De Olho na Mídia

O fim do defensor dos leitores?

Aline Pollilo - AGN/Praia Vermelha

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No último dia 6 de abril, a Folha de São Paulo demitiu seu ombudsman, Mário Magalhães, alegando que as críticas internas, publicadas na internet, estavam prejudicando o jornal. A direção da Folha tentou negociar, propondo que Mário deixasse de divulgar na rede seus comentários sobre as edições do jornal, entretanto ele não concordou.

O ombudsman é uma espécie de consciência presente a todo momento no processo de produção das notícias. Ele desempenha um papel crítico, avaliando as matérias publicadas. Orientado por suas observações e pelos comentários dos leitores, esse profissional aponta, incialmente para a equipe de jornalistas, as falhas ou omissões presentes na cobertura jornalística da empresa. Posteriormente, elas podem ser levadas ao conhecimento do público. Geralmente, os veículos escolhem para exercer esta função jornalistas que tenham maturidade de produção e conheçam todo o processo editorial.

Para alguns jornalistas, a demissão do ombudsman está relacionada à atual posição que o jornal apresenta, favorecendo o político José Serra em suas reportagens. Como a Folha é um dos poucos jornais que ainda tentam aplicar a idéia de pluralidade editorial, o fato é visto como uma mudança de ideário. Para discutir sobre a função do ombudsman e toda a liberdade concedida a ele pelos jornais, o Olhar Virtual convidou a professora Cristina Monteiro, da Escola de Comunicação (ECO).

Sobre a necessidade de liberdade do ombudsman, Cristina explica que ela seria uma condição sine qua non do cargo. “Um ombudsman sem liberdade não é ombudsman”. Entretanto, a professora lembra que existe um limite, já que os veículos têm interesses políticos e econômicos, defendidos de forma implícita.

É evidente, os donos dos grandes conglomerados permitem a livre produção até seu próprio limite do aceitável. Os jornais definem uma linha editorial, a ser respeitada dentro da redação; o que não estiver de acordo, não será de interesse dos dirigentes. Dentro desta lógica, é dificil para um jornalista admitir que seu trabalho é cerceado. Cristina observa que ninguém diz objetivamente o que pode ou não publicar. Nesse contexto, o ombudsman recebe “carta branca” para fazer a crítica. Se ele começar a incomodar determinadas parcerias, pode, entretanto, ocorrer uma pressão externa, que, também, pode resultar na saída desse profissional.

Segundo a entrevistada, os grandes veículos ainda utilizam o ombudsman como uma garantia de qualidade e autonomia do pensamento. Ele seria um compromisso com a reflexão e o constante aprimoramento da produção do jornal. A professora não acredita que este profissional esteja em extinção. Para ela, o que ocorre é uma pressão por uma interatividade cada vez maior e uma adaptação à transformação tecnológica que a mídia vem sofrendo. O lugar do ombudsman vai ser distribuído por pequenos focos de interatividade.

No jornalismo digital, essa questão do ombudsman é ainda mais complicada. Isso porque os sites são alimentados 24 horas por dia. A todo momento estão sendo publicadas novas matérias, que nem sempre conseguem ser verificadas. Quando há alguma correção necessária, é colocado um novo título. Dessa maneira, são disponibilizadas na rede milhares de informações sobre o mesmo assunto, que vão se modificando na medida em que fica claro o que ocorreu. Para o ombudsman controlar todo esse processo seria muito difícil. “Como manter uma pessoa realizando uma crítica, quando são colocadas no ar ininterruptamente notícias sem qualquer critério de revisão, sendo que o importante é a rapidez com que ela chega ao jornal online?”, questiona a professora.

É complexo para a mídia digital observar modelos e padrões de comportamento do jornalismo impresso. Então, assim como a televisão começou utilizando a linguagem de rádio e de cinema, na internet também há uma mistura de linguagens. Quando uma matéria é publicada na internet, o leitor pode escolher o caminho que quer seguir dentro da matéria. “Isso não parece com nada que nós conhecemos até agora, em termos de trabalho jornalístico editorial. Serão necessárias novas funções, assim como novas características” explica a professora.

Em sua opinião, quando o veículo apresenta um ciclo de produção definido e existe a possibilidade de controle e de revisão, como no caso do jornalismo impresso, o ombudsman é uma figura importante. Ele seria uma espécie de consciência viva da qualidade de produção do jornalismo.