• Edição 112
  • 04 de maio de 2006

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Único laboratório internacional do Brasil é da UFRJ

Priscilla Bastos

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Muito se critica e se questiona sobre a qualidade da universidade pública no Brasil. Alguns alegam que estão sucateadas, abandonadas. Outros já acham que falta estrutura física e tecnológica, existente, teoricamente, nas particulares. A Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), referência em ensino para todo o país, destrói quaisquer argumentos do tipo em várias áreas. Grande exemplo disso, é o Laboratório de Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico (LADETEC) do Instituto de Química (IQ/UFRJ), o único do Brasil a poder realizar exames anti-doping em competições internacionais. Para esclarecer o porquê e como o LADETEC ganhou tal reconhecimento, o Olhar Virtual conversou com seu coordenador geral, o professor Francisco Radler de Aquino Neto.

O LADETEC foi credenciado em 2002, para participar do Campeonato Sul-Americano, pelo Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (INMETRO) e pela Agência Mundial Anti-Dopagem (WADA) — agência que substituiu o Comitê Olímpico Internacional (COI), em 2004. Para que isso se tornasse possível, foi e é necessário que a qualidade do serviço ou do produto que se presta ou trabalha seja muito elevada, sendo, assim, acreditado — termo que se dá ao fato de receber tal aval — com a norma ISO 17.025. "Ela é muito diferente das normas do tipo 9.001, 9.002 referentes a empresas e que dão apenas uma noção sobre a qualidade do serviço. Na 17.025, tem-se de provar que o seu resultado é correto para uma equipe de auditores externos e para um órgão externo qualquer, que, no nosso caso, é o INMETRO. A acreditação é uma chancela externa para a qualidade do seu trabalho", elucida o professor.

Apesar de ter algumas dificuldades decorrentes das condições, principalmente, físicas de trabalho, o LADETEC conta com modernos equipamentos para realizar pesquisas e os próprios exames anti-doping. Obviamente, as instalações estão de acordo com as normas internacionais, mas o reduzido espaço físico dificulta, de certa forma, o andamento do alto nível de atividades ali realizadas. Segundo o coordenador, "as instalações não são com a qualidade ideal que nós e que os acreditadores gostariam. O Ministério do Esporte doou quase R$ 9 milhões em equipamentos para o laboratório, em duas vezes, e 13 equipamentos de grande porte. Então, imagina o que é estar dentro de uma universidade que está mais ou menos consolidada e, de repente, 'jogar' 13 equipamentos. Eles, por conseqüência, ficam amontoados, e as pessoas, de certa forma, trabalham muito perto das outras, o que não é o ideal". Como grande meta, então, está a busca por recursos para a construção de um laboratório adequado, já que, dentro da universidade, há uma decisão de que é preciso construir o que se chama de novo Instituto de Química: "nós, aqui, estamos 'emprestados' e com um agravante de se ter uma atividade de risco, como é a Química, no sexto andar de um prédio. Essa conscientização já existe; faltam, apenas, o recurso e a definição de onde se construir".

Entretanto, há um mérito grande da universidade que talvez até supere o empecilho técnico e estrutural. "Eles, da WADA e do INMETRO, acreditam que nós temos competência", afirma, orgulhoso, o professor Francisco. Com isso, ao entrar no controle de dopagem, a UFRJ teve retornos significativos. Em relação à imagem, mostrou que, como maior universidade federal brasileira, tem competência de realizar atividades que, no exterior, são feitas no nível da fronteira do conhecimento. Assim, o retorno financeiro foi conseqüente, já que se tem um produto, um serviço de qualidade, exclusivo e que pode ser vendido.

Uma curiosidade e razão para se orgulhar, está no fato de a existência do LADETEC no Rio de Janeiro contribuir e pesar na escolha da cidade como sede dos jogos Pan Americanos de 2007. "Em 2002, quando fomos acreditados para fazer o Campeonato Sul-americano, começava-se a negociação para os jogos Pan Americanos de 2007. E, dito pelo Carlos Arthur Nuzman, presidente do Comitê Olímpico Brasileiro (COB), na época, o que fez a diferença para o Rio de Janeiro ganhar de San Antonio, no Texas, foi a existência, no Rio, de um laboratório já creditado para o controle de dopagem; porque San Antonio, mesmo com todo o poderio do presidente Bush etc, teria de mandar as amostras para o laboratório acreditado, que fica em Los Angeles", completa Radler. Isso, para a Universidade, é um grande diferencial, mostrando a importância de um pequeno trabalho e suas conseqüências para o país, para a economia, para o social. Quanto ao exame anti-doping em si, o professor explica como é feito: "sorteiam-se, após as competições, alguns atletas e os medalhistas, ou seja, aqueles que ocuparam as três primeiras posições. Faz-se, então, uma estatística, já que não há condições de examinar a todos, pois o custo é bem elevado e o processo longo e demorado”.

Como todo produto positivo, o LADETEC dá frutos que vão além da arrecadação de capital com o controle de doping no esporte. Com orgulho, Francisco Radler fala sobre o que ele chama de 'dobradinha', que consiste em utilizar a mesma técnica do exame anti-doping para diagnósticos precoces médicos ou controle de contaminante de alimentos, na verdade, nomeado de Controle de Resíduos em Alimentos: " então, ao desenvolver toda essa competência para fazer doping no esporte, abriram-se, ao mesmo tempo, duas outras importantes vertentes na universidade, que são a área médica, com o suporte à área médica brasileira, e o suporte à área alimentar, da segurança alimentar". Vê-se, com isso, que há muitas ferramentas a se aplicar em um sem número de áreas importantes para o desenvolvimento social e econômico do país. "As pessoas se focam muito na análise da urina do atleta, quando, na verdade, isso é uma forma de demonstrar competência para depois fazer a análise, por exemplo, da urina de um bebezinho, para fazer o diagnóstico no sangue de um paciente para saber se ele está absorvendo adequadamente o medicamento", conclui o coordenador.