De Olho na Mídia

TV Digital faz dois anos sem ter o que comemorar

Vanessa Sol e Aline Durães


A TV Digital completou dois anos de implantação no país no início de dezembro. Após a primeira transmissão do sinal digital, que ocorreu no dia 2 de dezembro de 2007, para a região metropolitana de São Paulo, apenas 26 cidades recebem o sinal hoje. Os números, aparentemente, superam as expectativas do cronograma apresentado pelo Ministério das Comunicações; no entanto, demonstram certo atraso na ampliação da cobertura do sinal para todo o país. Além disso, outros dois fatores contribuem para a morosidade da popularização da TV Digital no Brasil: o alto custo dos conversores (set-top box) e a reduzida geração de conteúdo digital pelas emissoras. 

O professor Eduardo Antônio Barros, do Programa de Engenharia Elétrica da Coppe/UFRJ, afirma que é natural que toda mudança tecnológica ocorra de maneira gradual. Entretanto, ele destaca que o governo criou expectativas irreais na população ao afirmar que atingiria metas que não seriam alcançadas em curto prazo. “Quando os Estados Unidos implantaram a TV Digital, eles estipularam um prazo de dez anos, que foi estendido. Aqui no Brasil ocorrerá o mesmo até que todo o território tenha cobertura do sinal digital”, ressalta.  

De acordo com os dados do fórum do Sistema Brasileiro de TV Digital (SBTVD), já foram vendidos pouco mais de dois milhões de conversores (set-top box) no Brasil, o que corresponde a 1,1% das residências. Os números do SBTVD incluem os conversores embutidos nos aparelhos de recepção móvel. 

Durante a implantação da TV Digital no Brasil, a interatividade foi divulgada como principal atrativo do sistema e apontada por especialistas como o pilar desse novo tipo de transmissão, mais inteligente e próxima do telespectador. Porém, as mudanças trazidas pela nova tecnologia melhoram apenas a qualidade da imagem e do som, mas ainda não proporcionam interatividade conforme o esperado.  

Dois perfis de aplicativos interativos estão sendo definidos pelo fórum do SBTVD para atender ao público, tanto de maior quanto de menor poder aquisitivo. No entanto, esses aplicativos só devem chegar efetivamente aos televisores em 2010 e os fabricantes terão que produzir equipamentos (conversores) voltados a essa característica. De acordo com o professor Eduardo Antônio, o desenvolvimento de conteúdo interativo pelas emissoras do país ainda vai demorar a se concretizar. “Sabíamos que a interatividade não ia acontecer de uma hora para outra. Quando ela for desenvolvida, dará ao telespectador a possibilidade de acessar outros conteúdos a que ele não teria acesso anteriormente. Mas a geração desses conteúdos ainda depende das emissoras”, ressalta o professor. 

Até o momento, a TV digital trouxe benefícios apenas do ponto de vista técnico. Contudo, os movimentos sociais de mídia livre, com a implantação da TV Digital, estão preocupados com outra questão: a democratização do principal meio de comunicação, que, atualmente, é a televisão. Com a democratização desse meio, a sociedade participaria de maneira ativa na produção de conteúdos, enriquecendo a diversidade e oferta de programas oferecidos pelos canais.  

Ocorre que o sistema de televisão no Brasil, e isso inclui o sistema digital em implantação, está centrado em grandes conglomerados de comunicação. Sem alterações nas condições de concessão dos canais, não haverá maiores possibilidades de efetiva democratização da comunicação por meio da TV.  

A palavra é democratizar 

Até o momento, a TV digital trouxe benefícios, principalmente do ponto de vista técnico. Mas os movimentos sociais de mídia livre estão com a atenção voltada para outra questão: a democratização do principal meio de comunicação, que, atualmente, é a televisão. “Há uma oferta mais concreta de processos de democratização. Esses, no entanto, precisam se efetivar. Os aspectos da democratização passam pela oferta de qualidade de serviços, como sinal e telefonia. No entanto, parece que os valores anteriores à implantação da TV digital, aqueles pautados no lucro, ainda são mais importantes”, aponta Cristina Rego Monteiro, professora da Escola de Comunicação (ECO) da UFRJ.  

O sistema de televisão no Brasil, e isso inclui o sistema digital em implantação, está centrado em grandes conglomerados de comunicação.  Sem alterações nas condições de concessão dos canais, não haverá maiores possibilidades de uma efetiva democratização da comunicação por meio da TV. Os gigantes brasileiros da comunicação não aparentam estar inclinados ao real debate da democratização: poucas empresas mandaram representantes para a Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), que acontece até 17 de dezembro, em Brasília.  

“A Confecom é um retrato explícito da situação. A atitude política de evasão pode dificultar o exercício de um diálogo mais amplo, mas não é capaz de impedir as mudanças. As empresas tentam ganhar tempo, entretanto, para organizarem uma ação estratégica que mantenha os interesses de cada grupo em particular”, avalia Cristina.  

Com a democratização da TV, a sociedade participaria de maneira ativa da produção de conteúdos, enriquecendo a diversidade e oferta de programas oferecidos pelos canais. “Assim, haveria mais material culturalmente contextualizado para o público examinar e chegar às suas próprias conclusões”, pontua.