• Edição 249
  • 12 de maio de 2009

Zoom

Colégio de Aplicação da UFRJ: ensino público de qualidade

Lorena Ferraz

imagem zoom

O CAp UFRJ conquistou, neste ano, o primeiro lugar entre as escolas públicas do Rio no ENEM. Entre os diversos aspectos que influenciaram a conquista, Marcelo Bueno, diretor-adjunto de ensino do Cap, destacou a presença de estagiários vindos da UFRJ, o corpo docente formado predominantemente por professores com pós-graduação e o regime de dedicação exclusiva. “O CAp constitui o principal campo de estágio das licenciaturas da UFRJ, função que exige dos professores do colégio uma busca permanente por atualização e qualificação. Além disso, o corpo docente do CAp é composto, em sua maioria absoluta, por professores com pós-graduação (mais de 50% mestres ou doutores) trabalhando em regime de Dedicação Exclusiva, o que garante a possibilidade de desenvolver, além das atividades regulares em sala de aula, projetos de pesquisa e extensão. Outro diferencial que deve ser mencionado é que os alunos do CAp têm acesso, na grade curricular, ao ensino de disciplinas que muitas escolas particulares aboliram, por questões financeiras ou por considerá-las supérfluas: duas línguas estrangeiras (que são obrigatórias para os alunos do 6º ao 9º ano do Ensino Fundamental) e várias linguagens artísticas – Artes Visuais, Música e Artes Cênicas e Desenho Geométrico”, ressalta o professor.

Os críticos do ENEM afirmam que as provas aplicadas pelo exame fazem parte de um método de educação ultrapassado que glorifica algumas instituições em detrimento de outras. Bueno afirma que o ENEM, assim como os demais métodos de avaliação do ensino, possui virtudes e limitações.

Para ele “é necessário, em primeiro lugar, distinguir os impactos provocados pelos resultados do ENEM sobre escolas públicas e escolas privadas”. De modo geral, a forma como os meios de comunicação abordam a questão, focando principalmente a polarização entre “as 20 melhores” – em sua maioria escolas privadas – e “as 20 piores” – todas públicas, é extremamente injusta com estas últimas. “Os fatores que levam a essas estatísticas dificilmente são explorados a fundo e o fato de caber às escolas públicas promover a inclusão de alunos que possuem todos os tipos de dificuldades – financeiras, socioculturais, familiares e mesmo físicas –, em vez de descartar aqueles considerados ‘incapazes’, raramente é tratado com a justa relevância. Além disso, muitos dos elementos que interferem no trabalho dos professores que lecionam em escolas do Estado estão muito mais relacionados a políticas públicas equivocadas do que à falta de iniciativa dos docentes em buscar melhorias no sistema”, conclui o professor.

Ele observa também que qualquer método empregado para avaliar o ensino será sempre passível de críticas, de acordo com interesses que possam vir a ser contrariados. “Quando o resultado dessa avaliação produz um ranking, isso gera publicidade para as escolas que o lideram, colocando-as em situação privilegiada numa disputa de mercado. Além do mais, se existe um grupo de instituições que se destaca com frequência, é por seus próprios méritos, e não porque foram favorecidas pelo modelo de avaliação adotado no exame. É claro que as provas do ENEM possuem limitações, mas também possuem virtudes, como a de procurar uma abordagem contextualizada do conhecimento”, destaca o professor.

Um modelo de sucesso

Sobre o modelo de ensino adotado no CAp, Bueno diz: “Um modelo em que os alunos não são vistos como meros depósitos de conteúdo e os professores não se limitam a transmitir o conhecimento como se este fosse um enorme livro de receitas. Ao contrário, a prática docente do colégio caracteriza-se por sensibilizar as turmas com questionamentos e debates que visam subsidiar a construção do conhecimento com os alunos. Desde as séries iniciais eles são estimulados a discutir as questões apresentadas em aula, bem como a construir uma autonomia de estudos que os familiariza com o trabalho de pesquisa e busca de referências. Aos alunos que revelam dificuldades na aprendizagem são oferecidas atividades de apoio acadêmico e estudos de recuperação paralela, o que é possível, em grande medida, pelo fato de a maioria dos professores trabalhar em regime de dedicação exclusiva. Outro aspecto importante é a variedade de atividades extracurriculares oferecidas aos alunos, que vão desde a participação em projetos de ensino, artísticos, esportivos e culturais, desenvolvidos pelos professores na escola, até a atuação em projetos de iniciação científica conduzidos em outras unidades da UFRJ ou mesmo em outras instituições, como a Fiocruz.”

O diferencial

Ao longo dos anos as escolas públicas do Rio têm perdido muita qualidade, chegando a implementar medidas absurdas como a aprovação automática. Segundo o diretor, um conjunto de fatores, como associação com a UFRJ, a autonomia, a qualificação e o salário dos professores, diferencia o CAp das demais escolas públicas. “Um primeiro aspecto a ser citado é o fato de o CAp estar vinculado a uma universidade e desenvolver suas atividades de modo articulado com o ensino superior, especialmente no que diz respeito ao papel desempenhado na formação de professores. A autonomia que os professores possuem na elaboração dos programas e na escolha das metodologias a serem utilizadas em sala de aula é, também, um fator primordial para a qualidade do ensino no CAp. Os docentes do colégio opinam, debatem e decidem coletivamente sobre todos os aspectos relacionados ao projeto político-pedagógico da escola. Os professores que atuam nas escolas vinculadas às secretarias de Educação, por sua vez, encontram muito menos espaço para interferir diretamente nas políticas definidas para as redes públicas de ensino, inclusive no que diz respeito aos currículos e ao sistema de avaliação utilizado. Outro fator fundamental é a qualificação dos professores, em virtude não só das exigências inerentes à natureza do trabalho desenvolvido no CAp, mas da existência de um plano de carreira que possibilita e estimula o docente a realizar cursos de atualização e de pós-graduação. Há, ainda, a questão salarial, que interfere gravemente no exercício docente. Embora os vencimentos dos professores das escolas federais estejam aquém dos valores reivindicados, é inegável que são melhores que os de seus pares das redes de educação pública do Rio de Janeiro, principalmente a estadual. Um professor que precise trabalhar em vários estabelecimentos para manter um padrão de vida digno dificilmente poderá se dedicar adequadamente ao exercício de sua profissão e ainda encontrar tempo e recursos para investir em sua qualificação acadêmica”, explica Bueno.

Mudanças no vestibular

Com relação a possíveis mudanças a serem implementadas pelo colégio visando à adaptação ao novo sistema de acesso às universidades, o professor esclarece: “As atividades acadêmicas do CAp não são planejadas com o objetivo de preparar os alunos para os exames vestibulares. A boa aprovação obtida pelos alunos do colégio é uma consequência natural do trabalho desenvolvido com eles, ao longo de muitos anos, pelo corpo docente da instituição. Assim, embora quaisquer mudanças relativas ao sistema de ingresso no ensino superior devam ser sempre objeto de nossa atenção, não acredito que haja necessidade de um trabalho específico para promover a adaptação ao novo sistema que está sendo proposto pelo MEC.”

O ingresso

Os interessados em estudar no Colégio de Aplicação devem ficar atentos. Bueno acredita que haverá aumento da procura por vagas. “Sempre que há a divulgação de resultados positivos do colégio, recebemos uma expressiva quantidade de telefonemas buscando informações sobre a forma de ingresso. Assim, é provável que a procura por vagas no CAp se mantenha crescente”, pontua Bueno.

– O ingresso de alunos ocorre, majoritariamente, no 1º ano do Ensino Fundamental e no 1º ano do Ensino Médio. Havendo vagas ociosas entre o 3º e o 6º anos do Ensino Fundamental, bem como no 2º ano do Ensino Médio, estas também são disponibilizadas. Em todas essas séries o preenchimento das vagas é feito por sorteio público, cabendo observar que, no caso do Ensino Médio, participam do sorteio apenas os candidatos considerados aptos após uma avaliação de conhecimentos de Língua Portuguesa e Matemática, realizada por meio de prova escrita – esclarece o professor.