• Edição 135
  • 11 de outubro de 2006

No Foco

Pesquisa revela segregação de cor no mercado de trabalho

Julia Paula/ Agn. Praia Vermelha

foto no foco

O grau de escolaridade é um dos fatores que explica a desigualdade no mercado de trabalho brasileiro. A escolaridade e o mercado de trabalho estão interligados num ciclo vicioso que se propaga há várias gerações, contribuindo para a manutenção das desigualdades sociais e até mesmo raciais.

O acesso a boas condições de ensino está intimamente ligado ao rendimento familiar. As famílias de baixa renda não dispõem de recurso para investir na qualificação profissional de seus membros. No Brasil, este problema é agravado pelas condições precarizadas do ensino público, o que o torna incapaz de preparar os estudantes para o mercado de trabalho, tirando-lhes a chance de conseguir ocupações bem remuneradas.

O professor João Sabóia, diretor do Instituto de Economia da UFRJ, acrescenta que no Brasil, muito mais do que em outros países, a escolaridade é fator determinante nas condições de vida das pessoas: “o mercado de trabalho brasileiro valoriza muito a escolaridade. Isso é a marca da desigualdade brasileira e tem reflexos diretos no mercado de trabalho”. E essa questão é ainda mais notável quando comparamos as ocupações no mercado de trabalho de negros/pardos e brancos.

Explorando a questão da desigualdade racial no mercado de trabalho, o professor João Sabóia e Ana Lúcia Sabóia, chefe da Divisão de Indicadores Sociais do IBGE, elaboraram o artigo Brancos, pretos e pardos no mercado de trabalho no Brasil, que foi apresentado na II Conferência Internacional da REAA – Rede de Estudos de Ação Afirmativa.

A partir de dados da Pesquisa Mensal de Emprego (PME), de março de 2004, e da Pesquisa Nacional da Amostra de Domicílio (PNAD), de setembro de 2004, os pesquisadores mostram que negros e pardos possuem menores níveis de escolaridade e, portanto, assumem as piores ocupações, recebendo os menores rendimentos.

A diferença de anos de estudos entre os grupos analisados é grande. Tomando como fonte a PME, mostra-se que do total de pessoas analisadas, 24,9% dos negros e pardos têm 11 ou mais anos de estudo e, em contrapartida, 42,9% dos brancos dispõem do mesmo nível de instrução. Segundo a mesma pesquisa, o número de pessoas negras com baixa escolaridade é bem maior do que a dos brancos, suas faixas de segmentação que vão de “sem instrução” até “4 a 7 anos” de estudo revelam que 54,5% dos negros estão neste patamar. No caso dos brancos essa percentual cai para 38,5. (Confira a tabela)

Em outra sessão da pesquisa, levando em conta os dados da PNAD, os professores revelam que a discrepância entre a quantidade de brancos e negros em ocupações de nível universitário é grande. Somente 18% do total de pessoas analisadas nessas condições são negras ou pardas.

Levando em consideração esses fatos, a pesquisa analisa, também, a remuneração no mercado de trabalho envolvendo ocupações de nível universitário e não universitário. No caso de tarefas que não exigem a formação universitária o salário dos brancos chega a ser 100% maior que o dos negros e pardos, enquanto que no mercado de trabalho de nível universitário essa diferença cai para 15%, em média.

Para o professor Sabóia, os dados relacionados no artigo sustentam a defesa do estabelecimento de cotas para negros nas universidades, pois esse seria um mecanismo de amenizar as desigualdades raciais: “ao chegar à conclusão de que a diferença entre o rendimento das raças, em ocupações universitárias, é pequena, então, de repente, se tem um argumento favorável à facilitação da entrada dos pretos e pardos na universidade, pois, a partir disso, eles conseguirão ter um nível de remuneração satisfatório, equivalente a dos brancos que chegaram à universidade.”

Complementando o pensamento do professor Sabóia, Mariléia Inoue, professora da faculdade de Serviço Social da UFRJ, ressalta que a questão da adoção de cotas é um assunto bastante complexo que deve ser estudado sob vários ângulos. “Em primeiro lugar, não basta, somente, facilitar a entrada na universidade, pois esses estudantes vão precisar de auxilio, até mesmo financeiro, para permanecerem nela. Em segundo, as cotas não devem ser baseadas, apenas, na questão racial, devem vir acompanhadas de uma análise das condições socioeconômicas do estudante, pois num país de mestiços fica bastante complicado determinar quem é negro ou pardo. E por último, devemos questionar a Educação como um todo para não mascararmos a questão principal, que são as deficiências do ensino no Brasil”, argumentou Mariléia.