• Edição 237
  • 03 de fevereiro de 2009

Zoom

O impacto do novo acordo ortográfico no mercado editorial

Monike Mar – AgN/Praia Vermelha

imagem zoom

Os brasileiros têm desde o primeiro dia de 2009 o desafio de uma nova aprendizagem: adotar as regras do novo acordo ortográfico da língua portuguesa. Embora o prazo de adaptação seja de quatro anos, o mercado editorial já vem sofrendo o impacto das mudanças em 0,5% das palavras. As novidades vão além da mudanças em acentos e hífens diante do investimento das editoras na publicação de dicionários e livros didáticos adaptados às regras do novo acordo.

No Brasil, as editoras já vêm realizando mudanças gradativamente, pois além do custo de adaptação dos livros à norma, há prioridades, como no caso dos livros didáticos. Livros do ensino Fundamental têm entre 2010 e 2012 para adotar as novas regras. Os do ensino Médio também deverão cumprir o acordo a partir de 2012. Os livros de catálogo das editoras podem apresentar as duas grafias até 2012. Porém, os novos lançamentos já devem ser publicados de acordo com o novo acordo.

As mudanças em médio prazo ocorrem principalmente em razão do custo dos ajustes por parte das editoras brasileiras. Segundo Paulo César Castro, coordenador do curso de Produção Editorial da Escola de Comunicação da UFRJ, a editora Companhia das Letras, que possui dois mil livros em seu catálogo, prevê gastos em torno de R$ 4,5 milhões, com o custo de revisão por título na média de R$ 3 mil.

“Para o conjunto das editoras brasileiras, o custo previsto de adaptação é de R$ 4 milhões por ano”, informou Castro, acrescentando que, pelos cálculos da Câmara Brasileira do Livro (CBL), este custo pode ser ainda mais alto.

Em relação aos dicionários, algumas editoras já se anteciparam aos ajustes, como a Objetiva, que, em agosto do ano passado, lançou o Mini Houaiss com as novas regras. A Scipione e a Ática, maiores editoras de livros didáticos do país, do grupo Abril Educação, publicaram todos os títulos dentro do acordo, em janeiro. A Academia Brasileira de Letras (ABL) lançou, no fim do ano passado, o Dicionário Escolar da Língua Portuguesa. A publicação já está na segunda edição, após a primeira esgotar com uma tiragem de 15 mil exemplares.

Apesar dos investimentos, a unificação da ortografia entre os oito países — Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Princípe, Timor-Leste — que integram a Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) objetiva a expansão do mercado editorial dos livros em português. Calcula-se que cerca de 200 milhões de pessoas falam português no mundo.

– Em termos editoriais, vejo no acordo a chance de abertura de novos horizontes para as editoras brasileiras, principalmente na área de didáticos, um mercado altamente promissor à medida que os países africanos de língua portuguesa aumentem seus níveis de alfabetização. Certamente não será uma mudança da noite para o dia pois, além do prazo de adaptação, que depende de cada país, o acordo esbarra também no aspecto cultural da resistência que uma mudança desta natureza provoca. Acredito que somente em cerca de uma década possamos sentir, em termos econômicos, as mudanças para as editoras brasileiras — analisa Castro.

Implantar regras em oito países pode ser visto por alguns como desnecessário ou, ainda, uma desconsideração dos dinamismos pertencentes a cada cultura, já que a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa envolve quatro continentes, América, África, Ásia e Europa. Porém, como considera Paulo César Castro, a assinatura do novo acordo ortográfico tem suas vantagens:

— Vejo o acordo como benéfico diante da preocupação de que o português torne-se uma língua com um mínimo de padronização internacional e, com isso, tornando possível seu uso mais facilmente pelos órgãos internacionais. Se um dos objetivos do acordo é ter uma língua fortalecida pelo uso comum que farão os países de língua portuguesa, defendo a unificação da gramática. Mas ressalto que isso não significará o apagamento das particularidades que cada país tem no uso da língua.

Sinal desses aspectos particulares a cada cultura é o percentual de mudanças nas palavras de cada país. Enquanto ao Brasil foi concedido o prazo de quatro anos para adaptação, cabe a Portugal adaptar-se às novas regras em até seis anos, já que 1,6% de suas palavras sofreram alterações. Assinado em dezembro de 1990 em Lisboa, o acordo só contou com a participação do Brasil depois que o presidente de Portugal Aníbal Cavaco Silva assinou o Segundo Protocolo Modificativo, em julho de 2008, confirmando a adesão lusitana.

— Portugal, mesmo tendo sido o primeiro país a ratificar o Acordo, logo em 1991, protelou o quanto pôde. Apesar de ter levado 18 anos para seu efetivo emprego, o acordo teve no Brasil o seu principal defensor – ainda que com algumas vozes dissonantes. Ao Brasil, na verdade, foi recomendado não aplicar o acordo em 2008 para esperar a adesão de Portugal, sob o argumento de que uma unificação ortográfica sem Portugal já nasceria desunida — explica Castro.