• Edição 214
  • 29 de julho de 2008

Ponto de Vista

Nova lei antidrogas: caminhando pelas vias da prevenção

Júlia Faria

imagem ponto de vistaEm maio deste ano, foi proibida, em nove das dez cidades brasileiras em que ocorreria, a marcha pela regulamentação do uso da maconha. Há algumas semanas, o site de relacionamentos Orkut removeu de seus domínios uma página sobre a legalização das drogas, alegando a existência de conteúdos que violam os termos de uso do provedor. Diante de tais situações, o debate em torno da evolução legal da questão das drogas no Brasil mostra-se ainda mais pertinente.

A atual norma constitucional que rege o tratamento a ser dispensado às substâncias químicas causadoras de dependência física e psíquica, a lei 11.343 de outubro de 2006, propõe o entendimento da droga como um sistema, tornando-se preponderante a prevenção em lugar da repressão. Assim, a atual lei antidrogas diferencia-se ainda por prezar pela chamada autonomia da vontade. Isto é, a penalidade aplicada ao infrator da lei está diretamente atrelada à sua participação no próprio processo de reabilitação, feito sobretudo por meio de projetos sócio-educativos, de forma a ser o indivíduo encaminhado, e não mais coagido, a cumprir uma determinada tarefa.

Para elucidar um pouco mais as implicações da lei 11.343, o Olhar Virtual conversou com Marcelo Cruz, professor do Instituto de Psiquiatria da UFRJ e coordenador do Programa de Estudos e Assistência ao Uso Indevido de Drogas (PROJAD).

Olhar Virtual: Qual a importância de discutir atualmente a evolução legal das drogas no Brasil?

É imprescindível tornar pública a discussão acerca da evolução ocorrida nas normas jurídicas no que concerne às drogas. Afinal, a Lei 11.343, em vigor desde 2006, tem o diferencial de proporcionar ao usuário de drogas um tratamento não apenas sob o aspecto legal, mas ainda em consonância com um caráter terapêutico.

Olhar Virtual: Para o senhor, o que há de inovador na atual lei antidrogas, a Lei 11.343?

Ela deixa de prever prisão para os usuários. A estes é dispensado um tratamento que preza por sua reinserção social. Além disso, o julgamento do réu não mais é feito apenas pelo juiz. Há agora a participação de profissionais da área de saúde, de forma a proporcionar o diálogo entre o serviço terapêutico e o jurídico.

Olhar Virtual: Como tornar concreta a substituição dos métodos repressivos pelos preventivos?

Pela nova lei, cabe ao juiz advertir o dependente de drogas e aplicar-lhe medidas referentes à prestação de serviços comunitários ou ao comparecimento a algum tipo de programa educativo, estando estes, necessariamente, relacionados à prevenção do consumo ou à recuperação de usuários. Desta forma, é perceptível o quanto a Lei 11.343 tende a proporcionar uma junção entre as normas legais e os aspectos terapêuticos, podendo ser sintetizada, então, como uma lei que considera a prevenção em substituição à repressão.

Olhar Virtual: Qual o seu posicionamento diante de situações como a proibição da Marcha da Maconha?

A princípio, é preciso entender que pelas leis brasileiras a apologia às drogas é proibida. A não ser no caso das drogas lícitas, não é admitida legalmente a realização de propagandas em favor de substâncias químicas. É permitida, no entanto, a discussão acerca da licicitude das drogas. A partir daí, a questão que cabe, então, é perceber se a Marcha da Maconha pretendia promover realmente um debate em torno da possibilidade de tornar as drogas lícitas ou fazer apenas uma apologia ao uso dessas substâncias.

Olhar Virtual: O senhor acredita que a descriminalização das drogas é viável e benéfica?

A descriminalização das drogas é uma questão que divide opiniões. A meu ver, não acredito que as pessoas passariam a utilizar mais as drogas se todas elas se tornassem lícitas. É preciso perceber que o grande erro quanto à questão das drogas foi tratá-las, ainda no século XX, com métodos repressivos, o que as transformou, sob o aspecto mercadológico, em um bom negócio.

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