• Edição 119
  • 21 de junho de 2006

Olho no Olho

Educação: garantia de ascensão social?

Priscilla Bastos

imagem olho no olho

O discurso mais comum e inflamado é aquele de que sem educação não se chega a lugar nenhum. Mas, será mesmo que educação é garantia de ascensão social? Baseados na idéia de que o índice de escolaridade no Brasil cresce em sintonia com o de concentração de renda, os professores Paulo César Castro e Íris Rodrigues Oliveira deram suas opiniões ao Olhar Virtual sobre o polêmico tema. Cada um com uma interessante abordagem, mas ambos unânimes no ponto sobre a qualidade do ensino no país.

 

 

 

 

 

Professora Íris Rodrigues Oliveira
Faculdade de Educação

“A educação não pode, sozinha, instaurar um estatuto de ascensão social para quem quer que seja. Não é fato comprovado cientificamente que alguém que tenha, por exemplo, curso universitário ascenda social, econômica, emocionalmente. A educação tem que ser aberta para todos e possibilitar que o homem tenha uma formação que o capacite a conhecer novos espaços, investir em novas aventuras, sejam cognitivas, afetivas, econômicas, sociais, de todos os tipos.

O Brasil tem que lutar contra fortes indicadores de exclusão social, econômica, financeira. Quando se fala em ascensão social, pensa-se em apenas uma das características, porque ninguém comprova que uma ascensão econômica leva a uma social. O que é uma ascensão social? Como é que você se sente incluído socialmente em uma cultura, em um grupo, em um lugar? Será que as pessoas de bom nível econômico, emocional, afetivo têm, também, um bom nível social? Será que as que têm um bom nível social – que são aceitas socialmente, fazem parte de grupos etc – têm um nível econômico que lhes permita atender minimamente as suas necessidades básicas? É uma questão para se montar uma pesquisa e constatar, empiricamente, essas formulações.

O Brasil vive lutando com formas de incluir não apenas socialmente, mas também humanamente em determinadas categorias. Dizer que a educação pública é para todos é uma falácia. Acompanhamos estágios de alunos em escolas que são simulacros de escola; não vou dizer nem cópia, porque cópia é até bom, mas um simulacro, algo ruim. Ambientes sem materiais de produção de qualidade, em que os alunos não têm condição sequer de se relacionarem uns com os outros. Nem os professores têm material didático-pedagógico e humano para promover aquela escola como um locus da formação do homem para conviver com outro homem e com os valores culturais dos quais ele é herdeiro. Então o que tem que se fazer é investir mais no homem e deixar de se investir tanto em partido político e organizações. A minha proposta é que a escola deixe de ser um problema de governo e passe a ser um problema de Estado.”

Professor Paulo César Castro
Escola de Comunicação

“Primeiramente, acredito, de modo muito forte, que, em um país como o Brasil, a escolaridade – o acesso à educação –, é um dos fatores fundamentais para se ter melhoria da condição de vida social, cultural daqueles que não têm possibilidade de contar com certas facilidades, como alto poder aquisitivo. Dando-se oportunidade para que as pessoas, indiferente de sua renda ou nível social, tenham acesso à educação de qualidade e, conseqüentemente, possam, por exemplo, entrar na universidade, elas terão mais chance de mudar sua condição de vida e seu quadro social, muitas vezes precário e difícil. É necessário que acreditemos nisso, não só por uma mera crença etérea, pois as estatísticas existem para confirmar isso. A grande mudança nos países que hoje podem ser chamados de desenvolvidos ou aqueles que caminham para isso baseou-se, fundamentalmente, em investimentos na educação, na possibilidade de se fazer uma diferença para quem não teve condições ou não tem um poder aquisitivo alto.

O lado mais perverso do ensino do país é o fato de que as pessoas que têm um alto poder aquisitivo, a classe média – que tem acesso às boas escolas, aos bons professores, às boas condições de ensino – vão ocupar, em grande parte, as vagas das universidades públicas, ficando, para a maioria que não teve chance, as universidades privadas. Infelizmente, acaba fazendo com que as pessoas com menos condições, socialmente falando, continuem na mesma situação ou mudem muito pouco.

Na verdade, a ascensão social pode se dar sob diferentes aspectos. Não há ascensão social uma vez que o modelo de investimento na educação faz com que as pessoas já partam de pontos, de patamares diferentes. Quem estuda na boa escola certamente vai freqüentar as melhores universidades do país, que ainda são, principalmente, as públicas; e aquele que não teve chance ou não entra vai estudar em uma universidade particular, não tendo, muitas vezes, condições de arcar com os custos.

O governo tenta inserir essas pessoas através da política de cotas. Pode ser que seja uma solução, mas não se pode esquecer da necessidade imperiosa de se investir na educação básica, dando chance para que consigam competir no mesmo patamar, e não criar estratégias para, de certa forma, tapar o sol com a peneira”.

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