os meios de comunicação deveriam prezar mais a pesquisa, pois “a maioria das matérias publicadas por grandes jornais têm sido superficial. Não há muitas explicações sobre todo o contexto crítico que envolveu o período em que Itamar Franco esteve na presidência, assim como as medidas implantadas por ele que contribuíram para melhorias no Brasil”.

Para Isabel, o caso exposto por Mauro Malin em seu texto – o sensacionalismo feito pela mídia no ano de 1994, quando o presidente foi fotografado ao lado de uma mulher sem calcinha no Carnaval - exemplifica “um erro do jornalismo político, porque, no caso mesmo de Itamar, as medidas adotadas por ele enquanto dirigente do país, como sua política inaugural de combate à fome, foram diminuídas perto de um fato que não deveria ser tratado como foco principal”, afirmou a professora.

A abordagem da mídia sobre as atitudes dos políticos, segundo a cientista política, deve ser mais bem fundamentada, já que “somente através da pesquisa um jornalista é capaz de relatar os erros e os acertos de um político de maneira coerente. O caso de Itamar pareceu algo a parte, pois como ele esteve na presidência por um período curto e crítico, regido por sua personalidade muito singular, tornou-se mais suscetível às críticas”. Isabel também reafirmou sua posição de crítica relativa à grande atenção dada pela imprensa à vida privada dos governantes ao invés de priorizar suas atuações políticas, ao afirmar que “a mídia deve saber exatamente sobre o que fala, pois ela é uma instituição capaz de 'refrescar’ e também construir a memória da população”.