• Edição 230
  • 18 de novembro de 2008

Olho no Olho

Sob os raios do sol

Raquel Oliveira – AgN/CT

imagem olho no olho

Não é de hoje que se ouve falar em energia solar. Apesar da matriz energética de grande parte dos países passar ao largo dela, tal fonte é velha conhecida de especialistas e de comunidades isoladas. Ultimamente, ela ressurgiu com força como uma opção não tão agressiva ao meio ambiente quanto as formas mais tradicionais de geração de energia, como as usinas hidrelétricas e termelétricas, ou formas até não convencionais, mas altamente perigosas e impopulares, como as usinas nucleares.

Algumas cidades ao redor do globo já passaram por experiências bem sucedidas. São exemplos Ota, no Japão, localizada em uma das regiões que mais recebe iluminação solar no país, e Brandis, na Alemanha. Nesta última, foi colocada em funcionamento recentemente uma grande unidade de geração de energia solar – supostamente a maior do mundo – composta de 100 mil placas fotovoltaicas.

Há diferentes tecnologias disponíveis para o uso da energia solar. Uma delas serve para o aquecimento da água. “No caso mais comum, a energia solar é armazenada na forma de energia térmica, aquecendo um reservatório de água, que poderá ser usada para fins que não requerem altas temperaturas, por exemplo, para banhos. É o uso mais econômico da energia solar, na medida em que se está falando de uma tecnologia simples, barata, e de vasta aplicação. Neste caso, substitui o chuveiro elétrico ou aquecedor a gás, o que traz claras vantagens econômicas e ambientais”, explica Roberto Schaeffer, pesquisador e professor do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia (COPPE).

As outras tecnologias servem para a produção de energia elétrica. As mais comuns, segundo Schaeffer, são o painel fotovoltaico e a termeletricidade solar. Esta última serve para aquecer a água a fim de produzir vapor, utilizado em turbinas para a geração de energia.

Apesar das evidentes vantagens, a energia solar também tem seus pontos negativos, dentre os quais o custo dos painéis e os impactos embutidos na construção dos aparatos de suporte. Para esclarecer estas questões, o Olhar Virtual conversou com Oscar Corbella, professor do Programa de Pós-Graduação em Urbanismo da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU), e Neilton Fidelis, pesquisador do Instituto Virtual Internacional de Mudanças Globais (IVIG).

 

Oscar Corbella
Pesquisador e professor do Programa
de Pós-Graduação em Urbanismo
da FAU

A energia solar não provoca poluição, diferente da energia termelétrica, da nuclear ou, ainda, da hidroelétrica; todas geram algum resíduo ou problema ambiental. Para sua implantação, tal como a de qualquer tipo de usina convencional, geradora de energia utilizável (elétrica ou térmica), é necessário um investimento inicial, mas a diferença é que, na solar, a fonte geradora é gratuita.

A Terra existe somente porque recebe energia solar. Sua utilização no processo de transformação para energia térmica ou elétrica não gera quaisquer problemas. Na construção dos elementos captadores de energia solar, se produz igual ou menor poluição que para quaisquer outros geradores de energia, que queimam combustíveis ou represam águas em enormes volumes.

O Brasil, por estar quase totalmente compreendido entre o Equador e o Trópico de Capricórnio, é um dos países que recebe maior quantidade de luz solar. O que falta para esta energia ser utilizada em grande escala é a vontade política das autoridades, que poderia concretizar-se com um plano de apoio às iniciativas privadas, mas também por um plano político geral sobre energia, que valorize as formas não convencionais e limpas de produzir energia.

Para o caso da produção de energia elétrica via energia solar é necessária a articulação com todas as outras formas de produção de energia, sejam tradicionais ou alternativas, trabalhando em rede que cubra todo o território nacional. Para produção de energia térmica, por exemplo, com coletores planos acima do telhado das construções, não é necessária a integração, mas é necessária uma política conjunta, pois se sabe que onde entrarem os coletores solares saem os chuveiros elétricos, modificando a potência disponível ao bairro ou à cidade. Também, entendendo que a energia solar não é recebida de forma constante, para os períodos sem sol, noturnos ou nublados, é necessário que a energia solar atue aliada, por exemplo, com a hidroelétrica (quando tem sol, as usinas solares produzem eletricidade para a rede, liberando as hidroelétricas que acumulam energia potencial no reservatório e geram eletricidade quando necessário).

 

Neilton Fidelis da Silva
Doutor em Planejamento Energético pela
COPPE e pesquisador do Instituto Virtual
Internacional de Mudanças Globais (IVIG)

O Brasil tem, reconhecidamente, um grande potencial solar. Podemos pensar essa energia de duas formas: utilização para aquecimento de água, que tem grande espaço – alguns estados, como São Paulo, têm leis que determinam a futuras construções o projeto deste uso – e utilização fotovoltaica. Quanto a esta, temos dificuldades. O problema é que essa tecnologia está em processo de maturação, não é competitiva como a rede elétrica.

No Brasil, ainda não usamos a energia solar de forma comercial, como no Japão e em alguns países europeus; por enquanto, a geração de energia ainda está centrada em comunidades isoladas, nas quais o custo de levar a rede convencional é alto.

A produção e a purificação do material fotovoltaico também geram resíduos. Nenhuma produção de energia, por mais verde que seja, é totalmente isenta de poluentes. No meio rural, por exemplo, não tem uma rede, mas uma bateria, com um período de vida útil. Há que se pensar o que fazer com ela quando acabar.

Penso que a sociedade será muito receptiva à energia solar quando “mostrarmos a conta”. Não acho que as pessoas sejam preconceituosas com a tecnologia solar. Ao contrário, elas acham até poético. É diferente da energia nuclear.

Economicamente, a energia solar ainda não é tão viável. Quanto mais precisarmos dela, mais caro vai ficar. Teve uma época que trabalhei com um kit residencial que dava a possibilidade de manter uma televisão 14 polegadas e duas lâmpadas fluorescentes econômicas compactas ligadas por quatro horas. Se usasse mais do que isso, o sistema caía, a bateria desligava e você ficava sem energia. É diferente da mágica que é a rede. Compramos os equipamentos e a concessionária tem que se virar para disponibilizar energia, terá um preço, é óbvio. Portanto, quanto mais eletrodomésticos você tiver, quanto mais autonomia você quiser, mais caro vai ficar o sistema. Os custos variam em função da necessidade de cada um. A interação do usuário com a rede é diferente. Ele tem que sentir o que o sistema pode ou não.

Hoje se pensa muito na energia fotovoltaica aliada a outras formas de geração. Quando estivermos no estágio da fotovoltaica, quando ela for competitiva e interconectada à rede convencional, acabará a dificuldade de sustentabilidade. O problema é o nosso padrão auto-sustentável. Queremos deixar a televisão ligada na sala quando ninguém está assistindo, de abrir a geladeira e ficar meia hora vendo o que está lá dentro. Se mantivermos essa falta de cuidado, os custos com certeza serão altos e a área ocupada pelas placas que captam a luz solar, grande.