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O PAC e o Setor Elétrico Brasileiro (SEB)

Fabíola Ortiz / Agn Praia Vermelha

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O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) lançado no final de janeiro pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva privilegia o setor de energia, em especial o elétrico e de infraestrutura energética. Os investimentos em energia são da ordem de R$ 274 bi (o equivalente a 54,5% do PAC) e ao setor elétrico será destinado R$ 65,9 bilhões para serem aplicados em geração de energia e R$ 12,5 bilhões em transmissão e distribuição.

Segundo o coordenador do Grupo de Estudos do Setor Elétrico do Instituto de Economia (GESEL-IE/UFRJ), Nivalde Castro, o PAC tem um papel muito importante sobre o setor elétrico brasileiro (SEB) “porque agregou todos os projetos de construção de novas usinas geradoras e novas linhas de transmissão sob um mesmo comando gerencial; além de fortalecer o planejamento da oferta, garantindo assim o equilíbrio com a demanda de energia elétrica no médio e longo prazo”.

Rubens Rosental, pesquisador do GESEL, também concorda com Nivalde, uma vez que “o PAC tem como finalidade retomar o papel do Estado na economia e centralizar projetos que já estão em andamento”. O pesquisador acredita que o Estado tem uma orientação mais focalizada como gestor e coordenador de projetos. “O lado inovador do PAC é a gestão de financiamentos. Ele está abrindo possibilidades para construir um novo padrão de financiamento no Brasil e a oportunidade de centralizar os projetos, criar uma agenda de investimentos, estabelecer prioridades, aumentar o crescimento e sair da inércia” afirma Rubens.

O papel do Estado passa a ser central no novo programa econômico do governo Lula, e tem como base uma reorientação da política fiscal visando o crescimento da economia. O PAC tem como principal objetivo o aumento do PIB nos próximos quatro anos, sua proposta é investir R$ 504 bi até 2010.

Nivalde acredita que a divulgação do Programa representa uma mudança significativa no ambiente econômico do país, tendo como objetivo promover o desenvolvimento e investir em áreas estratégicas. “O governo mudou a sua política econômica com a variável crescimento sem deixar de manter a preocupação com a estabilidade da moeda”. E acrescenta que o Estado volta a reassumir o papel de estimulador do crescimento; no caso do setor elétrico, vai fortalecer a parceria com o setor privado.

Assim como Nivalde, Rubens Rosental considera que o Estado retoma o papel de estabelecer parcerias estratégicas entre o público e privado. “É fundamental que os interesses do setor público estejam aliados ao privado”. Ele argumenta que hoje em dia, estimular parcerias entre ambos ainda é um grande desafio no Brasil. “O PAC tende a fortalecer ainda mais o modelo regulatório do Estado e a transparência nas regras”.

Há quem discorde sobre a atuação do Estado e de como o Programa tem encaminhado suas ações referente ao SEB. Para o professor Luiz Pinguelli, coordenador do Programa de Planejamento Energético (PPE) do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia (COPPE) da UFRJ, a leitura do PAC é muito abrangente. “Não há impacto nenhum do PAC sobre o setor elétrico, porque o Governo não definiu o que na minha opinião seria dar um papel claro à Eletrobrás”, e acrescenta que o PAC “não tem nenhuma importância para o SEB, uma vez que o fundamental é romper com as dificuldades das hidroelétricas no Brasil e suas restrições de atividades”.

Segundo Pinguelli, o PAC não define claramente o papel da Eletrobrás, “que é a maior empresa elétrica brasileira e está paralisada, além de ser sujeita a uma série de restrições que datam do tempo que ela ia ser privatizada e que o governo nunca removeu completamente – por exemplo, ela não pode ser sócia majoritária de nenhum parceiro privado; isso é um noncense completo”.

Pinguelli considera que o mais importante para o Brasil é resolver o problema da eletricidade “que é ainda a energia mais barata e está sendo abandonada precocemente”. E complementa que “a Eletrobrás, a maior empresa elétrica do país, deveria ser aquela que está puxando o investimento, ser o carro-chefe, como é o caso da Petrobrás com o combustível. As estatais devem ter um poder dinamizador”.

Entre as prioridades do Programa está a regulamentação do artigo 23 da Constituição, que define o papel que a União, os Estados e os Municípios devem ter na emissão de licenças ambientais a fim de facilitar e estimular os investimentos em novas hidrelétricas.

Para Rubens Rosental, a questão ambiental ainda é um problema, “principalmente pela confusão da estrutura institucional dos órgãos que tomam as decisões; se houver uma regulamentação dos papeis dos órgãos federais, facilitará a tomada de decisão e a concretização de projetos; isso já será um avanço”.

Quanto a Pinguelli, o Programa tem uma visão burocrática sobre a questão ambiental, “não é um problema de legislação mas sim de aceitação social, pois exige um trabalho do Governo de estabelecer um pacto com os setores interessados”. Para ele, “o Governo tem uma ilusão imensa sobre o papel do setor privado na área de energia elétrica”.

Esforços estão voltados para a construção de usinas já em andamento ou paralisadas com entraves e pendências ambientais, além de pôr em operação os projetos do PROINFA (Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica). Rubens acredita que há uma preocupação em criar uma matriz energética mais diversificada das fontes de energia. “É um setor que tende a crescer, mas ainda não tem uma participação tão grande” explica o pesquisador, pois o resultado ainda é pequeno frente à geração total de energia.

Para Nivalde, tais investimentos são ainda marginais, mas “é preciso criar uma oferta mais consistente para o futuro, pois não é possível atender o forte ritmo de crescimento da demanda de energia com fontes renováveis”.

Para a viabilizar os projetos e atrair o setor privado em novos investimentos do setor elétrico, mudanças nas regras dos empréstimos concedidos pelo BNDES beneficiam o setor promovendo melhores condições de financiamento e aumento do prazo de amortização dos empréstimos (para até vinte anos). Além disso, o financiamento poderá chegar a até 80% do valor total do empreendimento. Para Rubens “o BNDES é o interlocutor fundamental para os investimentos e para a retomada do crescimento”.

Pinguelli, ao contrário, afirma que “a aposta é que o setor privado sempre vai expandir a energia elétrica; prorrogar os prazos do BNDES e facilitar financiamentos é uma visão economicista atrasada. E a empresa pública que tem que ir a frente”. O que o Estado precisa é assumir o seu papel e “não ser doador para o setor privado” acredita Pinguelli, uma vez que para ele, o BNDES está tomando medidas para transferir recursos públicos para o setor privado.

Para o professor da COPPE, o PAC não apresenta uma diretriz clara e o modelo do setor elétrico é “inadequado”. “Há uma profunda convicção que por meio de estímulos do Governo, o setor privado fará o que é necessário; isso é um erro total”.

Entre alguns acadêmicos, o Programa cria um ambiente positivo de crescimento, “um entusiasmo, motiva a sociedade e gera uma visão de que o governo está se interessando pelo desenvolvimento”, declara Pinguelli.

Para ele os pontos positivos foram a suspensão das privatizações, a criação de um modelo de planejamento energético, o êxito na ampliação das linhas de transmissão, “mas os leilões e as relações com o setor privado foram muito equivocadas; os investimentos não estão vindo no ritmo necessário, se não fossem as chuvas extremamente generosas em 2006, nós já teríamos problemas de energia”. E finaliza com um contraponto: o Programa motivará os investimentos, mas para a área de energia, que é um gargalo no desenvolvimento, a situação não está boa. “O governo acredita que o setor privado vai desenvolver o setor elétrico, eu não acredito nisto. O Estado deveria tomar a frente e não ficar dormindo e dividindo a empresa de acordo com interesses político-partidários”.