• Edição 186
  • 04 de dezembro de 2007

Ponto de Vista

TV digital: a polêmica dos conversores

Fernanda de Carvalho

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No último domingo (dia 2 de dezembro de 2007), o Brasil ingressou oficialmente na era da TV digital, uma nova tecnologia que revoluciona a forma de fazer e ver televisão em nosso país. Dentre as novidades inerentes a esse sistema, destaca-se a possibilidade de interação entre emissores e telespectadores, bem como a portabilidade, que irá permitir assistir à televisão pelo celular durante o trajeto do ônibus ou em um longo engarrafamento, por exemplo.

No entanto, junto às transmissões em alta definição – as quais, neste primeiro momento, restringem-se à região metropolitana de São Paulo, mas que gradativamente estarão disponíveis para todo o Brasil –, chega também o primeiro impasse para a democratização dessa inovação tecnológica: o alto preço do aparelho responsável por converter o sinal analógico em digital, o chamado set-top box, que hoje ultrapassa a faixa dos R$1.000,00.

O ministro das Comunicações Hélio Costa considera esse custo elevado para o consumidor, argumentou que em outros países, como Japão e Estados Unidos, o conversor pode chegar ao equivalente à R$100,00. O Governo brasileiro anunciou que irá destinar aos varejistas uma verba de 1 bilhão de reais – vindos do programa de incentivo à implantação da TV digital do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) – com o objetivo de baratear os conversores, tornando-os mais acessíveis para a população.

A fim de entender um pouco mais sobre o que permeia este embate entre a vontade de levar a TV digital para todos e a barreira oferecida pelo alto custo inicial dos conversores, o Olhar Virtual entrevistou o professor Eduardo Antônio Barros da Silva, do Programa de Engenharia Elétrica (PEE/Coppe) e do Departamento de Eletrônica e de Computação (DEL/Poli) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), também envolvido na definição do Sistema Brasileiro de TV Digital.

Olhar Virtual: Como funciona o aparelho conversor para TV digital?

A TV digital é o sistema de televisão onde os sinais são enviados como se fossem dados (bits) que, na forma de ondas de rádio, chegam até as antenas das residências. A caixinha conversora transforma essas ondas de rádio em bits e converte estes bits em um sinal de vídeo, ou seja, em alguma coisa que a televisão vá “entender”, pois ela não lê dados.
Um exemplo é o DVD, que possui o vídeo armazenado em bits: o aparelho de DVD é a máquina que vai ler esses bits e transformá-los em um sinal de vídeo. A conversora vai fazer uma coisa bem parecida, só que, ao invés de ler os bits de um DVD, vai receber estes dados pela via das ondas de rádio.

Olhar Virtual: Por que essa nova tecnologia da TV digital está saindo tão cara para o consumidor, já que não são todos que podem comprar um conversor de mil reais?

Eu não diria que ela é cara. Na verdade, ela começa cara justamente porque é nova. Quando o Brasil escolheu o modelo japonês de TV digital e colocou o middleware brasileiro Ginga (camada de software que permite fazer aplicações interativas), tudo isso contribuiu para o preço dos conversores ser mais alto em um primeiro momento, pois se aumentou o custo de desenvolvimento das indústrias.
O que o ministro Hélio Costa quer é apenas conversa de político: na verdade, nenhum industrial responsável diria que a caixinha, na estréia, custaria barato, porque não tem como, é impossível.

Na indústria, para ter alguma coisa barata, é preciso fabricar muito, ou seja, é preciso ter uma escala industrial. A tendência é que o preço baixe, mas, toda vez que aparece uma inovação tecnológica, leva ainda algum tempo para acomodar a produção.

Olhar Virtual: Na sua opinião, o incentivo do Governo brasileiro para baratear os conversores atende à idéia de democratizar as novas tecnologias, ou seja, de popularizar a TV digital no Brasil?

Atende, porque quando se tiram os impostos, o preço fica reduzido e o que é mais barato é mais acessível. Para se ter uma idéia, nos Estados Unidos eles fizeram isso, houve incentivo para comprar as caixinhas conversoras. Eu não sei se, no caso do Brasil, vai ficar suficientemente mais barato para rapidamente a população poder comprá-las.

Olhar Virtual: Essa iniciativa do governo é do interesse dos fabricantes dos conversores?

Claro, porque, quando diminuem os impostos, o fabricante continua ganhando a mesma coisa. Quando cresce a compra dos conversores, ou seja, quando se vende mais, o preço tende a cair e o incentivo do governo deve acelerar um pouco esse processo. Mas alguém vai pagar esta conta, e esse alguém somos nós, o resto da população. Aí é mais ou menos saber se isso vale à pena ou não.

Olhar Virtual: Então, quanto ao preço dos conversores, é preciso levar em consideração o tempo de adaptação das indústrias a essa nova tecnologia da TV digital?

Exatamente. Como eu disse, é preciso ter escala, ou seja, a indústria precisa vender muito, para poder comprar as peças em grande quantidade e mais baratas, e por aí vai.

O custo inicial de desenvolvimento precisa ser amortizado, não tem jeito. Depois que a indústria passa pela etapa de desenvolvimento da nova tecnologia e apenas vende, o preço fica mais barato, ou seja, o custo é alto no início, mas vai se diluindo.

O fato é que não havia como o ministro querer uma caixinha conversora com o preço baixo no início, pois quando se começa a fabricar algo novo, uma tecnologia nova, as indústrias precisam aprender a fazer.

Olhar Virtual: a UFRJ possui alguma pesquisa ou tecnologia em desenvolvimento que poderia baratear o custo de produção dos conversores?

Não que eu tenha conhecimento. Aqui na Universidade nós trabalhamos em coisas muito mais fundamentais, como os algoritmos que rodam dentro da caixinha conversora, no desenvolvimento de técnicas, na parte dos métodos, ou seja, trabalhamos com coisas correlatas, mas separadas da fabricação das caixinhas.