• Edição 270
  • 06 de outubro de 2009

De Olho na Mídia

Havaianas: moderninha, mas democrática

João Pedro Dutra Maciel


Após colocar em circulação na mídia televisiva propaganda em que uma senhorinha incentiva sua neta a praticar sexo sem compromisso, a Havaianas resolveu, por conta própria, tirar o anúncio do ar e substituí-lo por outro. Neste, a mesma senhora aparece explicando os motivos que levaram a marca de sandálias a se autocensurar. Antecipando-se a possíveis problemas resultantes da abertura de processos no Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar), a São Paulo Alpargatas, proprietária da marca, levou em consideração a opinião dos consumidores que se sentiram ofendidos e, numa atitude democrática, restringiu a veiculação da propaganda à internet, em seu próprio site.

Para Marcelo Serpa,  professor de Publicidade da Escola de Comunicação da UFRJ,  a medida dos anunciantes responsáveis pelo comercial foi a mais acertada, já que os espectadores indignados são tão consumidores quanto os demais, que apresentaram apoio à campanha. “No momento em que manifestações contrárias acontecem à divulgação da sua peça publicitária, é preciso avaliar a situação e retirá-la do ar”, afirma ele. Na opinião do especialista, independentemente de o Conar censurar ou não, a iniciativa da ação deveria partir mesmo da própria marca. “Se há um desagrado com a minha propaganda, eu mesmo devo controlá-la. Não preciso esperar alguém me mandar fazer isso ou não”, explica.
 
Apesar do sucesso com boa parte do público, alguns setores da sociedade, principalmente aqueles ligados a entidades religiosas, desaprovaram a fala da personagem de Lúcia Berta, que aconselha sua neta a se envolver com homens como o ator Cauã Reymond apenas por sexo. “As pessoas estão desatualizadas. Sexo hoje está na boca de todo mundo, como bala na boca de criança”, defende a senhora de 84 anos.

Na visão de Serpa, porém, a preocupação com a aceitação do anúncio não deve ser de ordem moral, mas sim  prática. “Cada anunciante precisa vender o seu produto e conquistar o consumidor. A função da propaganda é agradar o cliente, atendê-lo como ele deseja”, declara o publicitário, sustentando que, “do ponto de vista comercial, a Havaianas poderia ter tido prejuízo nas vendas caso não se retratasse com o grupo de consumidores atingido pela campanha”. Ele defende ainda que a empresa poderia ter optado por outras estratégias, mas a inserção do comercial na internet foi algo bastante sensato e propício nos dias de hoje. “A exibição dessa propaganda é algo discutível. Eles poderiam ter escolhido horários diferentes para exibi-la, em que as crianças não assistissem à televisão, por exemplo. A grande ideia foi justamente limitar o acesso através da internet, apenas para quem quiser assistir”, opina.

A atual popularização da web permite que, em casos como esse, o publicitário impeça a propagação de sua campanha na TV e a destine exclusivamente ao público interessado. Embora a TV esteja presente em 98% dos lares brasileiros, as redes virtuais são hoje uma grande ferramenta para a circulação de notícias, informações e propagandas. “Há cinco anos, a internet ainda não era tão significativa, mas conforme a web vai ganhando espaço na vida das pessoas, através da inclusão digital, mais ela se torna uma mídia capaz de influenciar o consumo”, garante Marcelo Serpa. Segundo o publicitário, por ser menos invasiva que a televisão, a internet possui a vantagem de veicular o que quiser, sem a necessidade de ofender ninguém. “Esse foi o grande trunfo da Havaianas, que mostrou ser uma marca respeitadora da opinião pública geral e ainda gerou para si maior visibilidade”, conclui Serpa.