• Edição 230
  • 18 de novembro de 2008

Ponto de Vista

Família e escola: uma parceria promissora

Vanessa Sol

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Muitos são os fatores que podem influenciar no desempenho e na aprendizagem de uma criança ou adolescente em fase escolar. Um deles é a família. Para o sucesso escolar de um estudante, não é necessário que os pais sejam escolarizados ou possuam uma alta renda familiar. Basta que eles tomem a educação como valor básico para a formação do ser humano.

De acordo com a coordenadora pedagógica da Faculdade de Educação da UFRJ, professora Iris Rodrigues, há casos em que pais analfabetos ou semi- alfabetizados têm filhos com excelente rendimento na escola. Isso acontece porque aquela família acredita na Educação como fator de transformação. “A família precisa criar na criança a disponibilidade para aprender e isso é realizado através dos valores que são passados para essa criança”, enfatiza.

A coordenadora ressalta, ainda, que, em alguns casos, a família tem transferido toda a responsabilidade de educar para a escola. Entretanto, a família é uma das três instâncias, de acordo com a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) e com a Constituição Federal, responsáveis pela educação dos filhos.

Para entender melhor a participação da família na vida escolar dos filhos e compreender o atual panorama educacional do país, confira a entrevista do Olhar Virtual com a professora Iris Rodrigues.

Olhar Virtual: Uma recente pesquisa constatou que família é responsável por 70% do desempenho escolar de um estudante. A família interfere, efetivamente, no desempenho escolar de uma criança ou adolescente?

A família é fundamental não apenas para o desempenho, mas também para o interesse que a criança demonstra nas atividades da Educação formal. De acordo com a LDB e com a Constituição Federal, a Educação tem que ser promovida pela escola, pela família e pela sociedade. Essas são as três instâncias educativas configuradas na legislação. A família é a base em que se sustentam os valores e se promove a Educação no âmbito informal – Educação que não tem tempo nem hora para acontecer, não tem série nem avaliação sistemática como na escola.

A escola é instância social, uma referência para formar o homem de acordo com os valores daquela sociedade, naquele momento histórico, para transmitir os saberes socialmente construídos.

Na Educação, não se visa apenas o rendimento, mas a participação efetiva do aluno e seu interesse. A família é essencial para estimular esse interesse no estudante. Ela precisa criar na criança a disponibilidade para o aprendizado.

Olhar Virtual: De que maneira os pais podem interferir positivamente no processo de aprendizagem dos filhos?

Respeitando os valores que constituem aquela família como núcleo cultural ou nicho cultural, como chamamos hoje em dia. Ao escolher a escola de seus filhos, os pais buscam aquela que reflita e reforce os valores que aquela família possui como base de formação de um homem (no sentido da humanidade).

A família, ao organizar os seus valores, faz com que a criança e o adolescente freqüentem escolas que coadunem com a visão de cultura, de sociedade, de economia e de religião que ela defende como valor.

É um erro, por exemplo, pais colocarem seus filhos em escolas contrárias a todos os valores que aquela família defende. Essa criança nunca se sentirá à vontade nessa escola e não terá a disponibilidade para aprender.

Olhar Virtual: A senhora acredita que a Educação é transmitida de geração para geração?

Acreditar em alguma coisa é cristalizar um conhecimento, ele fica parado. A Educação é dinâmica. É algo que se dá a cada momento. A cada dia, a cada hora, se tem uma nova Educação. Então, tem que se investir e produzir em educação. Ela é um bem que se produz a cada aula, a cada orientação ao aluno, a maneira como se recebe esse estudante.

Talvez, não se possa dizer que ela é transmitida de geração em geração porque, em geral, na adolescência, são questionados os valores transmitidos pela família e que a escola consolidou. É a partir desse questionamento que se produzem novos valores. Por isso, uma era histórica nunca é igual a outra. Os novos tomam como base o que foi ensinado para projetar o futuro.

Todas as formas de Educação sofrem um movimento de questionamento e, posteriormente, um movimento de produção de novos conceitos, estruturas e formas de se ver o mundo.

Olhar Virtual: Fatores como escolaridade do pai e da mãe e renda familiar podem interferir no desempenho da aprendizagem de um estudante?

Nós vivemos em um mundo regido, em sua maioria, por parâmetros econômicos. Às vezes, as pessoas, para solidificar ainda mais a sua ideologia, usam determinadas estruturas ou formas de ver o mundo como desculpa. Há escolas em que as crianças têm uma baixa renda, mas o desempenho é excelente. Isso acontece porque a família acredita nos valores que constituiu junto com aquela criança e com aquela escola. É importante que a família tome a Educação como um valor maior na formação de seus filhos. Além da Educação, outros valores como os culturais, éticos, étnicos, religiosos e artísticos são importantes para a formação da criança e do adolescente.

Os pais são os primeiros educadores, independente de sua condição econômico-financeira e profissional.

Olhar Virtual: Os pais estão transferindo à escola a responsabilidade de educar?

Infelizmente, o que mais se tem visto hoje em dia é transferência de responsabilidade. Aliás, isso é bem típico do imaginário brasileiro: aquilo que a família não pode ensinar, a escola ensina. É não querer tomar partido, não querer se envolver, é abrir mão de sua competência política para lidar com a educação de seus filhos.

Olhar Virtual: A senhora poderia fazer uma breve análise da Educação no Brasil atualmente?

A Educação brasileira sempre se espelhou em modelos externos. A minha visão é que, hoje, estamos tentando um caminho próprio, uma organização conceitual própria, muitas vezes por ensaio e erro. Mesmo assim é bom. Mesmo que demore algum tempo, o caminho está sendo construído. Educação não pode ser uma ação imediatista. Em épocas eleitorais, muito se promete e pouco se faz porque quando os políticos vêem que investimento na Educação só será notado daqui a cinco ou dez anos, eles desistem. Isso é um retrato do egocentrismo e da vaidade de alguns representantes da política no país.

A Educação é uma semente que se planta para se ter uma bela árvore no futuro. E, provavelmente, quem plantou a árvore não colherá seus frutos. Mas é assim que se forma uma cultura educacional. Se não consolidarmos uma cultura educacional na qual pudermos investir e cultivar, não vai adiantar esse monte de avaliações por aí. O que adianta é consolidar um modelo de formação de homem que tem uma boa visão de mundo, que constrói o seu mundo.