Ponto de Vista

O futuro da usina Belo Monte

Thor Weglinski

Ilustração: Caio Monteiro
Professor Emilio La Rovere considera a contrução de Belo Monte vital para o suprimento de energia elétrica no Brasil.

O Consórcio Norte Energia venceu, no último dia 20, o leilão para  obter a licença de construção da hidrelétrica Belo Monte, projetada no Rio Xingu no estado do Pará. Será a maior usina inteiramente brasileira e compartilhará uma potência de 11,233 GW. A energia assegurada pela hidrelétrica terá a capacidade de abastecer uma região de 26 milhões de habitantes, com perfil de consumo elevado como a região metropolitana de São Paulo. O processo para a concretização da obra já dura mais de vinte anos, sendo que os estudos para o planejamento começaram há mais tempo, em 1975.

A usina será a maior obra do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do governo federal, mas é criticada e reprimida por movimentos sociais e lideranças indígenas. Para eles, o projeto não considera os impactos socioambientais resultantes. Para falar sobre o tema, o Olhar Virtual conversou com o professor Emilio La Rovere, do Programa de Planejamento Energético (PPE) do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa em Engenharia (Coppe-UFRJ).

Olhar Virtual: Quais os prós e contras na construção da usina Belo Monte?

Emilio La Rovere:  Como todo o projeto energético de grande porte, existem impactos positivos e negativos. Os positivos são a contribuição para o suprimento de energia renovável, isenta de emissões poluentes e gasosas. Com isso, o Brasil dá um passo importante para a segurança energética e atendimento de uma demanda crescente de energia elétrica. Além disso, a usina permite uma produção renovável a baixo custo, menor do que outras alternativas. Os principais aspectos negativos são os impactos ecológicos e sociológicos sobre as populações indígenas e ribeirinhas próximas ao local.

Olhar Virtual: Há alternativas à construção da represa? Energia nuclear, termelétrica ou outra?

Emilio La Rovere: Tecnicamente sim, como centrais nucleares, termelétricas, a carvão, a óleo, fontes eólicas ou a bagaço de cana. Naturalmente há restrições quanto à produção das alternativas, pois não é fácil gerar a quantidade de energia de Belo Monte, com mais de 11.000MW. É uma quantidade de energia muito grande que outras teriam muita dificuldade para gerir. As alternativas renováveis, como solar ou éolica, são indicadas para atender pequenas demandas espalhadas pelo território, mas não para grandes blocos de energia como as das metrópoles. A nuclear pode ser usada em maior escala como também a termoelétrica a carvão ou a gás. O problema é que todas as alternativas também trazem impactos negativos: as nucleares têm custo alto, as termoelétricas são incovenientes do ponto de vista ambiental, pois emitem gases de efeito estufa. O uso de hidroeletricidade ainda tem vantagens importantes em relação a outras fontes, observando pós e contras.

Olhar Virtual: O senhor concorda com os movimentos contrários a construção da usina, preocupados com o afetamento da fauna e flora local pela alteração do regime de escoamento do rio?

Emilio La Rovere:  Impactos negativos acontecerão, mas não é por isso que a usina não deve ser construída. Outras alternativas causariam agressões piores, integrando os aspectos econômicos, sociais e ambientais.  

Olhar Virtual:  A rejeição do empreendimento por ambientalistas e da população  local  pode ser um entrave no bom curso da implantação da hidrelétrica?

Emilio La Rovere: Sempre existe essa possibilidade. No Brasil há uma legislação que protege o direito das minorias e o Ministério Público fiscaliza a atuação dos outros três poderes. Podem ser interpostas ações caso haja o entendimento de uma conduta não adequada. Ainda há possibilidade de novas ações, que podem atrasar o início da construção, mas vai depender da habilidade do consórcio responsável pela obra de atender as condicionantes da licença, além de negociar e ouvir populações indígenas e locais. A licença de Belo Monte foi muito mais rigorosa em relação a impactos ambientais e sociais do que as exigências de outras centrais energéticas.

Olhar Virtual: A tecnologia brasileira adotada em construção evoluiu?

Emilio La Rovere: A tecnologia em construção de hidrelétricas evoluiu. Já há sinais disso nas duas usinas no Rio Madeira,  Girau e Santo Antônio, que continuam gerando impactos ambientais, mas que são muito menores em relação à primeira geração de hidrelétricas. As novas usinas foram construídas com turbinas que aproveitam mais a corrente da água e a velocidade do fluxo do rio. As primeiras tinham lagos muito extensos, causadores de grandes impactos ambientais, atingindo comunidades, fauna e flora com alagamentos. Girau e Santo Antônio têm uma nova tecnologia que permitiu amenizar os impactos, já que seus lagos têm uma área bem menor.  Não quer dizer que não temos agressões ao ambiente, mas, comparativamente, as usinas atuais são mais benéficas do ponto de vista ambiental.

Olhar Virtual: Os interesses indígenas e de populações locais conseguirão ser respeitados ou a conciliação é improvável?

Emilio La Rovere: Quando um empreedimento de grande porte é construído, há um um conflito irredutível entre uma população que vai receber energia e os moradores locais que vão sofrer os impactos. Os direitos das minorias devem ser respeitados, mas dentro dele deve-se buscar diminuir os danos, pois não é em nome da minoria que vai se impedir um bem maior para a população. O Ibama emitiu a licença depois de extensa análise e, respeitando as condições da autorização, os direitos indígenas serão respeitados.

Olhar Virtual:  A usina é vital para o desenvolvimento do país?

Emilio La Rovere:  Belo Monte tem uma importância para o suprimento de energia elétrica no Brasil, e, por isso, a construção é vital. A usina irá aproveitar o potencial remanescente hidrelétrico no país. Houve um período de escassez de geração de eletricidade no país, entre 2000 e 2001, resultante da insuficiência de investimentos. O que aconteceu foi uma falta de planejamento para construção de hidrelétricas pela expansão da demanda. Hoje, o mercado de energia elétrica cresce e, por isso, Belo Monte e outras usinas são vitais para o desenvolvimento.
 
Olhar Virtual:  A obra pode influenciar nos rumos da eleição presidencial?

Emilio La Rovere:  Se o leilão para escolha do consórcio fosse suspenso, naquela troca de liminares, o governo seria prejudicado e denotaria fraqueza do planejamento federal. Agora, a influência da obra é pouca, o debate eleitoral vai caminhar para outro sentido.