• Edição 154
  • 12 de abril de 2007

Ponto de Vista

Conceito de sanidade delimitando a cidadania

Priscilla Bastos

imagem ponto de vista

Ao longo de sua história, a humanidade veio definindo e conceituando sanidade e insanidade, usando-se dos mais variados critérios para tal. Um dos mais utilizados é o embasamento em fatos científicos, que dão um viés de verdade absoluta à idéia.

Com a definição de sanidade e insanidade mental, gerou-se um problema. Até que ponto uma pessoa tida como doente tem assegurado seus direitos como cidadão? Para tratar de um tema tão complexo de polêmico, o Olhar Virtual conversou com o professor e vice-diretor do Instituto de Psiquiatria da UFRJ, Márcio Amaral.

"Em verdade, ao nos referirmos à história, os critérios de definição de sanidade e insanidade mental foram mais pseudocientíficos do que propriamente científicos. Ainda hoje, a expressão "loucos de todo gênero" é amplamente usada na discussão da decisão referente à manutenção ou não dos direitos civis de uma pessoa. Sendo realista, esse não é um linguajar realmente científico, mas uma repetição do seu uso popular.

Com relação à oposição sanidade versus insanidade no que se refere ao exercício da cidadania, a questão não está bem colocada, uma vez que o que interessa é o fato de o transtorno toldar ou não a capacidade de alguém avaliar as situações da vida e tomar decisões. Assim, depressões ou transtornos de ansiedade, por exemplo, não prejudicam gravemente aquela avaliação. A limitação ao exercício da cidadania, dessa forma, deve se restringir às demências moderadas e graves e aos quadros psicóticos graves — incapacidade de integrar o que se passa à volta de maneira razoável e compartilhada. Apesar disso, as escolas mais modernas têm defendido uma flexibilidade maior na aplicação da interdição; ela deveria ser provisória nesta e na maioria dos casos.

Absurda e reveladora é a exigência de apresentação de atestados médicos para uma pessoa fazer um testamento ou tirar carteira de motorista, como forma de mostrar que não sofre de nenhum transtorno mental, o que demonstra o velho preconceito contra eles. Isso insinua a idéia de que quem sofre de alguma doença mental está condenado à perda dos direitos civis. Costumo dizer que, se uma exigência como essa fosse feita a qualquer outro tipo de problema de saúde, haveria uma enxurrada de protestos na sociedade."