• Edição 125
  • 03 de agosto de 2006

Ponto de Vista

O mal da indiferença

Aline Durães

imagem ponto de vista

A passividade do indivíduo contemporâneo frente à realidade e à vida levou Ronaldo Lima Lins, diretor da Faculdade de Letras, a escrever o livro intitulado “A Indiferença Pós-Moderna”, que será lançado, pela Editora da UFRJ, no dia 29 de agosto, na Livraria da Travessa.

A idéia do livro surgiu depois de Ronaldo ter o vidro do seu carro quebrado por um jovem de rua que pedia dinheiro em um sinal de trânsito, no Centro do Rio de Janeiro. De acordo com o professor, várias pessoas testemunharam o episódio, mas nenhuma delas veio em seu auxílio. Ronaldo conta também que ficou surpreso ao perceber a indiferença com que lidou com o ocorrido.

A obra “A Indiferença Pós-Moderna” foi concebida como uma tentativa de chamar a atenção das pessoas para a insensibilidade que permeia as relações humanas atuais. Seguindo a perspectiva sartriana, Ronaldo Lima Lins credita ao intelectual o dever de convocar os indivíduos a refletirem sobre as mazelas da sociedade.

Dividido em quatro trípticos (referência aos quadros renascentistas divididos em três partes), o livro trata de temas como identidade, amor, aventura e indiferença, traçando contrapontos entre a modernidade e o período contemporâneo. Para esmiuçar melhor as idéias que guiam a obra, o Olhar Virtual entrevistou Ronaldo Lima Lins.

“Não se pode falar em indiferença, por exemplo, à época da Revolução Francesa. A humanidade, naquele momento, perdeu a fé na metafísica, mas encontrou outra forma de conservar suas esperanças, agindo intensamente nessa direção. Até o amor era revolucionário. Já na expressão literária e artística da nossa época o amor aparece, mas de forma perversa.

As últimas premiações do Nobel mostram isso. Em escritores destacados como John Coetzee, um dos maiores do mundo contemporâneo, o amor é seco, feito de total aridez; as pessoas não conseguem expressar sentimentos porque têm uma solidão interior muito grande.

Na modernidade, havia o desejo de criar um mundo novo, uma literatura nova, uma forma de expressão nova. Não havia indiferença; tudo era intenso. Nós, hoje, não pretendemos mais uma literatura nova, porque o pós-modernismo, de certa maneira, admitiu que não há possibilidade de fazer o novo; tudo é mais ou menos igual. Não pretendemos fazer uma sociedade nova; nem se sabe que sociedade nova seria essa, porque todas as propostas anteriores desabaram.

Estamos em um mundo feito de desigualdades, que assumiu isso como se isso fosse uma condição da vida. Os desempregados são convidados a consumir como todo mundo. Eles não têm acesso a essas invenções tecnológicas, mas querem ter. As invenções da humanidade – supérfluas do ponto de vista da alma, do interior do indivíduo – organizam o mundo de uma forma terrível e desigual.

O atual sistema que faz com que as pessoas queiram ter as coisas, mas, para isso, elas pagam o preço de só poderem ter algo se passarem ao lado de um miserável e não dar a mínima. As idéias de solidariedade e fraternidade que faziam com que as pessoas se indignassem e quisessem fazer alguma coisa esmoreceram muito.