• Edição 197
  • 01 de abril de 2008

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Tempo bom para a Meteorologia

Vanessa Sol

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Durante muitos anos, o imaginário coletivo foi permeado pela idéia de que a previsão tempo era pouco confiável. Entretanto, esse panorama vem sendo desconstruído no mundo inteiro a partir do desenvolvimento de novas tecnologias de aferição do tempo. Três elementos foram essenciais para a evolução dos resultados: o aperfeiçoamento do sistema de telecomunicações mundial, chamado Global Telecomunication System, responsável pela geração e transporte de dados através de satélites; o desenvolvimento de programas construídos com modelos matemáticos que permitem uma melhor previsão do tempo; e processos modernos e eficientes de assimilação dos dados – tempo de recebimento e colocação dos dados de forma apropriada para que sejam entendidos pelo computador.

De acordo com o professor do Departamento de Meteorologia e do Laboratório de Prognóstico de Mesoescala (LPM) da UFRJ, Isimar dos Santos, essa mudança começou a partir da década de 1980. Na época, o Brasil fez um acordo com Organização Meteorológica Mundial para utilizar seus dados e também para disponibilizar os dados gerados pelas estações meteorológicas do país.

Outro aspecto ressaltado pelo docente é a evolução dos satélites, o que permitiu melhores informações sobre as variações no mar. “As coisas melhoraram muito e o quadro visto hoje é fruto do esforço e de muito trabalho, não só do nosso país, mas do outros também. A evolução das observações feitas nos oceanos veio tanto dos instrumentos de aferição (bóias) quanto dos satélites. O investimento nesses dois campos foi, também, fundamental para a mudança de panorama”, explica.

Numa previsão do tempo, com antecedência de 24 ou de 48 horas, é necessário coletar dados dos lugares mais remotos do mundo inteiro. O Brasil, por exemplo, disponibiliza várias bóias no oceano Atlântico. A agilidade nesta etapa do processo é fundamental, segundo o professor. “As informações devem sair das estações meteorológicas, onde estão sendo coletadas, e ir até os três grandes centros mundiais de informações – localizados em Washington, nos Estados Unidos, em Melbourne, na Austrália, e em Moscou, na Rússia – em um tempo máximo de três horas”, enfatiza.

O Brasil não está na vanguarda de criação de modelos matemáticos – essenciais para fazer uma boa previsão – mas tem tentado manter-se sabedor sobre os avanços e as novidades a esse respeito, no mundo. “Quando não existiam esses modelos, os meteorologistas faziam as previsões em cartas (mapas), eram obrigados a colocar os dados um a um em cima deles, traçar linhas e, a partir daí, inferir qual seria a previsão do tempo nas próximas 24, 48 ou 72 horas. As incorreções aconteciam porque, neste meio tempo, uma frente fria, por exemplo, poderia perder força, modificando a previsão realizada”, argumenta.

Isimar explica ainda a importância da utilização do computador para tratar os modelos matemáticos: “um grupo de pessoas, por exemplo, pode desenvolver um estudo mais aprofundado sobre nuvens, outro sobre ventos, outro sobre temperatura. E eles podem estar em locais diferentes, países diferentes. O computador faz todas as contas para nós com base no nosso conhecimento; este sim, capaz de muitas coisas, mas incapaz de calcular como o computador faz com os modelos matemáticos”, observa.

Os modelos matemáticos, utilizando dados globais, também fazem a antecipação da previsão do tempo em 6 ou 8 dias. 

Geração de dados

O Brasil, por meio de convênios, usa satélites dos EUA e tem acesso irrestrito a essas informações, que podem ser encontradas na página eletrônica do Instituto Nacional de Meteorologia (INMET) e do Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC). Além disso, há também a página eletrônica do Laboratório de Prognóstico de Mesoescala  (LPM/UFRJ) - www.lpm.meteoro.ufrj.br - , que disponibiliza imagens de satélite e dados tanto do Rio de Janeiro quanto das áreas com rádio sondagem (balões lançados em diversos lugares, principalmente, nos aeroportos) várias vezes ao dia.

LPM

O objetivo principal do laboratório é dar treinamento aos estudantes de Graduação a fim de que eles aprendam a fazer previsão da maneira moderna. O LPM desenvolveu uma metodologia de trabalho na qual o computador desperta à meia noite e começa a coletar dados. A máquina, via internet, acessa uma série de programas e coleta dados dos EUA. A partir daí, é feito um recorte nos dados da América do Sul.  Um modelo matemático americano, chamado WRF, adaptado à realidade brasileira, é alimentado para fazer a previsão do tempo com as condições locais. Ele adapta as informações vindas de fora com a temperatura do mar, com a topografia e com a cobertura vegetal do Rio de Janeiro. O resultado fica na página do LPM.

No caminho do desenvolvimento, o LPM tem investido em computadores e programas. “Nossos alunos ficam satisfeitos quando vêem a contribuição que a UFRJ tem dado para a previsão do tempo no Rio de Janeiro, nossa principal área de interesse”, ressalta Isimar. 

Dificuldades

Uma das principais dificuldades encontradas pelo serviço de Meteorologia brasileiro está na geração de dados. De acordo com Isimar, estatísticas do Centro de Washington demonstram que muitos dados do Brasil têm sido descartados pela falta de qualidade, ou seja, dados com informações errôneas a respeito das temperaturas, da umidade, dos ventos do país. O sistema acaba descartando as informações para não fazer previsões destorcidas. Para Isimar é preciso interferir neste processo, uma vez que o Brasil tem mais de 300 estações meteorológicas – número mais que suficiente para gerar dados com qualidade. “Seria interessante mexer nas duas pontas: na geração dos dados e na recepção para, então, saber o que está acontecendo e solucionar o problema. Principalmente, porque o Centro de Washington aceita receber pesquisadores brasileiros para o monitoramento dos dados que chegam do país”, enfatiza.

Outro fator que por muito tempo dificultou o processo foi a falta de articulação entre os órgãos de Meteorologia. Há cerca de dez anos, não havia cooperação entre o CPTEC/INPE e o INMET, o que, segundo Isimar, é fundamental para uma boa previsão de tempo. Na opinião do professor, a entrada dos jovens no mercado modificou esse quadro. “O problema de falta de articulação está se encaminhado de maneira muito boa, com muita conversa. Agora, as instituições de Meteorologia do país já compartilham seus dados. Como incentivamos essa cooperação na universidade, os jovens ingressam no mercado de trabalho com um novo olhar”, afirma.

Importância da previsão do tempo

Os benefícios do serviço de Meteorologia, como a previsão do tempo, não devem ser entendidos apenas em curto prazo ou como referência de dias frios ou quentes, com ou sem chuva. A importância desta Ciência vai além do que o senso comum imagina. Ela tem diferentes aplicações práticas na atividade turística, nos transportes aéreo e marítimo, na agricultura e no controle da emissão de poluentes na atmosfera.

De acordo com Isimar, a Meteorologia é essencial para os transportes aéreo e marítimo, que precisam saber se encontrarão chuvas, tempestades ou qualquer outro tipo de intempérie durante a viagem. “Um piloto de uma aeronave jamais pode atravessar com o avião uma nuvem chamada  cumulosnimbus, caso contrário, ele pode ser arremessado para cima ou para baixo, pois os ventos dentro dela são muito intensos”, exemplifica.

Para prevenir a emissão de poluentes na atmosfera, pode ser feita previsão do tempo, aferindo a intensidade e direção dos ventos a fim de identificar para onde os poluentes e fumaça que saem de uma indústria estão indo e se atingirão grandes populações. “Desta maneira, a indústria pode reduzir sua atividade para não atingir drasticamente uma população”, completa.

Na agricultura, o professor mostra o exemplo de Israel, onde o serviço de Meteorologia é encarregado de conceder uma certidão para os agricultores informando-lhes que tipo de plantação pode ser desenvolvido naquela região em função da previsão do tempo e das condições climáticas. “Esse é um exemplo para mostrar a importância e a responsabilidade da Meteorologia. Seria muito bom se tivéssemos, no Brasil, um sistema que informasse ao agricultor o que ele pode ou não fazer”, defende Isimar.