• Edição 117
  • 08 de junho de 2006

Olho no Olho

A mídia pode influenciar o desempenho da seleção na Copa do Mundo?

 

Leonardo Velasco

imagem olho no olho

De quatro em quatro anos, todas as atenções do Brasil e de boa parte do mundo se voltam para o futebol. É difícil não se contagiar pelo clima da Copa do Mundo, mesmo para aqueles que não gostam do esporte. Por este apelo, a mídia concentra todos seus esforços no evento, dando um grande destaque para todos os fatos que envolvem a seleção brasileira, chamada por alguns de “pátria de chuteiras”.

Diariamente, a imprensa despeja “toneladas” de reportagens, crônicas, críticas sobre os jogadores da seleção, tentando dar ao público a maior quantidade de informações possível, desde a tática do time, chegando a ida de atletas a uma boate, em sua noite de folga.

O Olhar Virtual ouviu os professores Humberto Rêdes e Maurício Schleder, para saber suas opiniões sobre como esta cobertura midiática pode influenciar o desempenho dos jogadores dentro de campo.

 

 

 

Humberto Rêdes
Professor de futebol da Escola de Educação Física e Desportos (EEFD/UFRJ)

"É difícil até avaliar onde isso pode chegar. Ainda mais no futebol. No fundo, o jogador tem que estar preparado para tudo isso. Essa pressão também tem a ver com o salário que eles recebem e o prestígio que conseguiram. Eles estão sujeitos a este tipo de coisa. Além disso, a seleção tem uma boa comissão técnica com psicólogos, que trabalham justamente para evitar este tipo de problema.

A imprensa dá a opinião deles. Evidente que pode não ser a dos torcedores, mas não tenha dúvida que todos nós somos influenciados. Eu tenho observado que o Parreira está se sentindo muito pressionado. O Ronaldinho Gaúcho vai sempre para os treinos tendo que ser igual ou melhor do que ele é sempre. Alerta-se para um clima de favoritismo que eles mesmos ajudaram a criar.

A crítica influencia de dois modos. Para alguns jogadores isto vira um desafio e ele cresce, porque mexe com os brios, aumenta a concentração e ele se cuida mais. Tem jogador que se abate, que precisa ser apoiado sempre.

Mas a gente não pode justificar um fracasso por isso. Seria ótimo que só tivessem coisas construtivas na imprensa, mas não é assim. Até porque o jornalista também está fazendo o trabalho dele.

O fato de divulgar coisas como uma ida a boate, traz insegurança. O jogador tem que estar preparado, mas tem fatores construtivos e destrutivos. Há um ditado no futebol que diz: “quando ganha, tudo é graça, mas quando perde, tudo é desgraça”. Quando vence, os erros se tornam pitorescos.

Os jogadores vêem na imprensa a coisa que eles mais abominam, que é a censura. O atleta é controlado pela opinião pública, que é moldada pela mídia. O enfoque que a mídia dá põe uma pressão nos atletas e pode virar uma coisa destrutiva, embora não seja esta a intenção."

Maurício Schleder
Professor de jornalismo esportivo da Escola de Comunicação (ECO) da UFRJ

"A mídia interfere permanentemente na vida dos jogadores. O jogo propriamente dito não se altera. Mas todos os atletas têm compromissos com a mídia, compromissos publicitários. Mais do que símbolos, eles são artistas se apresentando. No exemplo da seleção, todos titulares e alguns reservas já são tão consagrados e reconhecidos que eles não estão, nesse momento, com uma necessidade de conseguir prestígio. Todos já têm espaço suficiente na mídia e agora fazem isso por prazer. A mídia pode ter grande influência no iniciante, que ainda busca seu lugar e tenta solidificar sua carreira, mas no pessoal mais antigo não.

Por estarem nesta situação, estes jogadores são visados o tempo todo. Não sei como no caso da boate isso influencia. Mas acho que esse grupo já está tão habituado com a cobrança e a perseguição da mídia, que não se abala mais. Já tem prática suficiente para saber que não tem vida individual. Talvez afete os mais novos, os mais despreparados.

Eu acho que se os jogadores muito criticados se sentissem ameaçados dentro da seleção, ou que seus lugares estão ameaçados, poderiam ter algum problema. Mas mesmo com toda a pressão que a mídia faz, se o técnico diz que ele está garantido, o atleta se sente com força. Acho mais perigoso o pessoal que está sendo altamente exaltado. Se quem está sendo criticado for mal, sair do time, não vai ser uma crise tão grande. Mas o Ronaldinho Gaúcho ou o Kaká podem ter este sentimento de ter que ser brilhante e pode haver algum problema. Isto ocorre talvez por uma irresponsabilidade da mídia, que faz este tipo de cobrança, por achar que eles não estão fazendo o que têm que fazer.

O tipo de cobrança em uma Copa tinha que ser feito de acordo com o regulamento idiota que ela tem. Ao fazer a crítica tem que ser bem claro dizendo que jogou mal tanto tempo de algum jogo. Nesse sentido sim pode haver um tipo de pressão. O jogador sabe que tudo que fez na vida está em jogo naquele momento. Mas a grande maioria, quando a bola começa a rolar, se concentra de tal maneira que isso desaparece."