• Edição 135
  • 11 de outubro de 2006

Olho no Olho

O Brasil deve comprar uma briga com a China na OMC?

Leonardo Velasco

imagem olho no olho

No Fórum para a Cooperação Econômica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa, em Macau, o ministro do comércio exterior da China, Bo Xilai, pediu que governos e empresários do Brasil e da China tentassem resolver disputas comerciais, evitando atritos na Organização Mundial do Comércio (OMC).

O motivo de tal pedido, é que algumas empresas brasileiras se dizem prejudicadas pela competição chinesa e consideram importante ingressar com pedidos de salvaguardas na OMC. Entre elas estão produtores de armação de óculos, peças de bicicleta, escovas, calçados e máquinas.

O tema foi, inclusive, levantado por Geraldo Alckmin no debate da Rede Bandeirantes, quando este criticou a política externa do presidente Lula. O Olhar Virtual ouviu Reinaldo Gonçalves, professor do Instituto de Economia (IE), e Franklin Trein, professor do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (IFCS), sobre o assunto.

 

Reinaldo Gonçalves
professor do Instituto de Economia

"Isto [o pedido do ministro chinês] é bastante sensato e, até mesmo, trivial. A OMC é um arranjo multilateral que só deve ser usado quando os esquemas bialterais, formais ou informais, fracassarem.

O Brasil, como qualquer outro país, pode entrar quando quiser na OMC. O problema é ganhar e, no caso do Brasil, é ganhar e levar. País fraco como o nosso, ganha mas não leva. Isto é exatamente o que está acotnecendo com o algodão. O Brasil não tem força para retaliar quem quer que seja. E, as paparrotadas de Lula na política externa não alteram a vulnerabilidade externa estrutural do país.

O problema central é que o Brasil está " andando para trás", com a economia marcada por pouco investimento e reduzida eficência sistêmica. A China, por outro lado, é a economia mais dinâmica do mundo. Nós temos uma economia capitalsita atrasada, e eles uma economia mixta de enorme dinamismo. O nosso problema somos nós mesmos.

A política externa de Lula é conhecida pela síndrome do "samba enredo" tem muita alegoria e pouco enredo. Praticamente nenhum resultado concreto deriva dessa política e as derrotas são inúmeras. Os resultados positivos decorrem de mudanças no sistema internacional e, acontecem a despeito de Lula. Para ilsutrar, o crescimento das exportações é causado pelo atual ciclo de expansão da economia mundial."

Franklin Trein
professor do IFCS

“Em termos genéricos, entrar com um pedido de abertura de um painel na OMC é sempre direito de um país que se sinta prejudicado. Há, no entanto, circunstâncias que devem ser avaliadas. Às vezes uma vitória jurídica pode ter um preço político muito grande.

Neste caso, a situação é bastante complexa. Primeiro pelo que significa a China na economia mundial. Por outro lado, porque ela ainda não faz parte da OMC e isso pode dificultar seu ingresso, já que pode mostra que o país não estaria disposto a apoioar os chineses por não respeitarem as regras comerciais. O que não significa dizer que as regras são sempre convenientes para o Brasil ou para a China.

A China vem exercendo uma de pressão econômica ao se apresentar como uma grande fornecedora de produtos de tecnologia mais simples. Ela não só estabelece competições predatórias (seja porque é produzido em larga escala, os custos de produção são mais baixos, porque a força de trabalho tem um baixo custo comparado a outros lugares do mundo), conseguindo deslocar fornecedores tradicionais internacionalmente. Ao mesmo tempo, ela consegue penetrar, por vias não muito transparentes (contrabando, maquiagem de produtos), em mercados internos. A gente tem assisitido a invasão de produtos chineses e isso é complicado.

Existem, na OMC, regras que estabeleçam condições mínimas de reciprocidade e não há nem condições técnicas para isso. Buscar se proteger desta prática é uma maneira de chamar atenção para que há regras, sob pena de que as relações fiquem tensas, mas para se proteger no mercado interno e internacional, como fornecedor, para não prejudicar nossa economia.

Sempre se recomenda a maior cautela, mas deve-se, sobretudo, ter clareza e firmeza sobre como agir. Em última instância, creio que não se deve estabelecer a regra de nunca se reclamar da China. Mas nada impede que sejamos um bom negociador, cauteloso. O conhecimento internacional e da importância da China no cenário mundial, devem ser os dois parâmetros analisados, que dirão como se deve agir.

Mas não adianta comprar uma briga agora para ter problema mais adiante, já que os países têm alguns tratados de cooperação. Não vale a pena, por causa de meia dúzia de bugigangas, comprometer o trabalho em conjunto na área aeroespacial, por exemplo."