De Olho na Mídia

O fenômeno Barack Obama

Monike Mar – AgN/Praia Vermelha

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Obama nas camisetas, nos broches, nos cartazes, nas pixações dos muros, nas capas de revistas, nas manchetes de jornais e nos plantões de cobertura das eleições norte-americanas. O Barack Obama que todos falavam era o negro que poderia se tornar o primeiro a presidir a maior potência do mundo. O mesmo negro que se opôs às práticas do atual governo de George Bush, com índice de 76% de desaprovação, maior dos últimos 60 anos, segundo a pesquisa da rede CNN – Opinion Research Corporation.

O mundo voltou sua atenção aos Estados Unidos depois que o candidato do Partido Democrata se destacou à frente de Hillary Clinton. Obama passou também a representar a esperança de mudanças na sociedade norte-americana: suas fotos figuravam junto com as de Martin Luther King, comparação que ia além do aspecto físico, pois apareciam junto com a frase do líder pacifista: "I have a dream".

O sonho de parte da população estadunidense atingiu torcidas extraterritoriais. Manifestações de preferência pelo democrata foram observadas em vários países. Franklin Trein, professor do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (IFCS) da UFRJ, explica o interesse mundial pelas eleições dos EUA como efeito da hegemonia do país em diversos aspectos:

— O que os EUA esteja vivenciando, experimentando como sentimento social, cultural, transborda muito rapidamente, muito facilmente para o resto do mundo. O estado de espírito da história dos EUA contamina muito o estado de espírito da sociedade ocidental e, mais do que no passado, contamina ainda o estado de espírito da comunidade internacional. Isso acontece em função do papel hegemônico que os EUA têm de sustentação econômica, de detentor de poder militar e, por fim, de disseminador de cultura e visão de mundo através da sua extraordinária máquina midiática –– diz Trein, que atua nas áreas de Filosofia Política e Relações Internacionais.

Como ocorre no Brasil, essa atenção dada à política norte-americana está ligada à conscientização, conforme Trein acrescenta: "Essa atenção mundial à política dos EUA não está ligada à consciência política, porque está ligada à hegemonia da cultura norte-americana, ao way of life norte-americano sobre a sociedade mundial".

"A mídia internacional está interessada não no feijão-com-arroz, mas no exótico"

O passado de Obama foi esmiuçado mais do que o de qualquer outro candidato, assim como o fato de ele ser negro foi explorado pelos meios de comunicação. Embora este aspecto tenha estado em voga durante sua campanha, Trein discorda de que ele tenha sido o principal elemento propulsor de sua vitória:

— Por tudo que conheço e sei da sociedade norte-americana, eu diria que não elegeram Obama por ele ser negro. A sociedade norte-americana não se deixa levar, ela é muito mais consciente para entender onde estão representados seus interesses para se deixar levar por algum exotismo. A exploração da cor de Obama é mais forte fora dos EUA, mais no Brasil do que lá dentro.

A maioria dos votos de Obama não proveio de negros. Latinos e asiáticos contabilizam maior índice de aprovação do que negros, em lugares onde são majoritários. De acordo com o especialista, Obama era uma figura exótica aos olhos do povo. Sua biografia, que rendeu o livro Audácia da esperança –– que, por vezes, pôde ser encontrado ao lado da biografia de Hillary Clinton nas livrarias ––, rendeu destaque para sua trajetória de vida. Nascido no Havaí em 1961, de pai queniano, Obama foi criado pelo padrasto muçulmano na Indonésia. Chegou à América adolescente, estudou em Nova York, formou-se em Direito na Universidade de Harvard. Tornou-se senador do estado de Illinois, experimentando a política norte-americana.

– Este mestiço que não é branco, mas que também não é preto, ganhou espaço dentro do partido. Cresceu com as controvérsias de Hillary. Uma mídia que teve interesse na figura desse mestiço pelo seu lado como negro, começou a fazer volume. Ora, uma mídia internacional está interessada não no feijão-com-arroz, mas exatamente no exótico –– declara o professor, que ainda brinca:

– E esse jovem, certamente, é uma pessoa de inteligência privilegiada, não tem passado político a ser criticado, exceto pelo fato de que, quando ele estava no jardim de infância, emprestava seus brinquedos e, por isso, pode ser acusado de comunista.

As comparações entre Barack Obama, recém eleito, e John Kennedy, presidente dos EUA em 1961, vão desde o modo de se vestir, passando pelas esposas Michele Obama e Jacqueline Kennedy, até as estratégias políticas. Kennedy foi um presidente midiático em sua época, e Obama parece seguir o mesmo caminho. Perguntado sobre a popularidade de ambos, o professor Trein discorda com ressalva da notoriedade de Obama na mídia:

— Kennedy esteve mais na mídia que Obama. Você não vai encontrar daqui a vinte anos tantas referências no Brasil ao nome de Obama quanto você encontra hoje para Kennedy. Hoje há cidades, pessoas, instituições, estradas, pontes e colégios com o nome de Kennedy. A menos que ele venha a ser assassinado, o que não elimino nos meus muitos cenários do futuro. Acredito que ele precise de maior proteção. Não excluo a hipótese de que outras tentativas venham a ser feitas contra Obama. Quantos presidentes norte-americanos não morreram assassinados? Mais do que em qualquer outro país.

Expectativas

Na última semana, desde o telefonema entre Luiz Inácio Lula da Silva e Barack Hussein Obama ficou decidido que este último fará uma visita ao Brasil. A relação entre Estados Unidos e Brasil pode mudar à medida que são percebidos interesses na aproximação entre os dois países. Acordos políticos e econômicos podem surgir desta relação, mas, segundo o professor Franklin, as expectativas maiores são do futuro presidente com as possibilidades que essa aproximação pode render. Disposto a fazer uma política externa diferente da que foi feita por Bush, Obama pretende basear-se no diálogo, a exemplo da diplomacia brasileira, para estreitar relações com o restante da América, começando pelo maior e mais promissor país do continente.

De acordo com Trein, o Brasil pode ser um parceiro muito interessante para uma nova política externa que os EUA poderia assumir. Além disso, o Brasil é símbolo de igualdade racial no imaginário internacional:

— A permeabilidade da sociedade brasileira, a forma como ela simula e convive com as diferenças, sem que com isso solucione todos os conflitos, é muito diferente do que acontece em qualquer lugar do mundo. Obama sabe disso, através de suas assessorias. Portanto, fazer uma visita ao Brasil é contemplar e apontar para o mundo “olha, o Brasil é o país que eu enxergo e para o qual eu me dirijo, pois tem características sociais e políticas que me chamam atenção e que possui potencial de parceria que me interessa dentro da região e fora dela, certamente pelo mundo”. Eu diria de imediato, para a África, para a Ásia e, quem sabe, para qualquer outro lugar.