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Edição 120      29 de junho de 2006


Olho no Olho

A Memória do Voto

Aline Durães

imagem olho no olho

Depois de longos períodos de governos autoritários e centralizados, o povo conquistou o direito de intervir na política do país através do voto. Votar é mais do que o exercício da cidadania; é a prática democrática que dá ao brasileiro a oportunidade de escolher os governantes que representarão os interesses e necessidades da sociedade pelo período de quatro/oito anos.

O poder de transformação social do voto, no entanto, é ainda desconhecido por parte da população. Muitos brasileiros sequer conseguem se lembrar de quais foram os seus candidatos nas últimas eleições, ocorridas há dois anos. Fatos como esse parecem confirmar o velho jargão de que “o brasileiro não tem memória”.

Para comentar essa realidade, o Olhar Virtual entrevistou a professora de Ciência Política, do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (IFCS), Isabel Ribeiro, e a antropóloga da Escola de Comunicação (ECO), Ilana Strozenberg.

Isabel Ribeiro
Instituto de Filosofia e Ciências Sociais

“Será que o povo não lembra mesmo em quem votou nas eleições passadas? Talvez, ele lembre muito bem. Todo mundo se recorda se votou, ou não votou no Lula há quatro anos, se votou ou não, no Fernando Henrique. Fica muito difícil, no entanto, lembrar daquele deputado federal ou estadual que mudou várias vezes de partido em quatro anos. A instabilidade partidária da política brasileira confunde o eleitor.

É natural o indivíduo ter uma memória que o oriente para o futuro, mas sobre aspectos da vida que lhe sejam familiares. A atividade política democrática, no entanto, ainda não está inteiramente internalizada e fortalecida na sociedade brasileira. Apesar de já vivermos em uma democracia há uns quinze anos, não temos uma cultura cívica, na qual o brasileiro entenda que ele tem uma obrigação para com o Estado, que ele é responsável pelo voto. Ainda levará muito tempo para esse entendimento ser completo. Não há muito a fazer nesse sentido, já que apenas a própria prática democrática é que levará a uma consciência de responsabilidade eleitoral. A melhor maneira de se aprender democracia é praticando a democracia.

O Estado, entretanto, pode e deve agir no sentido de conscientizar a população acerca de uma maior participação nas eleições. A educação cívica é algo fundamental. O Estado não tem que “fazer a cabeça” dos eleitores, mas deveria orientar melhor a população, sobretudo os jovens; deveria disseminar, com clareza e didática, informações sobre o sistema político, os vários níveis de cidadania e a história política do país”

Ilana Strozenberg
Escola de Comunicação

“A relação entre a vida social e a política institucional é, no Brasil, uma relação de distância. Esse é, de modo geral, o grande problema da memória política do povo brasileiro. Uma boa parte da população se sente afastada das esferas de poder. Para essas pessoas, o poder é quase uma abstração. Elas não se reconhecem como um agente e um interventor do poder.

Não temos também uma tradição de cobrança dos nossos governantes; não é costume nosso exigir que eles atuem de acordo com suas promessas eleitorais. O que acontece é uma cobrança em nível das relações pessoais. Quando o voto é dado em troca de um favor, a memória e a cobrança existem. O eleitor não só se lembra de quem foi o seu candidato como também cobra desse político que ele cumpra o que prometeu.

O Brasil teve momentos importantes de reivindicação política, mas eles foram pontuais e localizados. A população brasileira como um todo não tem um passado histórico de atuação e de reivindicação política em relação ao poder. Com o amadurecimento do processo democrático, no entanto, isso tende a mudar. A democratização dos meios de comunicação, nesse sentido, é fundamental. Quando o espaço de expressão é restrito e monopolizado, fica difícil para as pessoas acreditarem que podem intervir de alguma forma. Com um número maior de veículos à disposição, o povo terá uma possibilidade de interação e diálogo muito maior. Ele poderá se expressar mais, e sua voz política será mais ressonante”.

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