Entrelinhas

A Revolta do Batalhão Naval

 

Daniela Magioli

Divulgação

 O historiador Henrique Samet, professor adjunto do Setor de Letras Orientais e Eslavasda UFRJ lançou este ano o livro A Revolta do Batalhão Naval. Na obra, o autor trata os desdobramentos da Revolta que foi esquecida pela historiografia atual. Ocorrido na mesma época em que se deu a conhecida Revolta da Chibata, o episódio é relevante para a compreensão do momento político enfrentado.

Publicado pela editora Garamond, o trabalho contou também com o apoio da Faperj(Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro), por meio do Programa de Auxílio à editoração (APQ3). Para entender melhor a temática da Revolta do Batalhão Naval, o Olhar Virtual convidou o autor, Henrique Samet, para uma entrevista sobre sua obra.

Olhar Virtual: Como surgiu o interesse pela Revolta do Batalhão?

Henrique Samet: Durante a pesquisa para o Doutorado sobre polícia política na República Velha, me deparei com um inquérito sobre a Revolta do Batalhão Na valem 1910, nunca antes mencionado e conhecido. O inquérito não se transformou emprocesso e foi arquivado. A grande alegação para o desconhecimento geral sobre O episodio é a falta de documentação a respeito, extraviada, danificada ou excluída. Não existe nenhuma pesquisa específica sobre a revolta. Esse é um dos buracos negros envolvendo os desdobramentos da Revolta da Chibata.

Olhar Virtual: Por ser um tema pouco documentado, reunir material se torna um poucomais complicado? Como foi realizada a pesquisa que deu origem ao livro?

Henrique Samet: Começou pelo encontro do inquérito e outros tantos dados secundários na documentação policial. Na Casa de Rui Barbosa, se encontrao relatório do comandante do navio Satélite, usado para a deportação de militares e civis para o Acre em seus porões, com detalhes da viagem e dos fuzilamentos efetuados a bordo. Prosseguiu no Centro de Documentação da Marinha em microfilmes sobre assentamentos de soldados, suboficiais e oficiais do Batalhão Naval à época e através do Gabinete de Identificação da Marinha. Levou quase quatro meses. Na Biblioteca Nacional, examinamos os periódicos do antigo Distrito Federal que se referem ao assunto. No Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro, fomos em busca dos Livros de Matrícula da Casa de Detenção que nos possibilitou examinar a ficha pregressa dos civis, homens e mulheres, deportados para o Acre.

Olhar Virtual: A Revolta do Batalhão vinha sendo negligenciada pelos livros de história. O senhor acredita que um livro sobre o assunto estava faltando para a área? É importante dar maior visibilidade ao assunto?

Henrique Samet: Sem estar legislando em causa própria, acredito ter sido pioneiro no assunto. Todos os relatos anteriores reproduzem versões de época a começar por aquela de Rui Barbosa. Edgar Morel, quando escreveu A Revolta da Chibata, encampou o enfoque que transformava os soldados do Batalhão Naval em vilões cooptados pela oficialidade e pelo governo, de forma até mesmo preconceituosa. Desde então ninguém acrescentou nada novo sobre o assunto.

Até hoje o tema é polêmico, principalmente quando se aproximam comemorações de eventos relacionados com a Revolta da Chibata ou com a figura de João Cândido.A Marinha se preocupa em divulgar sua versão sobre o assunto, que foi resultado de pesquisa do Almirante Hélio Leôncio Martins.

A relevância do passado não se esgota nele mesmo. Seu estudo é um dos meios através dos quais vão se moldando visões de mundo presentes. Em torno da Revolta da Chibata e do Batalhão Naval se condensam os mesmos temas e dilemas que despertam controvérsias na nossa sociedade e entre eles a mais pertinente é a questão da cidadania.

Olhar Virtual: O que motivou o conflito na época? Resumidamente, como ele se desenvolveu?

Henrique Samet: Basicamente, como referido acima, foi uma revolta por direitos. No caso, não direitos futuros, mas aqueles que já se encontravam inscritos na própria Constituição de 1891. O castigo físico foi reinstalado na Marinha a despeito da lei maior. A Revolta da Chibata surpreendeu a oficialidade e o governo que ficaram a mercê de marinheiros, com seus canhões apontados para a cidade. A anistia foi concedida frente à impossibilidade de êxito em uma reação militar, mas o desejo de vingar a revolta permaneceu vivo na oficialidade e o empecilho era justamente a anistia, que é o esquecimento perpétuo de acontecimentos passados.

Depois da anistia, órgãos superiores da Marinha decretaram a dispensa de todos os envolvidos e começaram a prender aqueles que desembarcavam. Este é o estopim da Revolta do Batalhão Naval. Aqueles pró-oficiais da Marinha alegam que retaliações mais amplas como abordagem e ataque contra os marinheiros rebeldes eram simples boatos. Não eram. Já estavam em marcha, insinuados até nos jornais. Os fuzileiros navais se rebelaram por também se sentirem ameaçados pelas retaliações e em solidariedade aos marinheiros, então já desarmados e sem poder de fogo real. O livro traz revelações que contestam a versão.

Olhar Virtual: Quais as implicações que a Revolta teve no cenário político da época?

Henrique Samet: Foi o pretexto para a instalação do estado de sítio e para a prisão dos envolvidos no episódio da Chibata e da Revolta do Batalhão Naval, bem como repressão e deportação de população civil sem nenhuma ligação com os eventos, ocorridos estritamente em âmbito militar. Daí em diante funcionou a vingança e não a justiça e os inquéritos instalados não visavam, de fato, o que julgavam, mas aqueles anteriores à anistia. O julgamento de João Cândido na verdade foi uma encenação.

Estes acontecimentos consolidaram as práticas judicantes de órgãos que não têm o direito de julgar como o caso da polícia e de qualquer instância na sociedade e governo que não seja o Judiciário. Neste caso o ontem e o hoje se confundem.

Olhar Virtual: Por que motivos o senhor acredita que esse tema tenha sido desconsiderado pela historiografia atual?

Henrique Samet: A alegada falta de documentação teve um papel expressivo, mas a acomodação acrítica diante de uma versão amplamente difundida também tem seu quinhão. Poderia também acrescentar a radicalização dos enfoques, uns mitificando os eventos e os comportamentos e outros os detratando por completo.

TÍTULO: A Revolta do Batalhão Naval

EDITORA: Garamond

AUTOR: Henrique Samet

ISBN: 9788576172079

ENCADERNAÇÃO: Brochura | 336 págs.

ANO EDIÇÃO: 2011

EDIÇÃO: 1ª

TÍTULO: A Revolta do Batalhão Naval

EDITORA: Garamond

AUTOR: Henrique Samet

ISBN: 9788576172079

ENCADERNAÇÃO: Brochura | 336 págs.

ANO EDIÇÃO: 2011

EDIÇÃO: 1ª